Logo E-Commerce Brasil

'O Agente Secreto' desperta corrida por camiseta da Pitombeira no comércio eletrônico

Por: Amanda Lucio

Jornalista e Repórter do E-Commerce Brasil

Em menos de quinze dias em cartaz, O Agente Secreto, novo filme de Kleber Mendonça Filho, levou mais de meio milhão de espectadores aos cinemas. Além de repercutir nas redes sociais, o longa estrelado por Wagner Moura reacendeu o interesse pelo carnaval pernambucano a partir de um item específico: a camiseta do bloco olindense Pitombeira dos Quatro Cantos, usada pelo protagonista e transformada em objeto de desejo do público.

Retratado em Recife durante a década de 70, Wagner Moura vive o pernambucano Marcelo (Imagem: Reprodução)

O modelo foi lançado no carnaval de 1978 e reaparece em uma das cenas do filme, o que atraiu consumidores de diferentes regiões do país. Relançada na última semana, a primeira remessa esgotou em dois dias, com vendas realizadas apenas na sede da agremiação e na loja Espaço de Cultura Popular, ambas em Olinda.

Nos comentários das redes sociais do bloco, multiplicam-se pedidos por venda online e envio para outros estados.

Na rede social da agremiação, internautas procuram informações sobre as vendas online das camisetas (Imagem: E-Commerce Brasil)
Em outra rede social, o usuário comenta que a camiseta esgotou na loja física (Imagem: E-Commerce Brasil)

A demanda expõe um cenário frequente entre pequenos e médios empreendedores: a vitrine digital cresce, mas a estrutura comercial nem sempre acompanha. Segundo a pesquisa NuvemCommerce, da Nuvemshop, o Instagram se tornou o principal espaço de divulgação para PMEs. Entre os entrevistados, 95% utilizam a plataforma para fortalecer a marca e 97% estão ativos em ao menos uma rede social.

(Imagem: E-Commerce Brasil)

Para Omero Galdino, especialista do Sebrae/PE, o principal entrave é a gestão do tempo. “Ele (o pequeno empreendedor) fica muito preso na operação, então ele não tem tempo de pensar, por exemplo, nem expansão e nem estratégia. A própria baixa familiaridade também com a tecnologia.”

Nordeste ainda compra mais do que vende

Os dados da Associação Brasileira de Inteligência Artificial e E-commerce (ABIACOM) indicam que, em 2024, o comércio eletrônico nacional movimentou R$ 204,3 bilhões. A região somou R$ 32,9 bilhões como destino (16,13% de share) e R$ 11,2 bilhões como origem (5,52%).

Pernambuco aparece com R$ 5,9 bilhões como destino (2,89%) e R$ 3,2 bilhões como origem (1,61%). Os números reforçam a disparidade entre compra e venda, associada a desafios logísticos, custos de frete e desafios com a digitalização.

Para Fernando Mansano, presidente da ABIACOM, o avanço recente decorre dos investimentos logísticos realizados por grandes e-commerces, marketplaces e transportadoras. “Um exemplo disso são os Centros de Distribuição construídos no Nordeste, que possibilitam entregas mais rápidas e com menor custo para o consumidor – muitas vezes até com frete grátis. Antes, a maioria dos pedidos precisava ser enviada de outras regiões, especialmente do Sudeste, onde se concentra a maior parte das vendas online, com destaque para o estado de São Paulo.”

Ele acrescenta que o acesso à internet e aos dispositivos móveis também estimulou a adesão às compras digitais. “Outro fator que tem contribuído para esse crescimento é o amplo acesso à internet e aos dispositivos móveis, como smartphones e tablets, aliado à melhoria na usabilidade das lojas virtuais nesses aparelhos. Isso tem favorecido uma maior adesão às compras online em diversas regiões do país e entre diferentes classes sociais.”

Comunidades imaginadas

A movimentação em torno da camiseta da Pitombeira também evidencia o comportamento de comunidades culturais no ambiente digital. De acordo com a Monks., consumidores ligados a fandoms movimentaram R$ 21,5 bilhões no Brasil e US$ 300 bilhões no mundo com produtos licenciados no último ano.

Um dos elementos centrais desse processo é o trabalho do time de figurino, disse Mariana Sanitloni, Head de Engajamento ao Cliente na WGSN, empresa líder em tendências de comportamento e consumo. Segundo ela, a equipe faz uma pesquisa minuciosa para garantir que cada peça de roupa conte uma história, caracterize o personagem e esteja perfeitamente alinhada ao universo narrativo.

“Quando isso é bem executado, o figurino deixa de ser apenas vestimenta e se torna um signo visual poderoso, capaz de comunicar valores, estilos de vida, identidade e captura o espirito do tempo em que ele está sendo ambientado”, comenta.

Em junho, o Dia dos Namorados despertou um comportamento semelhante: a união entre cinema e consumo. Daquela vez, feita pela MUBI em colaboração com a C&A, com itens limitados e vendas exclusivas pelos canais digitais.

No caso do bloco, a venda tradicionalmente restrita ao território local ganhou projeção nacional após a aparição no filme. Mas, sem um e-commerce próprio, a amplificação do interesse não se converte integralmente em receita – um problema comum entre negócios culturais de pequeno porte.

O presidente da Pitombeira, Hermes Neto, destaca o papel das parcerias entre negócios para atender parte da demanda. Segundo ele, a loja que comercializa as unidades localmente também realiza envios para outros estados. “Como ele já tem toda essa logística de entrega para fora e a gente tá com essa parceria com eles, e as pessoas que queiram uma camisa para fora aqui do estado podem procurar eles. No momento, a gente tá esperando chegar uma nova remessa de camisa”, afirma.

A camiseta, enfatiza Neto, será o foco comercial do bloco no próximo ano. “Vamos trabalhar em cima dessa camisa para ter receita para vir à rua para ajudar no Carnaval de 2026.”

Antes de tudo, é preciso conexão

É natural que as marcas corram para aproveitar o hype quando um objeto de cena vira item de desejo, comenta Mariana Sanitloni. No entanto, é preciso ter coerência e construir uma relação autêntica com o público antes de aproveitar a trend. “O hype gera picos de atenção, enquanto a autenticidade é o que sustenta lealdade e valor de marca no longo prazo”, ressalta.

“Para não parecer oportunista, as marcas precisam participar das conversas que importam. Cada vez mais, o verdadeiro indicador de performance não é só impressões ou cliques, mas o engajamento cultural e comunitário“, lembra. “Quando uma marca se apoia exclusivamente em microtendências, corre o risco de saturar o público e diluir sua identidade. Por isso, aproveitar o buzz precisa ser um movimento estratégico, sempre alinhado ao DNA da marca e guiado por curadoria e não apenas por velocidade”, conclui a executiva.