Logo E-Commerce Brasil

A nova batalha das marcas acontece ao vivo e algumas nem entraram em campo

Por: Evelyn Marques

Evelyn B. Marques é uma das maiores referências em Live Shop Commerce no Brasil. Pioneira no setor, iniciou sua trajetória em 2018 na China e acumula milhares de horas ao vivo e milhões de dólares em vendas em plataformas como Kwai, Shopee e TikTok Shop. Foi a primeira brasileira a trazer o modelo de lives do AliExpress para o país e já participou de projetos piloto internacionais na China, EUA e Reino Unido. Com mais de 4 milhões de fãs nas redes sociais, Evelyn treina live sellers, marcas e equipes e já palestrou na ByteDance em Xangai e no Fórum BRICS 2023. É uma das profissionais mais experientes e atuantes do live commerce na América Latina.

Ver página do autor

O live commerce não é mais uma aposta distante: é um fenômeno consolidado globalmente. Globalmente o formato movimentava US$ 157 bilhões em 2023, tornando-se um dos principais motores do varejo digital e transformando live sellers em uma força profissional tão estruturada quanto equipes de vendas tradicionais. Nos Estados Unidos, o TikTok Shop fez o formato crescer mais de 200% em um ano, levando o YouTube a Amazon a correrem para ampliar suas próprias iniciativas de compra ao vivo. No Brasil, o avanço é visível: datas como 11/11 e Black Friday já registram centenas de milhões de views e picos de conversão em transmissões ao vivo, com sellers profissionais operando diariamente em plataformas de social commerce.

Pessoa apresentando roupas em frente à câmera do celular montada em ring light para uma transmissão de live commerce.
Imagem: Freepik.

Mesmo com essas evidências, o paradoxo brasileiro persiste: o consumidor já aprendeu a comprar ao vivo, com interação, demonstração, oferta limitada e senso de comunidade. Quem ainda não aprendeu a vender nesse canal são as marcas.

Desafio interno das marcas com live commerce

A maior barreira hoje não é tecnologia, investimento ou falta de cases. É organização interna. O live commerce cai num limbo corporativo em que ninguém sabe ao certo quem deveria comandar essa vertical: marketing ou comercial? Marketing reluta e o comercial hesita.

O erro começa pela definição equivocada do papel do live seller: a pessoa diante da câmera mostrando produtos com link para venda no feed da mídia social. Muitas empresas tratam o live commerce como extensão de marketing de influência, quando na verdade esse live seller não é influenciador. Ele não está criando lifestyle ou narrativa aspiracional, ou conteúdo com storytelling. Ele não está produzindo conteúdo para manter relevância, mas sim operando um balcão de vendas ao vivo, no qual demonstra, explica, responde a dúvidas e converte rápido. A única diferença é que esse balcão está diante de uma câmera, com centenas de pessoas assistindo em tempo real.

Quando o marketing assume o live commerce, ele tende a aplicar a mesma lógica do conteúdo: estética impecável, roteiros engessados, excesso de cautela, receio de improviso e uma preocupação desproporcional com reputação. O resultado é uma live engomada, lenta, pouco fluida e que não vende.

Por que o modelo híbrido funciona

Por outro lado, quando o comercial tenta puxar a operação, muitas vezes esbarra na falta de domínio sobre narrativa, câmera, linguagem e ritmo. E, dentro da cultura de muitas empresas, a área comercial não tem autonomia para comandar uma iniciativa que se manifesta em ambiente digital e exige criatividade.

O que acontece, então? O live commerce vira “filho sem pai” dentro da empresa. Um projeto que começa empolgado e morre em 60 dias, enquanto poderia estar revertendo milhões em poucas horas.

Enquanto isso, do lado de fora da bolha corporativa, o movimento não para. Na China, prédios inteiros são dedicados a live sellers. Nos EUA, o TikTok Shop virou o maior vetor de crescimento do varejo digital entre jovens. No Brasil, sellers independentes sem grande audiência faturam R$ 30 mil, R$ 40 mil, R$ 50 mil por mês com técnica, recorrência e leitura de dados. Não é tendência, mas sim um novo canal de vendas, porém nas mãos de vendedores comissionados, às vezes dependentes do modelo de negócio, vendendo a partir de qualquer localização.

E como todo canal, ele precisa de dono, de meta e de organização. Não existe live commerce bem-sucedido sem recorrência e não existe recorrência sem algoritmo, que precisa de disciplina.

Se o marketing continuar enxergando o live commerce apenas como conteúdo, vai seguir frustrado e mais atrapalhar a rapidez do negócio do que ajudar. Se o comercial continuar tratando o canal como “ação promocional”, também não vai funcionar.

O modelo que funciona é híbrido. O comercial lidera metas, performance, oferta e estratégia de produto. O marketing dá suporte de narrativa, consistência visual e construção de comunidade com limites diferentes de campanhas. E os sellers profissionais, treinados, técnicos, metodológicos sustentam a experiência ao vivo.

Hoje, o maior desafio das marcas não é decidir se devem entrar no live commerce. É aceitar que, para fazer isso direito, precisam reorganizar responsabilidades internas e reconhecer que live commerce não é publicidade não é influência, não é conteúdo. Live commerce é venda.