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Do hype à melhoria contínua, de propósito: como fazer a inteligência artificial gerar resultado no e-commerce com Project FIT

Por: Eduardo Freire

Eduardo Freire é CEO da FWK Innovation Design, uma fazedoria especializada em estratégia e inovação corporativa. Criador do Project Thinking - abordagem adotada por grandes empresas no Brasil, EUA e Europa -, Eduardo ajuda organizações de e-commerce a conectarem estratégia, cultura e execução para acelerar projetos de transformação digital, impulsionar vendas com inovação em IA e fortalecer lideranças orientadas a resultados. Atua como advisor em iniciativas de impacto no varejo digital, além de saúde, governo e indústria. Reconhecido como um dos 50 principais líderes globais em Design Thinking pelo ranking Thinkers360 – 2025, integra estratégia, tecnologia e cultura para impulsionar negócios. É autor, palestrante e mentor, inspirando marcas a criarem experiências digitais ágeis e impactantes.

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A “inovação” cansou. O que move o ponteiro agora é melhoria contínua, de propósito não como um processo fixo, mas como uma jornada viva, conectada a indicadores de negócio e à realidade de quem executa. No e-commerce, isso significa sair do discurso e entrar em ciclos que escutam, testam, entregam e ajustam semana após semana. É aqui que entra o Project FIT.

Diagrama circular moderno do Project FIT com quatro etapas: Escutar, Imaginar, Materializar e Ajustar.
Imagem gerada por IA.

O que é o Project FIT (e por que funciona)

Project FIT é um método de aderência pessoa–papel–projeto para destravar resultado em ciclos curtos. Ele identifica subdesafio, ruído de processo e desalinhamento de propósito e redesenha 10-20% do escopo (e das rotinas) para aumentar autonomia, desafio e sentido, com métricas ligadas ao negócio.

Ele nasce do Project Thinking (ciclo vivo): escutar → imaginar → materializar → ajustar, com olhar DO cliente (resultado/propósito) e olhar DAS pessoas (condições de entrega). Parece óbvio, mas não está sendo feito. Quando é feito, gera resultado e conexão.

O problema que ninguém gosta de admitir

A adoção de inteligência artificial cresceu, mas muito projeto não sai do piloto. Não falta tecnologia; faltam ciclos de aprendizagem organizacional e guard rails que liguem IA às dores reais do cliente. Resultado: automações que aceleram o que já estava errado, personalizações que soam invasivas, CRM (Customer Relationship Management) que conhece cliques, mas não entende o contexto.

Quatro movimentos para agora

1) Diagnosticar o “sinal” e a governança (sem glamour)

Mapeie o que você realmente capta (eventos, consentimentos, taxonomias), limpe o ruído e defina data contracts (acordos de formato/semântica entre produto, marketing e engenharia). Considere coleta server-side (no servidor) onde fizer sentido. Sem isso, IA vira adivinhação cara.

KPI – Key Performance Indicator (indicador-chave): % da receita atribuída a dados consentidos e saudáveis.

2) Projetar zero-party data que o cliente quer entregar

Troque “perseguição” por troca de valor: quizzes úteis, guias de escolha, clubes e um centro de preferências que o cliente edita. First-party data (dados próprios) e zero-party data (preferências declaradas) sustentam personalização respeitosa.

KPIs: taxa de opt-in útil; nº de preferências ativas por cliente; impacto em conversão e devolução.

3) IA onde dói (e onde dá para corrigir)

Aplique IA em momentos que movem o ponteiro: busca, recomendação, promessa de entrega e prevenção de frustração.

– Enriqueça catálogo com embeddings (representações semânticas).

– Use RAG – Retrieval-Augmented Generation (geração aumentada por recuperação) para respostas de busca/autosserviço com fontes confiáveis.

– Garanta human-in-the-loop (humano no circuito) e reversibilidade em fluxos críticos (troca, endereço, cancelamento).

KPIs: FRT – First Result Time (tempo até o 1º resultado útil) da busca; “achei o que queria?” (autodeclaração); hit rate da promessa de entrega; resolução no 1º contato.

4) Retail media com propósito (e métrica séria)

Retail media = monetizar a audiência da sua loja (site/app) com anúncios sem ferir a experiência e ainda melhorar discovery de produtos. Meça incrementalidade (lift test, mercados pareados), evite canibalizar orgânico, imponha brand safety e padrão criativo orientado a UX (User Experience).

KPIs: lift por categoria; ROAS – Return on Ad Spend (retorno sobre gasto em mídia) incremental; frequência/saturação controladas.

Project FIT em 30–60 dias (playbook da jornada viva)

Semanas 1–2 – Diagnóstico (o “FIT” propriamente dito)

– Mapa pessoa–papel–projeto (subdesafio, gargalos, decisões).
– Kill list de tarefas sem valor + automações de baixo atrito.
– Saúde dos dados e consentimentos (o que manter, parar, começar).

Semanas 2–4 – Design

– Redesenho de 10-20% do escopo (rotinas, acordos de trabalho, reversibilidade).
– Backlog de micromelhorias priorizadas por impacto/complexidade.
– Guardrails de IA (fontes confiáveis, fallback humano, logs auditáveis).

Semanas 4–6 – Entrega e debrief

– Colocar no ar 3–5 microentregas que mexem na experiência.
Medir KPIs ponta-a-ponta e publicar changelog de experiência (transparência gera confiança).
Capturar aprendizados e reajustar: o ciclo recomeça. Jornada viva.

KPIs que importam (além do ROAS)

– Tempo até o consentimento (primeiro opt-in útil).
– Preferências ativas por cliente (zero-party “vivo”).
– % de sessões com busca satisfeita (autodeclaração simples).
– Receita a partir de dados consentidos (share e crescimento).
– Incrementalidade do retail media por categoria.
– Hit rate da promessa de entrega; NPS – Net Promoter Score por nível de personalização.
– Resolução no 1º contato e FRT.

Riscos e ética (para não jogar reputação fora)

– Preço dinâmico injusto (“paguei mais por ser eu”): defina limites e explique regras.
– Viés algorítmico: teste coortes e audite modelos regularmente.
– Dark patterns (padrões enganosos): consentir deve ser claro, reversível e com benefício explícito.
– Reversibilidade operacional: sistemas ágeis para corrigir erros do cliente sem puni-lo.

A era do hype passou. Vence quem trata a experiência como projeto vivo – melhoria contínua, de propósito -, e não como campanha. O Project FIT não promete foguetes: ele ajusta o que importa, dá autonomia a quem entrega e conecta IA a métricas reais do cliente e do negócio.

No fim do dia, menos playbook, mais gente entregando resultado.

Miniglossário (para leitores apressados)

– IA: Inteligência artificial
– CRM: Customer Relationship Management (gestão do relacionamento com clientes)
– KPI: Key Performance Indicator (indicador-chave de performance)
– First-party data: dados próprios (coletados pelo seu negócio)
– Zero-party data: preferências declaradas pelo cliente
– Embeddings: representações numéricas de textos/itens para entender significado
– RAG: Retrieval-Augmented Generation (geração aumentada por recuperação)
– Human-in-the-loop: humano supervisionando/decidindo em etapas críticas
– UX: User experience (experiência do usuário)
– ROAS: Return on Ad Spend (retorno sobre gasto em mídia)
– FRT: First Result Time (tempo até o primeiro resultado útil)
– NPS: Net Promoter Score (métrica de lealdade/satisfação)
– Retail media: venda de mídia dentro do seu próprio ambiente (site/app)
– Dark patterns: padrões de design que empurram o usuário a escolhas indesejadas
– Data contracts: acordos de formato/semântica dos dados entre times