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O novo comércio digital: quando máquinas começam a escolher por nós

Por: Rebecca Fischer

Chief Strategy Officer (CSO) de co-fundadora da Divibank

Chief Strategy Officer (CSO) de co-fundadora da Divibank, ela é formada pela Universidade de Georgetown e tem mais de 12 anos de experiência na indústria de marketing e publicidade. Iniciou sua carreira em 2008 como estagiária na Pinacoteca do Estado de São Paulo e, ao longo dos anos, ocupou Diretora de Sucesso do Cliente na Skai (antiga Kenshoo), onde atendeu clientes como Mercado Livre, Nubank e iFood. Em 2020, uniu-se a Jaime Taboada para fundar a Divibank, combinando sua expertise em marketing digital com a experiência financeira de Jaime.

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A forma como compramos online está passando por uma transformação radical. Em vez de usuários navegando por sites e avaliando produtos manualmente, estamos entrando em uma era em que softwares inteligentes assumem o protagonismo das decisões de consumo. A chamada “agência artificial” – quando sistemas automatizados tomam decisões em nome das pessoas – não é mais uma ideia futurista: ela já começa a moldar o presente do varejo digital.

Pessoa segurando um celular com assistente de compras por IA sugerindo um fone de ouvido, ao lado de um notebook com site de roupas.
Imagem gerada por IA.

Um exemplo recente vem da Amazon, que lançou o recurso “Buy for Me”, permitindo que usuários comprem itens de outros sites sem sair do seu ecossistema. A operação é inteiramente conduzida por algoritmos: eles selecionam, comparam preços, preenchem dados e finalizam o pagamento – tudo de forma invisível para o comprador. Trata-se de uma conveniência inédita, que torna a jornada de compra mais fluida, mas também mais opaca. O que antes era uma decisão consciente e visual agora se transforma em uma série de comandos silenciosos, executados por uma inteligência artificial em nome do consumidor.

Impacto da agência artificial na relação marca-consumidor

Essa mudança traz desafios relevantes para as marcas. Ao transferir a tomada de decisão para agentes computacionais, o elo direto entre empresa e consumidor tende a se enfraquecer. A identidade da marca, seus valores, diferenciais e linguagem passam a disputar espaço com a lógica de recomendação desses sistemas automatizados, que operam com base em eficiência e personalização, mas que nem sempre favorecem o reconhecimento ou a fidelização. Marcas que investiram anos em construir uma narrativa sólida e uma comunidade de clientes fiéis agora enfrentam o desafio de se tornarem visíveis em ambientes mediados por algoritmos que priorizam o custo-benefício acima de tudo.

Outro risco é a padronização da experiência. Se todas as escolhas forem mediadas por plataformas automatizadas que priorizam os mesmos critérios – preço, disponibilidade, prazo -, o papel da marca se dilui. Diferenciar-se, nesse contexto, exigirá mais do que boas campanhas publicitárias. Exigirá relevância real, posicionamento claro e presença consistente nos canais em que esses agentes atuam. E mais: será necessário entender como esses sistemas “enxergam” os produtos e quais atributos influenciam suas decisões. Otimizar descrições, metadados e até imagens pode ser tão importante quanto desenvolver um bom produto.

Estratégias para se destacar em um ambiente automatizado

Além disso, cresce a importância de estratégias que dialoguem com o algoritmo tanto quanto com o consumidor humano. Em um ambiente em que a máquina é o novo “filtro” da experiência, é essencial entender quais dados alimentam esse filtro, quais vieses ele carrega e como se posicionar diante disso. Há, portanto, uma nova camada de competitividade – menos visível, mas profundamente influente.

Há ainda a delicada questão da transparência e da proteção de dados. Com sistemas autônomos processando e agindo sobre informações pessoais, cresce a necessidade de regras claras, responsabilidade e ética. Empresas que não investirem na confiança do consumidor – sobretudo em relação ao uso de seus dados – podem ver sua credibilidade comprometida, mesmo que ofereçam a melhor tecnologia. A transparência sobre como as decisões são tomadas, que critérios são utilizados e como as informações são armazenadas torna-se não apenas um diferencial competitivo, mas uma exigência ética.

Além do varejo: a expansão da agência artificial

Vale lembrar que a agência artificial não se limita ao varejo. Plataformas de streaming já usam algoritmos para sugerir conteúdos personalizados; assistentes virtuais tomam decisões sobre rotas, compromissos e até saúde. A tendência é que essa automatização se intensifique – e, com ela, a necessidade de repensar o papel humano nas decisões digitais. Se, por um lado, a automação libera tempo e simplifica processos, por outro, ela pode limitar a diversidade de escolhas e empobrecer a experiência se não for usada com critério.

Essa nova fase do comércio eletrônico não é apenas uma revolução logística. É uma reconfiguração profunda da forma como escolhemos, consumimos e nos relacionamos com produtos e marcas. Nesse cenário, vencerá quem entender que a tecnologia é meio, não fim – e que, mesmo em um ambiente guiado por códigos, a experiência humana continuará a ser o diferencial mais valioso. Criar conexões autênticas, gerar confiança e oferecer valor além da eficiência serão os pilares de quem pretende prosperar na era dos assistentes digitais.