Há algo estranho no ar. Ou fora dele. Diversas e bem-sucedidas ações de censura de conteúdos e sites na web nos fazem refletir sobre o papel da mesma e sobre a subversão do seu sentido original e primário: servir de veículo de manifestações livres e democráticas.
Até que ponto é válido sucumbir a um governo, estado ou corporação em nome da “saúde dos negócios” ou defesa de interesses pagando um preço caríssimo, a longo prazo, que é permitir a influência do poderio financeiro das grandes corporações no “editorial” dos sites, à moda da mídia tradicional?
Considerações gerais sobre liberdade e internet
A internet, em sua ramificação mais conhecida, a web, sempre foi um símbolo, por assim dizer, da plena liberdade de expressão do indivíduo, palco das mais variadas manifestações artísticas, culturais, políticas; de todos os tipos.
Uma web assim foi responsável por uma grande mudança (até mesmo uma revolução) na nossa maneira de agir e interagir com pessoas, culturas e diferentes visões de mundo. A mídia tradicional, também conhecida como o antigo “quarto poder”, caiu por terra e sucumbiu frente aos sites e blogs independentes, dinâmicos, opinativos, vibrantes, personalizados; indo além da mera reprodução dos fatos “manjados” e conhecidos, retratados com a frieza típica das antigas corporações da mídia. Talvez a maior revolução cultural que a humanidade assistiu (e participou ativamente) nos últimos tempos.
A visão que pessoalmente tenho da web é a de um grande palanque público, multi-facetado, amplo, acessível. Um palco onde desfilam as mais diversas vertentes do pensamento humano, levando ao conhecimento de todos uma série de informações e dados abrangentes e plurais, por excelência. O conjunto das características essencialmente democráticas é a essência da internet e é, sem dúvidas, a grande mola propulsora de seu grande crescimento econômico, proporcionado essencialmente pelo conceito chamado de “web 2.0”, que “convidou” o usúario comum de sites a sair de sua posição passiva (“herança” da mídia tradicional) para participar, ativamente, como criador de conteúdo.
A censura: cano entupido
Toda a democracia e liberdade de expressão apresentada acima pouca importância teria para as grandes corporações privadas e estatais se ficasse restrita a um gueto de geeks (ou nerds, como queiram), de pouco representatividade “demográfica”, assim como os guetos anarquistas e socialistas no mundo unidimensional de hoje pouco ou nada incomodam os “neo-liberais” de plantão, que enxergam nesses “guetos” um curioso e inofensivo contraponto ao modo corrente de viver e pensar uma sociedade.
Porém, quando há um crescimento absurdo de usuários acessando a internet e na medida em que este meio torna-se popular e acessível, há, conforme é possível enxergar nos casos recentes de censura, um “medo” generalizado, protagonizado pelo lado “mais forte” ou pelo poder estabelecido da história.
Ora, não é difícil entender: imagine se a internet fosse inserida no Brasil em plena era de ditadura? Fatalmente, o meio seria censurado de todas as formas possíveis e imagináveis, já que seria muito mais poderoso, direto e contundente que belas canções com mensagens subliminares de bossa-nova e mpb.
Blog Censurado em Cuba
Em Cuba, recentemente, o blog de maior audiência naquele país, o ‘Generación Y‘ foi censurado. Sua autora, Yoani Sánchez, declarou: “Os censores anônimos do nosso famélico ciberespaço tentaram me trancar em um quarto, apagar a luz e não deixar meus amigos entrarem”. Ao retratar, em seus artigos, o dia-a-dia e as dificuldades encontradas pelo povo cubano em sobreviver, em adquirir produtos de informática e “as vagas promessas” de mudança do novo presidente daquele país, Raúl Castro, irmão de Fidel Castro, acabou “incomodando” o poder estabelecido e foi bloqueado. Em princípio, a autora não poderia nem mesmo atualizar seu blog, mas acabou descobrindo uma outra forma de fazer as atualizações.
Google: serviços censurados na China
Recentemente, usando como justificativa política os protestos na capital do Tibete, Lhasa, contra a ocupação chinesa, o governo chinês decretou a censura do youtube e, por tabela, dentro da tortuosa lógica totalitarista, o google news. Apesar de que, recentemente, o bloqueio foi “afrouxado” (mais precisamente em 26/03/08) em grande parte devido aos protestos da imprensa mundial (até mesmo os jornalistas estão impedidos de trabalhar na região, tendo que se deslocarem para regiões vizinhas) e o acesso aos sites foi desbloqueado, é realmente preocupante o poder das censuras das nações totalitárias pelo mundo.
Curiosamente, mesmo após ter acatado pedidos de censura chineses, o Google divulgou, recentemente, um pedido de punição econômica, por parte dos Estados Unidos, aos países que adotam censura na internet. Segundo Andrew McLaughlin, diretor do Google para políticas públicas e assuntos ligados ao governo, “É justo dizer que a censura é a principal barreira que enfrentamos para as negociações”.
Panorama global da censura
Esta questão é tão preocupante que já foram criados sites que tratam diretamente do assunto. No site OpenNet Initiative, há um mapa da censura mundial. Nele, é possível ver que o mapa da censura na internet abrange, especialmente, as regiões da Ásia e do Oriente Médio. Não por coincidência, os países com maior concentração de regimes totalitários do mundo.
Recomendo uma pesquisa por este site, para que você possa tomar conhecimento de outros casos de censura ao redor do mundo.
Conclusões Finais
A questão é relevante, atual e preocupante. Percebe-se que muitos outros intereses, além da própria liberdade de expressão, estão inseridos neste complexo contexto de fatos e opiniões divergentes e poderosas.
Temo que os exemplos citados, em que atitudes de censura foram bem sucedidas, possam servir de exemplo negativo para outras nações com tendências totalitárias. Por um momento, a tal “liberdade total de expressão” e a “impossibilidade e frear a informação livre na internet” está em xeque, questiona-se, portanto, até que ponto nossa liberdade está garantida, ou, mesmo, qual a provável influência negativa que possa decorrer da enorme popularização da web, que hoje atravessa todas as fronteiras.
É necessário haver discernimento e bom senso por parte das grandes empresas que ditam as tendências da internet, no sentido de ter alguns conceitos primordiais claros e bem definidos. É intolerável qualquer tipo de censura, trata-se de um verdadeiro crime de “lesa-majestade” intelectual, social e democrático a censura de qualquer informação na internet, ou em qualquer outro meio e mídia.
A luta pela liberdade (e pelo direito a ela) é diária, constante. Nunca está ganha, nunca é confortável. Sempre haverá ditadores, sejam socialistas ou capitalistas, querendo manipular a mente do povo, esconder a verdade.
Que a luta pela verdade e pela liberdade de propagá-la seja uma constante na vida de todas as pessoas e empresas de alguma forma envolvidas com internet.