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A “guerra” dos marketplaces e a jogada inédita da Amazon

Por: Rodrigo Garcia Petina

Diretor-executivo da Petina Soluções Digitais. Especialista em gestão de marketplaces, graduado em ADM, com MBA em Gestão de Projetos, e atua no mercado digital desde 2008. Em 2021, foi eleito o melhor consultor pelo Mercado Livre, responsável pela implementação de lojas de moda como Nike, Scala, Lupo, Guess, Puket e MyShoes.

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O mercado de e-commerce brasileiro acaba de assistir a um movimento inédito que pode redefinir a disputa entre os grandes players do setor. A Amazon anunciou que vai zerar, até dezembro, as taxas de armazenagem e envio cobradas dos lojistas que utilizam o Fulfillment by Amazon (FBA) – programa em que a empresa assume todo o processo de armazenamento, embalagem, entrega, atendimento ao cliente e logística reversa. É a primeira vez que a companhia adota essa política e, segundo o que se sabe, trata-se de uma iniciativa inédita até mesmo no cenário global.

Centro de distribuição da Amazon com fachada moderna, logo em destaque e caixas de entrega empilhadas à frente.
Imagem gerada por IA.

Segundo levantamento da ABIACOM (Associação Brasileira de Inteligência Artificial e E-commerce), o e-commerce brasileiro deve faturar R$ 224,7 bilhões em 2025, o que representa um crescimento de cerca de 10% em relação a 2024. Apenas no primeiro semestre deste ano, o setor já registrou alta de 7% no GMV (valor bruto de mercadorias) e 5% no volume de pedidos, sinalizando que o consumo digital continua aquecido mesmo em um cenário econômico desafiador.

Dentro desse contexto, os marketplaces continuam como protagonistas da expansão: segundo o relatório Setores do E-commerce no Brasil da Conversion (julho de 2025), o Mercado Livre concentra cerca de 34,3 % do tráfego de marketplaces, seguido por Shopee com 24,8 % e Amazon Brasil com 16,8 %. Os números ajudam a dimensionar o peso estratégico da recente decisão da Amazon, que, ao zerar taxas do FBA, tenta acelerar sua participação e reduzir a distância para o líder regional.

Na prática, o que isso significa? A Amazon está abrindo mão de uma de suas principais fontes de receita em plena temporada de Black Friday e Natal – os dois meses mais fortes do varejo – para conquistar aquilo que mais falta em seu ecossistema brasileiro: vendedores.

A disputa pelo vendedor, o novo campo de batalha

Nos últimos anos, a guerra entre Shopee e Mercado Livre vinha dominando o cenário, com estratégias agressivas voltadas principalmente para o consumidor final. A Shopee popularizou o frete grátis e as campanhas em datas duplas – 9.9, 10.10, 11.11 -, quando reduz o valor mínimo de compra para R$ 10, enquanto, no dia a dia, o benefício costuma valer para pedidos acima de R$ 19. O Mercado Livre, por sua vez, reagiu diminuindo o valor mínimo para entrega gratuita para R$ 19 e criando seu próprio programa de afiliados, intensificando a disputa pelo consumidor brasileiro.

Agora, a Amazon entra nesse jogo com uma tática diferente: atacar a base de vendedores, o lado mais difícil de escalar em qualquer marketplace. O recado é claro, ela quer que o vendedor olhe para sua plataforma como prioridade.

E a estratégia vai mais longe do que já foi divulgado. Além de zerar as taxas do FBA por dois meses, quem nunca utilizou o serviço deve ter isenção de comissão. E há um estímulo adicional: quem reinvestir 3% das vendas em retail media pode estender o benefício por quatro meses. Ou seja, a Amazon está trocando receita imediata por relevância e fidelização no longo prazo.

O custo da conquista

Essa ofensiva não é barata. O FBA é um serviço logístico complexo e de alto custo operacional. Abrir mão dessas taxas durante o pico de vendas significa uma decisão estratégica de risco calculado, mas com potencial de retorno elevado.

O timing não é coincidência. Ao agir antes da Black Friday, a Amazon cria um efeito de atração sobre novos lojistas e pequenos e médios empreendedores que tradicionalmente priorizavam outras plataformas. Muitos deles, ao experimentarem o FBA pela primeira vez, podem descobrir ganhos de eficiência e continuar no programa mesmo após o fim da isenção.

Quem ganha com a guerra?

Há um ponto positivo claro nesse embate: quem mais se beneficia é o vendedor e, por consequência, o consumidor. A concorrência força cada plataforma a melhorar suas condições, aprimorar serviços e repensar seus modelos de rentabilidade.

Estamos assistindo a um novo capítulo da profissionalização do e-commerce no Brasil. Shopee, Mercado Livre e Amazon estão empurrando o setor a um patamar de eficiência e competitividade que até pouco tempo atrás era impensável.

A competição por vendedores tende a ampliar o sortimento de produtos disponíveis, reduzir prazos de entrega e pressionar os preços para baixo, já que cada marketplace busca oferecer a melhor experiência de compra possível. Com mais lojistas migrando para o FBA e usufruindo da estrutura logística da Amazon, o cliente final passa a ter entregas mais rápidas e confiáveis, inclusive em regiões onde o alcance era limitado. Esse efeito em cadeia reforça a profissionalização do setor e eleva o padrão de qualidade do e-commerce brasileiro, criando um ciclo virtuoso em que a eficiência das plataformas se traduz em conveniência, economia e confiança também para o consumidor.

Quando gigantes brigam, quem ganha é o ecossistema.