As redes sociais já não são apenas canais de distribuição de informação, elas se tornaram espaço de presença cultural, nos quais marcas, pessoas e instituições projetam sua relevância em tempo real. Nesse ambiente, a influência deixou de ser um subproduto da visibilidade. Ela passou a funcionar como força de organização simbólica, comportamental e econômica. Isso, somado a uma crescente profissionalização do conteúdo, tem deslocado o eixo de poder no ecossistema digital: em vez de depender exclusivamente de grandes veículos ou ações de mídia paga, marcas e consumidores passaram a se conectar por meio de vozes que operam na interseção entre influência, performance e narrativa.

Em 2025, os influenciadores concentram 36% das interações globais em redes como TikTok, Instagram, Facebook e X, segundo a Comscore, e as ações de influenciadores somaram seis bilhões em 2024, incluindo curtidas, comentários e compartilhamentos, de acordo com o whitepaper “O Efeito Influencer: A Potência do Engajamento”. Além disso, dados do Influencer Marketing Hub indicam que o setor movimenta mais de US$ 24 bi por ano globalmente, com expectativa de ultrapassar os US$30 bi até 2026.
Esses números sugerem uma reconfiguração da lógica comunicacional. O poder da distribuição pode estar migrando da mídia institucionalizada para as bordas, para os indivíduos que ocupam, narram e curam o cotidiano em tempo real: os criadores de conteúdo. Sejam humanos ou virtuais, mainstream ou emergentes, eles atuam como tradutores da cultura e engenheiros da atenção. Como destacam artigos da Harvard Business Review, a principal vantagem competitiva das marcas nos próximos anos será a capacidade de gerar significado cultural, e não apenas atenção efêmera.
Afinidade para gerar engajamento
Durante anos, o marketing de influência foi operado com base em métricas de vaidade. Seguidores, visualizações e curtidas guiaram investimentos e decisões. Essa lógica, embora compreensível nos estágios iniciais da creator economy, mostrou-se ineficaz para medir o impacto real. Hoje, ações bem-sucedidas se estruturam em torno de afinidade simbólica, narrativa, análise de sentimento e conexão contextual.
Ferramentas como o Social Incremental, da Comscore, representam avanços. Ao medir audiências deduplicadas entre plataformas, ajudam a reduzir a superestimação de alcance. Ainda assim, métricas como sentimento, coerência narrativa e profundidade de vínculo seguem subutilizadas.
Campanhas recentes reforçam esse ponto. Uma ação da Calvin Klein com Kendall Jenner obteve desempenho acima da média por ser sustentada por uma afinidade 88 vezes maior entre a audiência da influenciadora e os valores da marca. Não foi a fama isolada que gerou resultado, mas a coerência simbólica. Da mesma forma, a campanha da CeraVe com Michael Cera, baseada em humor autodepreciativo e na estética de meme, alcançou 9,6 milhões de visualizações ao operar dentro dos códigos culturais da geração Z.
Esses casos ilustram como a eficácia do conteúdo não depende apenas do formato, mas da sintonia com o imaginário coletivo e com os signos culturais que circulam entre criador e audiência. O mesmo vale para influenciadores brasileiros. Eles não lideram apenas por alcance, mas pela capacidade de mobilizar comunidades em diferentes contextos e plataformas.
O desafio para as marcas está, portanto, na construção de ecossistemas criativos baseados em colaboração. Isso exige abrir mão do controle absoluto sobre a mensagem e permitir que os criadores adaptem as narrativas à sua linguagem e comunidade. As campanhas que performam melhor nem sempre são as mais caras, mas sim aquelas que geram envolvimento emocional, autenticidade percebida e ressonância social.
Avatares digitais e a reconfiguração da autenticidade
Recentemente, o crescimento dos influenciadores gerados por inteligência artificial vem adicionando mais uma camada complexidade ao cenário. Perfis como Lu do Magalu, Aitana López e Lil Miquela não têm corpo físico, mas constroem presença com consistência narrativa, estética clara e ritmo de publicação estratégico. Para muitas marcas, oferecem previsibilidade e controle criativo, mas, ao mesmo tempo, impõem desafios éticos. Até que ponto é possível gerar vínculo com uma figura sabidamente fictícia?
No Brasil, a personagem Marisa Maiô, por exemplo, viralizou ao unir humor, lifestyle e crítica social. Criada pelo ator e roteirista Raony Phillips, superou três milhões de visualizações, segundo matéria recente da Exame, ao adotar uma linguagem nativa das redes e escapar da rigidez dos formatos publicitários. O caso mostra como a performance simbólica supera a lógica da publicidade tradicional quando respeita o ambiente e a escuta ativa das plataformas.
O uso da IA nesse contexto é apenas uma face da mudança estrutural: quem domina a construção de significado cultural controla o mercado. Ignorar isso leva marcas a tratar sintomas e perder a disputa pela influência como infraestrutura. A fronteira entre o real e o performado está se tornando mais fluida, e o marketing precisa acompanhar esse deslocamento com responsabilidade narrativa.
O que está em disputa
Em um mundo no qual a convergência de plataformas é uma realidade presente e forte, a visão e medição cross-media também precisa ser uma aliada na estratégia, por meio de soluções integradas e insights precisos que ajudem a compreender onde, de fato, a audiência está e como melhor interagir com ela. O desafio contemporâneo, portanto, é manter relevância em um ambiente de atenção cada vez mais fragmentado.
O futuro da influência está nas vozes diversas e nas comunidades, mas também na gestão inteligente dos dados. Para construir relevância e cultura, além de porta-vozes que tragam alcance e discursos alinhados, precisamos de estratégia para transformar dados existentes em insights acionáveis. Assim, seremos assertivos tanto na criação de conteúdos que engajam quanto na eficiência da mensuração, transformando informação fragmentada em legado cultural.
Comentários