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IA no e-commerce e o novo papel do profissional de marketing

Por: Natália Quadros

VP de Vendas Customer Experience para Brasil e MCLAC Sul na SAP

Natalia Quadros, ingressou na SAP em 2022 como Head of Growth e hoje ocupa a posição de VP de Vendas Customer Experience para Brasil e MCLAC Sul. Com formação em Relações Públicas pela Universidade de Caxias do Sul, possui especializações em Estratégia Internacional pela EADA de Barcelona e Comunicação Eficaz pelo MIT, além de MBAs em Marketing e Gestão da Experiência do Cliente pela ESPM. Atua diretamente na conexão de tecnologias com as necessidades do mercado aproximando as mais diversas indústrias da transformação digital. Conta com ampla experiência em inteligência artificial com uso de linguagem natural e fomenta iniciativas de dados e marketing em mais de 40 países.

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Nos últimos dois anos, assistimos a uma enxurrada de promessas sobre como a inteligência artificial revolucionaria o marketing digital. Copilotos que escreveriam campanhas inteiras, agentes autônomos que otimizariam anúncios sozinhos, sistemas que “entenderiam” o cliente melhor que qualquer pessoa. Na prática, a evolução tem sido diferente e ainda mais interessante.

Pessoa controlando um sistema digital em um armazém automatizado com robôs móveis e caixas empilhadas.
Imagem: SAP.

Gerenciar marketing em e-commerce hoje é administrar o caos. Entre plataformas de anúncios, ferramentas de CRM, sistemas de automação de e-mail, dashboards de analytics e plataformas de mídia social, o profissional de marketing digital lida com pelo menos oito ferramentas diferentes todos os dias.

Cada uma entrega dados isolados, exige configurações manuais e consome tempo que deveria estar sendo investido em estratégia.

Nesse cenário, os copilotos e agentes de IA fazem cada vez mais sentido. Não como substitutos mágicos, mas como camadas de inteligência que conectam sistemas fragmentados e automatizam o que realmente pode ser automatizado.

Afinal, o que diferencia um copiloto de um agente (e por que isso importa)?

A confusão começa pelo nome. Muita gente usa “copiloto” e “agente de IA” como sinônimos, mas a diferença operacional é significativa. Os copilotos funcionam como assistentes colaborativos, interpretam comandos em linguagem natural, buscam informações em múltiplas fontes e sugerem ações, mas sempre dependem de validação humana.

No e-commerce, um copiloto pode, por exemplo, analisar dados de três campanhas simultâneas no Google Ads, Meta Ads e e-mail marketing, cruzar com informações de conversão no site e sugerir onde concentrar o budget na próxima semana. Mas quem decide é o gestor.

Por outro lado, os agentes de IA operam com autonomia. Uma vez configurados, eles executam tarefas de forma contínua, testam variações de criativos, ajustam lances automaticamente, pausam campanhas com baixa performance, identificam públicos similares e ativam fluxos de remarketing. Os agentes de IA não esperam o comando. Eles agem, aprendem e corrigem rotas com base em resultados.

Como essa diferença funciona na prática? De forma resumida, um copiloto economiza tempo de análise e o agente de IA economiza tempo de execução. No e-commerce, em que campanhas de conversão exigem ajustes em tempo real, essa distinção define resultados.

Onde a IA entrega valor (e onde ainda está evoluindo)

Depois de testar diferentes ferramentas com base em IA nos últimos 18 meses, algumas aplicações se mostraram consistentemente úteis:

– Geração de variações criativas em escala: criar 30 versões de copy para teste A/B manualmente consome horas. Com IA generativa, esse trabalho cai para minutos. O ganho não está na qualidade da copy, mas na velocidade. Em períodos de alta demanda como Black Friday, isso faz diferença.

Análise preditiva de comportamento de compra: modelos treinados em histórico de navegação, abandono de carrinho e padrões de conversão conseguem identificar, com boa precisão, quais leads têm maior probabilidade de compra nos próximos sete dias. Isso permite segmentações mais inteligentes e reduz desperdício de mídia. Em operações que testamos, a melhoria no CAC foi da ordem de 18% a 22%.

– Classificação automática de casos de sucesso e falha: todo e-commerce acumula dados de campanhas bem-sucedidas e fracassadas, mas raramente consegue extrair padrões desses históricos. Agentes de IA podem categorizar automaticamente milhares de campanhas por variáveis como público, criativo, horário, dispositivo e canal, identificando o que realmente impacta a conversão. É uma mineração de dados que, feita manualmente, seria impraticável.

A IA ainda está evoluindo para compreender melhor contexto cultural, ironia ou nuances de marca. Copilotos sugerem copies genéricos que funcionam tecnicamente, mas sem personalidade. Os agentes otimizam métricas definidas, mas não questionam se essas são as mais estratégicas. Nenhum sistema hoje consegue antecipar mudanças bruscas de mercado, como alterações em políticas de plataformas ou crises reputacionais.

O que muda na rotina da equipe (e o que não muda)

A promessa de que a IA liberaria profissionais de marketing para “focar o estratégico” é parcialmente verdadeira. Sim, tarefas como ajuste manual de lances, criação de relatórios semanais e monitoramento básico de performance podem ser automatizadas. Isso libera, em média, oito a 12 horas semanais por profissional.

Só que o tempo economizado não se converte automaticamente em estratégia, mas em maior capacidade de execução. Com copilotos e agentes assumindo camadas operacionais, equipes conseguem testar mais hipóteses, lançar mais campanhas e iterar com mais velocidade. O ganho é em volume e agilidade, não necessariamente em profundidade estratégica.

O papel do profissional de marketing muda para algo mais próximo de um “curador de sistemas”. Ele define diretrizes, configura parâmetros, valida outputs, ajusta variáveis e garante que a IA otimize os processos para atingir os objetivos certos. É menos braçal, mas demanda uma combinação nova de habilidades, como o domínio técnico de como esses sistemas funcionam, senso crítico para questionar recomendações algorítmicas e capacidade de traduzir estratégia em inputs que a IA consiga processar.

Por que a adoção segue o seu próprio tempo (e o que isso revela)

Apesar do entusiasmo, a adoção de copilotos e agentes de IA em operações de e-commerce segue no seu próprio tempo. Segundo levantamentos recentes, aproximadamente 30% das empresas de médio e grande porte implementaram soluções de IA além de automações básicas de e-mail marketing.

As razões são previsíveis, como os custos de implementação, resistência de equipes, falta de dados estruturados para treinar modelos e, principalmente, a necessidade de construir confiança e resultados. Ninguém quer entregar parte do controle de campanhas a um agente autônomo se não houver confiança de que ele vai agir dentro dos limites esperados.

Esse ritmo mostra que marketing em e-commerce ainda precisa da inteligência humana, que uma campanha tecnicamente eficiente pode ser estrategicamente errada e que métricas de curto prazo nem sempre constroem valor de longo prazo.

A IA está redefinindo o trabalho no marketing, mas dificilmente substituirá os profissionais e especialistas que o fazem acontecer. Seu papel está na redistribuição do esforço, com menos execução manual, mais curadoria inteligente. Talvez seja isso que o setor precisava.

O desafio agora é cultural. Fazer com que equipes confiem em sistemas inteligentes para tarefas operacionais enquanto mantêm controle sobre decisões estratégicas. Quem resolver isso primeiro sai na frente.