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O novo poder corporativo da era da IA está nas mentes, não nos modelos

Por: João Eliezer Cunha Guimarães

João Eliezer Cunha Guimarães é sócio-fundador da Camaya Partners, atuando há 24 anos em M&A. Possui ampla experiência em transações e projetos em setores como serviços, varejo, tecnologia, alimentos, químicos e cosméticos. Liderou a reestruturação da Montelac Alimentos S/A, uma das dez maiores empresas de laticínios do Brasil na época, adquirindo participação relevante no capital da companhia, e é membro do conselho da Evertrend Ltda.

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A corrida global pela inteligência artificial não é apenas sobre quem constrói os modelos mais poderosos, e sim sobre quem consegue manter as mentes que os constroem. A disputa por talentos de IA atingiu um novo patamar, e os dados mostram que essa guerra já move bilhões.

Homem olhando para tela com código e símbolo “AI”.
Imagem gerada por IA.

No Brasil, a participação das transações de fusões e aquisições envolvendo inteligência artificial quase quintuplicou em 2024, passando de 5% das operações totais em 2023 para 23% no ano passado, segundo levantamento do escritório BZCP, que analisou 70 transações com valores entre R$ 50 milhões e R$ 500 milhões. O movimento marca o retorno do crescimento após o índice estabilizar em 13% entre 2021 e 2022, um sinal claro de que a “compra de cérebros” virou parte central da estratégia de expansão corporativa.

A tendência é impulsionada por um ecossistema em franca transformação. Um estudo da Amazon Web Services (AWS) revela que 53% das startups brasileiras já utilizam IA em seus negócios, enquanto 31% estão desenvolvendo novos produtos baseados na tecnologia. O mesmo levantamento aponta que 78% acreditam que a inteligência artificial transformará seus setores nos próximos cinco anos.

A escassez de especialistas como obstáculo

Essa corrida ainda enfrenta um obstáculo crescente – a escassez de especialistas. Pesquisa global da Bain & Company, realizada com líderes corporativos de cinco países, mostra que 44% afirmam que a falta de expertise interna já atrasa a adoção da IA em suas empresas. No Brasil, o cenário não é diferente: 39% dos executivos de tecnologia relatam o mesmo desafio em 2025, um salto em relação aos 25% de 2024. A consequência é direta: salários em alta e rotatividade acentuada. A demanda por profissionais de IA cresce 21% ao ano, impulsionando remunerações e tornando a retenção de talentos uma vantagem competitiva por si só.

Cultura, propósito e o diferencial além do código

O episódio recente da Meta, que tentou atrair engenheiros das rivais como OpenAI e Anthropic mesmo após oferecer pacotes milionários, é emblemático. Ele mostra que a lealdade em tecnologia não se compra, se conquista. Bonificações escalonadas, golden handcuffs e planos de vesting prolongados ajudam na retenção de talentos, mas os verdadeiros motores são o propósito e o prestígio intelectual.

Mais do que cifras, o que retém profissionais de IA é a sensação de estar moldando o futuro. As empresas que entenderam isso criam culturas de aprendizado contínuo, liberdade criativa e impacto real – atributos que valem mais do que qualquer pacote de bônus. Nesse contexto, o diferencial competitivo deixou de ser o código-fonte e passou a ser quem escreve o código.

Em um mundo onde dados são commodities e modelos podem ser replicados, o capital intelectual se tornou o ativo mais escasso e estratégico do século XXI. E talvez a pergunta que definirá a próxima década não será quanto vale uma startup, mas quanto valem as pessoas capazes de criá-la.