Logo E-Commerce Brasil

Reforma tributária: uma mudança na lógica empresarial

Por: Rogério David

Advogado

Advogado, Mestre em Direito pela Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNI-RIO). Articulista e Palestrante do E-Commerce Brasil. Consultor Jurídico Empresarial. Especialista em Direito Tributário pela PUC-RJ e em Direito Privado pela UFF-RJ. Sócio do escritório David & Athayde Advogados.

Ver página do autor

Com certeza o caro o leitor que vive o universo do e-commerce já sabe que o Brasil está implementando uma ampla reforma de seu sistema tributário sobre o consumo. A promessa é de simplificação de um dos sistemas mais complexos do mundo, por meio da substituição de tributos atuais por novos modelos de arrecadação.

Notas de real, caneta e documentos financeiros sobre a bandeira do Brasil.
Imagem: Envato.

Em que pese algumas indefinições (as alíquotas, por exemplo, ainda não foram definidas), é possível afirmar que não se trata apenas de trocar tributos antigos por novos. A reforma representa uma mudança profunda na lógica de apuração e recolhimento dos tributos, dentre elas, a adoção de novas técnicas de não cumulatividade – entendida resumidamente como o confronto débitos e créditos – com o objetivo de tributar apenas o valor agregado das operações.

Essa mudança demandará atenção redobrada por parte das empresas do e-commerce, já que poderá afetar diretamente modelos de precificação, exigência de capital de giro e fluxo de caixa. Pode ser um erro estratégico focar exclusivamente nas novas alíquotas da CBS e do IBS. O impacto mais relevante pode estar na forma como o sistema como um todo afetará a dinâmica operacional e financeira dos negócios.

O custo de uma operação, por exemplo, é composto não apenas pelo valor da transação, mas também pelos tributos que podem ou não ser recuperados. Tributos como ICMS, PIS e Cofins contam com regras específicas de creditamento, conforme seus regimes de não cumulatividade. Essas regras serão alteradas no IBS e CBS.

Além disso, alguns dos regimes tributários que serão modificados não adotam qualquer técnica de não cumulatividade. É o caso, por exemplo, das empresas optantes pelo Lucro Presumido, no que se refere ao ISS e do PIS e Cofins. Com a implementação da não cumulatividade, o controle dos créditos passará a ser uma nova preocupação para todas as empresas, e não apenas as do Lucro Real, exigindo maior atenção na apuração e na escrituração das operações.

Alterações práticas que o e-commerce vai enfrentar

Essa nova dinâmica dos créditos fiscais poderá impactar, inclusive, a escolha das empresas pelo Simples Nacional, que, embora preveja uma tributação mais benéfica, em regra, não permitirá a transferência de créditos calculadas sobre as alíquotas de referência, mas sim com base no valor efetivamente pago.

Por isso, um e-commerce que hoje está no Simples Nacional talvez terá que repensar seu modelo ao realizar operações B2B, já que nesse segmento a transferência de créditos poderá ser um diferencial concorrencial.

Outro ponto sensível é a adoção do split payment, mecanismo que separa e destina automaticamente a parcela correspondente ao tributo no momento da transação financeira. Hoje, a empresa recebe o valor total da venda e só precisa recolher o imposto posteriormente, o que pode representar um prazo de até 55 dias com o valor em caixa. Com o split payment, esse intervalo desaparece: os recursos vão direto para os cofres públicos, reduzindo o capital disponível e exigindo ajustes na gestão do fluxo de caixa.

Estratégia financeira e operacional em tempos de mudança

Diante desse cenário, torna-se imprescindível que as empresas do e-commerce revejam suas estratégias financeiras e operacionais. A combinação entre alíquotas potencialmente mais altas, novas regras de creditamento e a possibilidade de imediata retenção dos tributos via split payment pode comprometer o capital de giro, pressionar os preços e afetar a competitividade.

Por isso é que podemos afirmar: mais do que uma reforma tributária, o que está em curso é uma mudança estrutural na lógica de funcionamento dos negócios no Brasil.