A crescente relevância da América Latina como força cultural e operacional foi o foco da pesquisa apresentada por Rafael Araújo, head de consultoria da WGSN América Latina, durante o Fórum E-Commerce Brasil 2025. Em um mundo marcado pela instabilidade econômica e mudanças geopolíticas, o palestrante defendeu que a região vem se consolidando como referência de comportamento, valores e inovação.

Rafael destacou o fim da chamada “aldeia global” formulada por Marshall McLuhan na década de 60. Com a retração da hegemonia dos Estados Unidos e o avanço de políticas protecionistas, novas alianças estão sendo formadas. Nesse contexto, a América Latina surge como alternativa estratégica para negócios, abastecimento e exportação de cultura. “A efervescência latina faz com que a gente exporte cultura e conhecimento, se transformando em um commoditie”, afirmou.
Segundo dados da própria WGSN, 84% da Geração Z na região se dizem orgulhosamente latinos. Esse sentimento de pertencimento amplia o potencial do chamado “soft power”, que combina cultura local, valores comunitários e identidade regional para gerar conexão com o consumidor.
Incerteza como padrão e valor como diferencial
Com base na metodologia STEPIC da WGSN, Rafael apresentou cinco macropropulsores que devem nortear os negócios na América Latina:
1. Inversão da pirâmide etária – a região mais envelhece no mundo, com destaque para o Brasil;
2. Expansão da inteligência artificial – presente em todos os setores;
3. Crescimento dos acordos bilaterais – redesenhando o comércio internacional;
4. Economia baseada em valores – consumidores mais atentos ao que está por trás da marca;
5. Ascensão do varejo hiperlocal – priorização do comércio e da produção locais.
“Estamos vendo consumidores que cada vez mais se conectam com o valor em si do que com as marcas”, reforçou Rafael, sinalizando uma mudança de eixo nas estratégias de marketing e branding.
Três futuros possíveis
A partir dos cenários projetados pela WGSN, Rafael apresentou três caminhos possíveis para os próximos anos:
Cenário pessimista: novas tarifas, recessão e inflação impulsionam o consumo local como forma de proteção econômica. Segundo ele, 70% dos consumidores globais preferem comprar de negócios locais. O case do MILA (curadoria de marcas de moda latino-americanas) foi citado como exemplo de articulação regional diante de barreiras comerciais.
Cenário neutro: mesmo com restrições tarifárias, marcas que adotam preços transparentes e diversificam seu público podem seguir crescendo. “Quando 32% dos consumidores globais sentem que seu poder de compra caiu, é a hora de investir em novas estratégias.” A campanha antitarifa do portal Hypebeast e o foco em consumidores acima de 50 anos, que representarão 40% da população global até 2040, foram apontados como caminhos possíveis.
Cenário otimista: diante da reorganização de alianças regionais, o soft power latino ganha protagonismo. Rafael citou o exemplo da Farm Rio, que abriu uma loja na Argentina, e da Martins Fontes, que tem apostado no e-commerce cross-border. A livraria registrou crescimento de 280% nas compras globais e já obtém 4% da sua receita de vendas online com exportações.
Para Rafael, o futuro da América Latina não está apenas em resistir às incertezas, mas em transformá-las em oportunidade. Em suas palavras, “há possibilidade dentro da incerteza” — e cabe às marcas entenderem o cenário para agir com propósito, estratégia e identidade.