Logo E-Commerce Brasil

Amazon não consegue conter alto contágio em armazéns nos EUA

Por: Dinalva Fernandes

Jornalista

Jornalista na E-Commerce Brasil. Graduada em Comunicação Social - Jornalismo pela Universidade Anhembi Morumbi e pós-graduada em Política e Relações Internacionais pela FESPSP. Tem experiência em televisão, internet e mídia impressa.

No dia 27 de março, pelo alto-falante, um executivo da Amazon confirmou aquilo que os trabalhadores já temiam: pela primeira vez, um empregado da instalação havia sido confirmado como portador do coronavírus no AVP1. Alguns dos trabalhadores abandonaram seus turnos de trabalho e voltaram para casa, mas outras centenas decidiram trabalhar.

Nos pouco menos de dois meses transcorridos desde então, o armazém localizado no sopé dos Montes Poconos, na região nordeste do estado da Pensilvânia, se tornou o foco mais intenso de contágio pela Covid-19, entre as instalações da Amazon.

Segundo reportagem do jornal The New York Times, legisladores locais acreditam que mais de 100 trabalhadores do armazém tenham sido identificados como portadores do vírus, mas o número exato não é conhecido. No começo, a Amazon informava seu pessoal sobre cada caso novo. Mas quando o número de pessoas infectadas chegou a cerca de 60, os anúncios pararam de informar números específicos.

Casos em outros armazéns

A informação quanto a contágios também foi suspensa em outros armazéns da Amazon. A melhor estimativa é que mais de 900 dos 400 mil trabalhadores braçais da empresa contraíram a doença.

A Amazon viu a pandemia de perto antes de muitas outras companhias dos Estados Unidos. No começo de fevereiro, a empresa expressou preocupação com sua cadeia mundial de suprimento e consultou um especialista em doenças infecciosas. Sediada em Seattle, um dos focos iniciais de contágio, a empresa instruiu seus 50 mil empregados na área a trabalharem de casa, a partir do dia 5 de março.

Mas o estoque de papel higiênico e de quebra-cabeças do site quase se esgotou, e os 100 milhões de domicílios que são clientes do programa Amazon Prime nos Estados Unidos viram a companhia enfrentar obstáculos. Encontrar um equilíbrio entre cumprir a promessa de entregas em um ou dois dias e manter os trabalhadores seguros vem sendo um desafio para a Amazon desde então.

Dave Clark, que comanda as operações mundiais da Amazon, afirmou em comunicado que “começamos mais cedo que a maioria das empresas a adotar medidas de proteção para nossas equipes, e nos adaptamos a cada dia a fim de conseguir melhoras”. Ele apontou que o armazém fica em uma região onde o grau de contágio comunitário é elevado, e disse que não acreditava que os trabalhadores tivessem contraído a doença no local de trabalho.

Mas trabalhadores e líderes locais estavam preocupados desde o começo por a Amazon não estar fazendo o suficiente.

Leia também: Amazon dos EUA terá que explicar mortes de funcionários por coronavírus

Outras medidas

A companhia em fevereiro recorreu aos serviços do médico Ian Lipkin, especialista em doenças respiratórias na Universidade Columbia, que aconselhou que a empresa adotasse verificações de temperatura, distanciamento social e outras medidas.

Mas algumas das recomendações de segurança padrão não entraram em uso comum no AVP1 por quase dois meses, de acordo com entrevistas com seis trabalhadores, líderes locais e autoridades eleitas, alguns dos quais solicitaram que seus nomes não fossem mencionados por medo de represálias.

Foi só na primeira semana de abril, cerca de um mês depois que os trabalhadores de escritório da empresa em Seattle foram instruídos a trabalhar de casa, que verificações de temperatura foram adotadas no armazém de Hazle Township. Máscaras estavam disponíveis para os trabalhadores que as solicitassem, mas seu uso não era obrigatório.

As mesas no refeitório foram distanciadas, mas quando os trabalhadores que tinham decidido permanecer em casa começaram a voltar ao trabalho, o salão começou a ficar lotado na hora do almoço. A Amazon adotou um novo período de intervalo, em 21 de abril, depois que os trabalhadores reclamaram.

Em mensagens na mídia social e entrevistas, trabalhadores argumentaram que as instalações deveriam ser fechadas temporariamente e passar por uma limpeza profunda.

Pelo final de março, a deputada estadual Tarah Toohill, republicana cujo distrito eleitoral abarca o armazém, começou a ouvir reclamações dos trabalhadores. Um parente de um deles ligou para dizer que a equipe de limpeza da Amazon não tinha aparecido para trabalhar no dia anterior. Dois dias depois, a mãe de um prestador de serviços à Amazon disse à deputada que as mudanças no armazém não haviam sido suficientes.

A Amazon continuou a alertar os trabalhadores sobre novos casos de contágio. Em 4 de abril, foram quatro casos. Em 6 de abril, nove. Em 8 de abril, oito.

Leia também: Amazon terá despesa adicional de US$ 4 bilhões com Covid-19

Fechamento dos armazéns

A vizinha Hazleton, que fica no cruzamento de duas rodovias interestaduais, se tornou um foco de difusão do vírus, e surgiu pressão crescente sobre outros empregadores da área para que fechassem suas instalações. Em poucos dias, mais de 1,5 mil pessoas assinaram uma petição online pedindo que a Amazon fechasse o AVP1. A petição afirmava que era quase impossível respeitar o distanciamento social, no complexo.

O deputado federal do distrito, o democrata Matt Cartwright, concedeu uma entrevista coletiva online e anunciou que havia solicitado que a Administração de Saúde e Segurança Ocupacional (OSHA, na sigla em inglês), do governo federal investigasse três dos grandes empregadores da área, porque ele havia sido informado de problemas na adoção do distanciamento social e de uma falta de equipamento de proteção.

Ele confirmou mais tarde que um desses empregadores era a Amazon. Toohill ligou para os grandes empregadores industriais da região, entre os quais a Amazon, pedindo que fechassem temporariamente mas continuassem a pagar os trabalhadores.

A pressão cresceu quando uma fábrica de processamento de alimentos da Cargill, no mesmo parque industrial ocupado pela Amazon, fechou as portas, e prometeu que manteria por duas semanas os pagamentos de seus 900 trabalhadores. Mais de 100 deles haviam sido identificados como portadores do vírus.

Em 10 de abril, a Amazon anunciou 11 casos novos. Em 13 de abril, houve quatro novas infecções e no dia 15 a empresa informou aos trabalhadores que mais 11 pessoas estavam infectadas. Depois disso, não surgiram mais informações específicas; apenas anúncios de que casos adicionais haviam surgido.

Em um quadro de avisos no armazém, diversos trabalhadores perguntaram aos seus gerentes por que o número de pessoas infectadas não estava mais sendo informado. A resposta foi que isso não fazia diferença, e a empresa não queria causar medo aos trabalhadores.

Leia também: Jeff Bezos quer testar todos os funcionários da Amazon para Covid-19

Limpeza nas instalações

Cedinho na manhã de 11 de abril, caminhões de uma companhia de dedetização chegaram ao estacionamento do armazém. Uma equipe de trabalhadores vestindo trajes de proteção pesados aspergia um desinfetante em forma gasosa no armazém durante as paradas dos trabalhadores.

Houve outras melhoras na segurança. Enquanto antes duas pessoas trabalhavam juntas para mover uma pilha de 10 pallets vazios, o novo método usava trabalhadores individuais cada qual movimentando cinco pallets. Os administradores instruíram o pessoal a mover material pesado aos empurrões, em lugar de pedir ajuda de outros trabalhadores para erguê-lo. O uso de máscaras se tornou obrigatório.

Mesmo assim, no final de abril certas áreas da instalação ainda tinham movimento de pessoal excessivo, e os trabalhadores não se sentiam seguros.

Um trabalhador disse a colegas em um grupo no Facebook que o distanciamento social estava sendo praticado em toda parte, menos na movimentada área próxima às baias de embarque, conhecida como End of Line. Outra trabalhadora disse ter visto 25 pessoas trabalhando de rosto descoberto em lados opostos de pallets, apanhando produtos para prepará-los para embarque.

Desde que voltou ao trabalho, no final de abril, uma funcionária relatou que, em muitos dias, faz turnos de quase 11 de duração – horas extras para compensar o tempo adicional que ela passou fora do trabalho por doença, além das duas semanas de licença de saúde remunerada que a Amazon oferece aos trabalhadores contaminados com a Covid-19.

Ela disse estar contente por algumas estações de trabalho terem sido removidas, em sua ausência, porque ficavam perto demais umas das outras. E alguns trabalhadores foram contratados apenas para manter os recipientes de desinfetante abastecidos.

As informações são da Folha de S. Paulo