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O consumidor endividado é o novo desafio invisível do varejo digital

Por: Thiago Oliveira

CEO e fundador da Monest

É CEO e fundador da Monest - empresa de recuperação de ativos através da cobrança de débitos por uma agente virtual chamada Mia, conectada por inteligência artificial. Imerso no empreendedorismo desde o início da carreira, com apenas 19 anos ganhou a liderança da equipe de desenvolvimento da Ometz, o que lhe deu o entusiasmo de fundar o Hotel Já, uma startup que oferecia hotéis de alto padrão a um custo muito mais acessível para reservas de última hora. Depois, Thiago fundou a Davai, empresa de tecnologia e desenvolvimento, onde atuou em 15 projetos por seis meses, alguns bem expressivos - como Fórmula 1 e Expedia. Atuou como CTO de empresas líderes em inovação no ecossistema de Curitiba, como Hero99 e Beracode. Nesse período, administrou e promoveu o projeto Philips of Holland, que começou no Brasil e hoje ganha proporções mundiais. É graduado pela PUC/PR em Sistemas de Informação, com especialização em Machine Learning pela Udacity (2018) e tem mais de 15 anos de experiência no setor de tecnologia, com uma atuação consolidada no mercado de cobrança há mais de 10 anos. Eleito umas das 50 lideranças de Finanças e Risco pelo CMS Financial Innovation 2023.

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Nos últimos cinco anos, o Brasil ganhou cerca de 15 milhões de novos inadimplentes. Hoje, são 77,8 milhões de brasileiros com o nome negativado, segundo dados do Serasa. Em outras palavras: quase quatro em cada dez adultos estão endividados. Esse número já não é apenas um dado econômico, é um sintoma social que o varejo não pode mais ignorar.

Homem preocupado analisa boletos e cartões.
Imagem gerada por IA.

O problema é estrutural. E, por isso, tratá-lo como uma questão de educação financeira é uma explicação conveniente, mas rasa. O que está por trás desse cenário é uma combinação explosiva de renda pressionada, crédito caro, juros altos e inflação persistente. O resultado? Um consumidor sufocado, tentando equilibrar as contas básicas, como água, luz e gás, enquanto o cartão de crédito, que deveria ser ferramenta de conveniência, virou armadilha de sobrevivência.

O impacto no varejo digital

O dado mais preocupante é que 74% dessas dívidas estão atrasadas há mais de um ano, de acordo com o Serasa. Isso significa que o endividamento deixou de ser um contratempo passageiro para se tornar um estado permanente. E quando o endividamento se torna crônico, o impacto no varejo é inevitável: menos consumo, menos conversão e mais insegurança para o crescimento.

No e-commerce, essa relação é ainda mais direta. As compras online dependem fortemente do crédito e do parcelamento – motores que impulsionam as vendas, mas também refletem o grau de confiança entre o consumidor e o sistema. Quando essa confiança se rompe, todo o ecossistema sente: o consumidor hesita, o carrinho é abandonado, o faturamento desacelera.

Transformando inadimplência em oportunidade

E é nesse ponto que o varejo precisa mudar o olhar. O consumidor inadimplente não é o inimigo a ser cobrado, mas o cliente que precisa ser reconquistado. O setor precisa enxergar a inadimplência como um dado de comportamento, não apenas de risco. Isso exige empatia, tecnologia e estratégia.

Com o uso inteligente de dados, é possível identificar sinais de vulnerabilidade financeira antes que o problema aconteça e oferecer soluções reais, como planos de pagamento flexíveis, abordagens personalizadas e jornadas de renegociação mais humanas. É assim que se constrói lealdade: ajudando o cliente a voltar à superfície, e não empurrando-o ainda mais fundo.

Muitos gostam de repetir que “educação financeira é a resposta”. Mas vamos ser francos: você não ensina alguém a nadar enquanto a pessoa já está se afogando. No auge da inadimplência, o que o consumidor precisa é de um colete salva-vidas, não de uma aula de natação. A educação é essencial, mas ela deve vir antes da crise, e o varejo pode ser um agente transformador nesse processo, criando experiências financeiras mais sustentáveis e menos punitivas.

Ignorar o endividamento é fechar os olhos para um dos maiores desafios (e oportunidades) da economia brasileira. O futuro do varejo digital não será definido apenas por quem vende mais, mas por quem entende melhor o consumidor, inclusive aquele que parou de comprar.