Nos últimos anos, o Brasil testemunhou uma explosão de novos empreendedores digitais. O comércio eletrônico tornou-se uma via de entrada para quem busca autonomia financeira e quer transformar uma ideia em negócio. Mas, por trás do entusiasmo, existe uma realidade dura: a taxa de mortalidade de novos e-commerces continua elevada.

A principal causa não é a falta de produtos ou de disposição para empreender, mas sim a dificuldade em gerar demanda consistente. Muitos começam investindo em estrutura, marketing e tecnologia antes de ter clareza sobre se existe mercado para o que estão oferecendo. Esse descompasso ajuda a explicar por que tantas iniciativas não resistem ao primeiro ano de operação.
O problema não está na abertura da loja, mas em atrair clientes
Abrir uma loja online é cada vez mais acessível; a barreira técnica foi drasticamente reduzida nos últimos anos. Porém, como costumo dizer, lançar um site sem demanda é como inaugurar uma loja física em uma rua sem movimento. O investimento inicial em estoque, plataforma e comunicação rapidamente se transforma em custo fixo, sem retorno proporcional.
Relatórios internacionais ajudam a dimensionar essa dor. Por exemplo, um estudo da Constant Contact revelou que 73% dos pequenos negócios não têm confiança em suas estratégias de marketing. Além disso, falta clareza sobre precificação, construção de vitrine digital e captação de tráfego. O resultado é um ciclo de investimentos desordenados, esgotamento de capital e frustração precoce.
O efeito colateral do excesso de pressa
Na ausência de demanda validada, muitos lojistas recorrem a soluções rápidas: contratam plataformas mais sofisticadas do que precisam, gastam em customizações, compram cursos e até terceirizam operações sem ter caixa para sustentar essas apostas.
Esse comportamento acelera a descapitalização. Em vez de ganhar tempo para ajustar estratégia, o empreendedor vê seu capital inicial, que deveria financiar os primeiros meses de operação, se esgotar em iniciativas de alto custo e baixo retorno imediato.
A lógica invertida: validar antes de escalar
A experiência mostra que o caminho mais sustentável é começar em canais que já concentram tráfego qualificado, como os marketplaces. Eles oferecem três vantagens críticas:
1. Acesso imediato a compradores – a vitrine já está pronta e com fluxo constante.
2. Validação prática do sortimento – permite testar quais produtos geram interesse e margem.
3. Geração de caixa desde o início – receita que dá fôlego e reduz a ansiedade inicial.
Os números reforçam essa direção. Segundo o Relatório Estado do Comércio 2024, 95% dos executivos globais consideram os marketplaces essenciais para o crescimento e 70% já têm até metade da receita vinda desses canais. Mais do que uma “porta de entrada”, eles se consolidaram como eixo estratégico de distribuição.
A partir do aprendizado obtido nos marketplaces, faz sentido expandir para canais próprios, redes sociais e estratégias de fidelização. Assim, a construção de marca e comunidade se apoia em uma base de demanda já comprovada.
O papel da IA na multicanalidade
Se antes operar em múltiplos canais era um privilégio de grandes empresas, por exigir cadastros manuais, integrações complexas e acompanhamento operacional intenso, hoje a tecnologia está mudando esse cenário.
A inteligência artificial (IA) tornou viável a multicanalidade para pequenos e médios lojistas ao automatizar processos antes burocráticos e caros:
– Cadastro de produtos adaptado a cada canal.
– Sincronização de estoque e precificação dinâmica em tempo real.
– Análises de performance com recomendações estratégicas para alocação de esforços.
Essa mudança estrutural desloca o foco do empreendedor: em vez de gastar tempo em tarefas repetitivas, ele pode concentrar energia em estratégia, atendimento e inovação, que são os verdadeiros diferenciais competitivos.
Sobrevivência depende de validar demanda
O e-commerce brasileiro continuará atraindo novos empreendedores, mas a sobrevivência dependerá menos da capacidade de lançar lojas e mais da clareza em validar demanda antes de escalar operações.
A inteligência artificial surge como uma aliada nesse processo, reduzindo barreiras históricas e permitindo que mesmo pequenos vendedores atuem de forma multicanal. O desafio não é apenas abrir portas digitais, mas garantir que existam clientes passando por elas.
Validar antes de investir pesado pode parecer contraintuitivo para alguns, mas é o que separa negócios que se sustentam daqueles que se perdem no caminho. O futuro do e-commerce não será definido apenas por quem entra no jogo, mas por quem consegue construir demanda sólida desde o início.