Imagine a cena mais óbvia quando se pensa em agro: planícies a perder de vista, lavouras verdes e simétricas, máquinas de grande porte desde o plantio até a colheita. Agora esqueça. “O que fazemos é muito diferente do cultivo tradicional. A gente virou o agro de ponta cabeça”.
A declaração de Geraldo Maia, co-fundador e CEO da Pink Farms durante sua palestra no 14º Fórum E-commerce Brasil, não é exagero. Desde o início da operação em 2017, a empresa de fazendas verticais tornou-se a maior da América Latina. No decorrer da apresentação, um número se sobressai: 1m² de área produtiva é equivalente a 400 vezes em relação ao campo.
Para chegar nesse resultado, não basta a luz rosa, característica do ambiente de cultivo, obtida por meio de painéis de LED desenvolvidos internamente. Tudo é completamente monitorado: iluminação, água, solução nutritiva, nível de CO²… Além das variáveis externas, é possível saber quando começou o cultivo e com qual semente. “Usamos uma quantidade absurda de sensores”.
As plantas são cultivadas num modelo hidropônico tipo floating. Em resumo, elas são alimentadas com uma solução nutritiva que circula a todo instante. “Não tem nada de pesticida, herbicida. Também não há perda. Nesse sistema usamos 60% menos fertilizante e 95% menos água em relação aos métodos tradicionais”, reforçou Maia.
Uma alternativa ao colapso
A dimensão e a necessidade de iniciativas como essa ficam mais evidentes diante do cenário apresentado por Maia. Por mais que a tecnologia avance, ela precisa dar conta da demanda para uma população mundial estimada em 10 bilhões em 2050.
“No Brasil já estamos usando 50% da área de produção extensiva com potencial para agricultura. Um terço dessas áreas sofreram com erosão e contaminação nos últimos anos. Ao mesmo tempo, não é possível alimentar todo mundo usando os métodos tradicionais”, sentencia. O ser humano também não ajuda nessa equação: 1,3 bilhões de toneladas de alimentos desperdiçados anualmente.
Além do uso intensivo de terras, outros fatores se relacionam à degradação: o uso de defensivos agrícolas, que aumentou em dez vezes no país desde os anos 1970, e o consumo de água. “A agropecuária usa 70% da água fresca no mundo. Isso fica ainda mais impactante diante de tecnologias intensivas para o uso da água dos oceanos”, alerta. Para Maia, iniciativas como essa podem aumentar a produtividade mas não agregam valor ao produto final.
Modelo em construção permanente
Mesmo sendo promissor, o modelo da Pink Farms precisa se reinventar a cada instante. “Tem muito desenvolvimento e é um mercado com muita margem para crescer. Com a quantidade de dados sendo retroalimentados, a gente faz muita coisa diferente”, observou Maia.
Uma delas é o consumo de energia. A unidade na Vila Leopoldina negocia diretamente o contrato de energia, além de revisar a eficiência nos equipamentos. Na visão de Maia, as novas fazendas verticais devem ser mais baratas e com novos métodos de automação. “Estamos bem no começo disso. Nosso mercado ainda não está pronto. Existem complexidades que estão sendo tratadas”, explicou.
Isso não se aplica apenas à energia ou ao processo, como o uso de fertilizante e sementes específicas. Além da Pink Farms, outras empresas desenvolvem seus modelos de fazenda verticais, como as norte-americanas Aerofarms e Fifth Season — esta última, inclusive, interrompeu suas atividades recentemente.
“Ainda tem novas empresas surgindo, muitas empresas quebrando. Como toda startup, vamos ter alguns aprendizados nesse caminho”, observou. Se não houver mudança de rota, a Pink Farms pretende operar 30 novas fazendas verticais nos próximos cinco anos. “Planejamos unidades em trade off com fazendas grandes para ser eficiente com o uso de recursos e ganhar em viabilidade financeira”, finalizou.
Esse texto foi escrito por André Rosa, em cobertura especial para o Fórum E-Commerce Brasil 2023.