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Avatares de IA na China: como clones digitais estão dominando o e-commerce

Por: In Hsieh

Cofundador do Asia Latam Tech Forum

Soma a experiência como um dos profissionais precursores e mais inovadores do e-commerce brasileiro, com expertise nas oportunidades em negócios e investimentos digitais entre Brasil e China, colocando-o à frente da maior transformação do mercado internacional na atualidade: a China Digital. Atualmente, acelera negócios digitais chineses no Brasil, sendo o social live commerce o mais recente, primeiramente numa sociedade em 2020 com a Americanas e uma startup chinesa britânica, e agora com o Tiktok Shop, modalidade que será lançada em maio de 2025. Também faz parte do conselho editorial do MIT Sloan Management Review Brasil, e do conselho editorial da CKGSB Knowledge Brasil. Além disso, é parceiro oficial no Brasil do Alibaba Global Iniciative - AGI e é cofundador do Asia Latam Tech Forum. Antes, fez parte da equipe que em 1999 criou o Submarino.com, montou suas próprias empresas como a Baby.com.br, eleita melhor startup do ano pela revista PEGN em 2011, e trouxe a gigante Xiaomi ao Brasil em 2014 como Head de E-commerce Latam quando ainda era uma startup.

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A ascensão dos avatares de IA na economia digital chinesa

Em junho de 2025, o empreendedor e influenciador chinês Luo Yonghao chamou a atenção do mundo quando seu avatar de IA apresentou uma live de sete horas na plataforma de e-commerce Youxuan, da Baidu, gerando ¥55 milhões (US$ 7,65 milhões) em vendas, superando com folga sua própria transmissão anterior, feita por ele pessoalmente. Esse momento marcou uma virada no comércio digital da China, em que os avatares de IA deixaram de ser uma curiosidade e se tornaram uma necessidade operacional.

Mulher asiática sorridente apresenta um frasco de cosmético durante uma live, com comentários e reações virtuais na tela.
Imagem gerada por IA.

A China já experimenta avatares de IA há alguns anos, usando-os em lives, atendimento ao cliente e marketing de influência. Eu mesmo tive contato com a primeira solução há pelo menos três anos. Hoje, o país possui mais de 100 mil humanos digitais atuando no setor de live commerce, que movimenta US$ 946 bilhões.

Mas o sucesso de Luo Yonghao é apenas a ponta do iceberg. De pequenas empresas a gigantes da tecnologia, os avatares de IA estão transformando o varejo, o entretenimento e o social commerce, levantando questões fundamentais sobre regulação, autenticidade e o futuro do trabalho humano.

O avanço de Luo Yonghao com IA: um novo capítulo no comércio digital

Antigo empresário do setor de smartphones e depois estrela das lives, Luo Yonghao foi um dos protagonistas da revolução do e-commerce na China. Após migrar para as lives em 2020 para quitar dívidas de sua falida startup Smartisan, acumulou mais de 24,7 milhões de seguidores no Douyin (versão chinesa do TikTok).

Mas sua live de junho de 2025 com avatar de IA marcou um divisor de águas:

– Vendas: US$ 7,65 milhões de GMV (bem acima da live anterior, feita pessoalmente).

– Audiência: Mais de 13 milhões de espectadores ao vivo.

– Tecnologia: Usou o modelo ERNIE 4.5T, da Baidu, treinado com cinco anos de vídeos de Luo, replicando seu humor, gestos e modo de falar.

Inovação: Primeira interação dupla entre avatares de IA, com Luo e a coapresentadora virtual Xiao Mu trocando piadas em tempo real.

O experimento provou que os avatares de IA não só conseguem imitar, mas também superar os humanos em vendas de alta performance – sem cansaço, pausas ou erros humanos.

Como os avatares de IA oferecem hiperpersonalização em escala

Embora os avatares não criem lives 100% únicas para cada pessoa, eles usam adaptação em tempo real para fazer cada usuário sentir que a experiência é personalizada:

– Inserção dinâmica de conteúdos: O stream-base é o mesmo, mas o avatar adapta recomendações de produtos. Ex.: se existe uma quantidade relevante de usuários de Shanghai, o host promoverá “Público de Shanghai, aproveite esta oferta de frete grátis para sua cidade!” ou no caso de forte presença de outros comportamentos “Como você comprou skincare na semana passada, experimente este sérum!”).

– Imitação de interação ao vivo: Se alguém pergunta no chat “Essa jaqueta pode ser lavada na máquina?”, o avatar responde verbalmente, enquanto os demais participantes continuam assistindo a uma apresentação padrão.

– Narrações ramificadas: Sistemas como o ERNIE da Baidu analisam o perfil da audiência. Se a maioria são mulheres de 25 a 34 anos, o avatar foca mais em beleza do que em tecnologia, criando uma live semicustomizada.

Por que ainda não é 1:1 total? Porque gerar milhões de lives únicas demandaria capacidade de computação quântica. Contudo, startups como a BytePlus (braço de IA da TikTok) já testam as chamadas “lives fractais”, com fundos e produtos personalizados por usuário.

O ecossistema de avatares de IA na China: de pequenas empresas a gigantes

Embora o caso de Luo tenha ganhado as manchetes, pequenas e médias empresas (PMEs) estão adotando avatares de IA de forma massiva:

1. Avatares acessíveis para PMEs

– Custo: A partir de ¥200 a ¥2.000 para criar um avatar básico (apenas uma hora de vídeo e 100 amostras de voz).

    – Uso: Influenciadoras como Wang Xue’er usam avatares para conduzir várias lives simultaneamente, gerando mais de US$ 50 milhões em 18 meses.

    – Eficiência: Trabalham 24 horas por dia, sete dias por semana, sem pausas, sem estresse e sem queda de desempenho.

    2. Humanos digitais de nível corporativo

    – A startup Johnsmith.ai ajudou marcas a gerar mais de US$ 500 milhões em vendas, com custos apenas uma fração do que seria com mão de obra humana.

      – A plataforma de ecommerce Tmall, do Alibaba, já usa assistentes virtuais que respondem dúvidas, recomendam produtos e até fazem “provas” de roupas virtuais.

      3. Adoção em escala

      – Mais de 100 mil avatares de IA já estão ativos no setor de livestreaming na China.

        – O mercado global de avatares de IA deve atingir US$ 5,93 bilhões até 2032, com a região Ásia-Pacífico (liderada pela China) crescendo mais rápido.

        Regulação dos avatares de IA na China: como plataformas e governo agem

        1. Regras das plataformas: um modelo híbrido

        – Douyin (TikTok China): Exige que haja etiquetas identificando conteúdo feito por IA e limita a circulação de conteúdos de baixa qualidade.

          – Taobao e JD.com: Incentivam ativamente o uso de avatares para vendas e atendimento 24/7.

          – WeChat Video: Proíbe avatares 100% autônomos, exigindo supervisão humana.

          2. Supervisão governamental: incentivar com cautela

          – Obrigatoriedade de rotulagem de IA para evitar uso malicioso (como deepfakes).

            – Regras locais, como as da província de Guangzhou em 2024, exigem direitos legais de imagem para criação de avatares.

            – Estão em desenvolvimento padrões nacionais para regular o uso de IA no comércio e na mídia.

            A estratégia da China é clara: incentivar a inovação, mas com mecanismos para reduzir riscos como fraudes e desinformação.

            O que o Brasil e o Ocidente podem aprender

            1. O Brasil ainda tem um gap

            – A adoção de IA no Brasil é bem menor que na China: apenas 41% das empresas usam IA, contra uma integração massiva na China.

              – Principais barreiras: alto custo, escassez de profissionais qualificados e infraestrutura digital deficiente.

              2. Hesitação no Ocidente, mas crescimento iminente

              – Preocupações éticas com deepfakes, privacidade e manipulação ainda travam a adoção nos EUA e Europa.

                – Mesmo assim, avatares como a influenciadora digital Lu do Magazine Luiza e vários outros casos no Brasil mostram que há crescente interesse.

                – As vantagens são objetivas: redução de custos, escala infinita e hiperpersonalização fazem dos avatares uma tendência inevitável no e-commerce global.

                3. Caminhos possíveis

                – Regular sem sufocar: A China oferece um modelo de equilíbrio entre inovação e compliance.

                  – Começar pequeno: PMEs podem testar avatares de baixo custo antes de escalar.

                  – Modelos híbridos: Combinar eficiência da IA com autenticidade humana é a chave para o sucesso.

                  Conclusão: a revolução dos avatares de IA está só começando

                  A live de US$ 7,65 milhões do avatar de Luo Yonghao não foi um acaso – foi um ponto de inflexão. A China mostrou ao mundo que avatares de IA são mais do que modismos. São o futuro do comércio.

                  Para o Brasil e o Ocidente, a pergunta não é se vão adotar, mas sim quão rápido vão conseguir acompanhar. O modelo já está claro: escala, redução de custos e hiperpersonalização. A corrida pelo domínio do varejo impulsionado por IA está apenas começando.

                  Será que o próximo Luo Yonghao surgirá em São Paulo ou no Vale do Silício? A resposta pode chegar antes do que imaginamos.