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Marcas de luxo repensam estratégias antes de perderem consumidores para o fast-fashion

Por: Júlia Rondinelli

Editora-chefe da redação do E-Commerce Brasil

Jornalista formada pela Faculdade Cásper Líbero e especialização em arte, literatura e filosofia pela PUC-RS. Atua no mercado digital desde 2018 com produção técnica de conteúdo e fomento à educação profissional do setor. Além do portal, é editora-chefe da revista E-Commerce Brasil.

Dados da Bain & Co. mostram que houve um aumento no custo dos produtos de luxo no mercado global desde 2021. De lá para 2024, cerca de 50 milhões de consumidores foram afastados dessa categoria de compras no mundo inteiro. Quem forneceu as informações foi Aaron Cheris, sócio e responsável pelo comércio eletrônico e mercados globais da Bain & Co.

De acordo com a McKinsey, os consumidores “aspiracionais” do segmento de luxo costumam comprar ao menos um produto do tipo por ano, com um gasto que varia entre US$ 3.000 e US$ 10.000. Com a saída desses consumidores do mercado, algumas marcas vêm repensando suas estratégias de engajamento e captura de consumidores. 

Novos produtos, novas estratégias

O grupo britânico Burberry, por exemplo, percebeu ainda no final do ano passado a necessidade de investir em uma “nova arquitetura de preços”, ou seja, acrescentar produtos mais “acessíveis” para composição do carrinho de compras do consumidor digital. 

Joshua Schulman, CEO da Burberry, explicou a nova estratégia: “nos últimos anos, temos estado muito concentrados no topo da pirâmide, especialmente nos artigos de couro. No futuro, iremos restaurar uma arquitetura de ‘bom, ótimo e melhor preço’ num contexto de luxo em todas as categorias”.

De novembro para dezembro de 2024, com a mudança de posicionamento, a empresa registrou crescimento de novos clientes pela primeira vez em dois anos. As vendas em loja da empresa no terceiro trimestre também cresceram 4% nas Américas — Estados Unidos, Brasil, Canadá, México e Panamá — o que ajudou a reduzir as perdas globais.

Ao contrário dos amantes da moda mais ricos, os consumidores com rendimentos mais baixos perdem a sua confiança nos gastos quando confrontados com pressões financeiras como a inflação e o risco de demissões.

Mudança no perfil do consumidor e no formato dos produtos

Além de repensar o tipo de produto, o formato e tamanho dos produtos no mercado de luxo também passam por mudanças para se adaptar às novas realidades. Enquanto os consumidores de fato ricos continuam comprando independente da inflação ou flutuações econômicas, os consumidores aspiracionais cortam gastos diante de dificuldades financeiras. 

Uma das estratégias possíveis nesse cenário, aproveitada pelo mercado de perfumaria, é oferecer versões menores de seus carros-chefe, como perfumes que cabem na bolsa e, portanto, são mais baratos. 

Acessórios como óculos e cintos de couro também podem ser ofertados, como explicou Joëlle Grunberg, líder do setor de vestuário, moda e luxo da McKinsey na América do Norte. Ele cita como exemplo um cinto Gucci de US$ 420 ou um perfume Yves Saint Laurent de US$ 98, duas marcas pertencentes ao grupo de luxo francês Kering. Enquanto a Gucci arrecadou cerca de US$ 8 bilhões em 2024 — um declínio de 21% em relação a 2023, a Kering Eyewear gerou US$ 1,67 mil milhões, um aumento de 6% em relação a 2023.

No caso da Burberry, artigos de couro, agasalhos e lenços entraram nessa estratégia e se tornaram populares na temporada de férias em 2024. No final do terceiro trimestre, a grife observou um aumento na desejabilidade da marca, que mede a intenção de compra, explicou Schulman.

Nem todos são à favor

O Moët Hennessy Louis Vuitton, o maior grupo de luxo do mundo, está entre as marcas que continuam a oferecer linhas de artigos de couro e acessórios a preços mais baixos. O antigo diretor financeiro da companhia, Jean-Jacques Guiony, chegou a afirmar que oferecer novas linhas com preços acessíveis seria um erro para o mercado de luxo, mesmo enfrentando um declínio de consumidores. Segundo ele, o problema é a procura por esses itens e não a oferta ou os preços. 

Para Cheris, o cenário faz com que os consumidores menos apegados ao mercado de luxo gastem seu dinheiro no mercado de fast-fashion, evitando a moda de maior categoria. Segundo ele, há pouco no meio do caminho que possa satisfazer o aspirante ao mercado de luxo, que fica restrito a poucas opções e marcas. 

De acordo com Grunberg, existem dois tipos de possíveis consumidores que podem ser captados pelas marcas de luxo: os jovens profissionais que se manterão fiéis à medida que o seu poder de compra aumentar, e os clientes que talvez nunca gastem US$ 5.000 numa mala de mão, mas que compram regularmente produtos de preço mais baixo.