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"Futuro não é ficção científica, mas sim uma realidade atual", afirma Leandro Karnal

Por: Giuliano Gonçalves

Jornalista e editor do portal E-Commerce Brasil, possui formação em Produção Multimídia pelo SENAC e especialização em técnicas de SEO. Sua missão é espalhar conteúdos inspiradores.

Foi com as palavras desse título que Leandro Karnal, professor, historiador e um dos influencers mais buscados atualmente definiu a nossa realidade. Diretamente do Fórum E-Commerce Brasil Grand Connection, ele acrescentou que “quem não conseguiu perceber que o futuro começou já está para trás”, e que ele próprio precisou se reinventar por completo para atuar nesta nova realidade. Acompanhe a seguir os principais pontos abordados por esse ícone do conhecimento humano — que, cá entre nós, dispensa comentários.

Aprendendo com o momento

Segundo Karnal, muitas coisas só ficaram claras para ele com a chegada da pandemia. “Eu tinha um escritório com diversos profissionais trabalhando de forma presencial. Em dado momento, disse a todos para irem às suas casas, pois era como mandava a ética naquele momento. Foi então que percebi que estar em um escritório com todos juntos era um gesto teatral, e que de fato poderíamos continuar nosso trabalho de casa. Ou seja, essa necessidade de um ambiente físico era um sinal de que eu era mais um nascido antes da internet. Isso me fez perceber que não precisava sequer morar em uma região x ou y, mas sim de qualquer lugar do planeta que tenha conexão”.

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Quando Karnal afirma que o futuro é uma realidade atual, ele faz referência a fatos que já presenciou que, até então, não passavam de histórias de ficção. “Há 2 anos fiz uma encomenda na Disney que chegou para mim de drone. Há 3 anos um carro autônomo em um campus de uma faculdade me levou para fazer um tour pelo lugar. Não estou falando de algo experimental, mas de um carro que já funciona assim. Portanto, esse futuro já chegou, e é importante saber que todas as funções mecânicas repetitivas serão substituídas por algoritmos, robôs”, alertou. Afinal (e seguindo a sua lógica), é infinitamente mais barato utilizar um software, uma vez que um ser humano pode se adoentar, por exemplo. “Quando eu era criança, havia muito mais bancários no Brasil, e hoje existem as soluções de software. As grandes lojas físicas já sofriam antes da Covid-19, pois os jovens já compravam pela internet. Ou seja, a pandemia de certa forma obrigou essas empresas a ‘ensinarem’ a tecnologia à terceira idade”.

Learnability – capacidade de continuar aprendendo

De acordo com Karnal, é difícil para as pessoas entenderem que a habilidade de continuar aprendendo é o que ditará a partir de agora. Portanto, aquilo que você aprendeu até aqui explica o seu sucesso até o momento. “A sua continuidade depende da capacidade de continuar aprendendo, hoje definido como learnability (habilidade de aprender, na tradução literal). Ninguém aprendeu, cursou ou estudou. Todos estamos estudando, cursando, aprendendo”. Além de todo esse empenho diário e contínuo, Karnal levantou a questão da transição do trabalho para o home office. Neste caso, pontuou que além de definir a estrutura física para poder trabalhar confortavelmente, é preciso fazer a manutenção da estabilidade psíquica. “Você não é estável, você está estável. E para assim se manter é preciso tomar cuidado com os excessos em casa, como álcool e alimentos. O espaço do lar não foi pensado para isso (trabalho), mas é preciso torná-lo o ambiente mais agradável e saudável para você”.

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Um dos “produtos” mais em ascensão hoje, segundo ele, é a meditação. E ela é recomendada não apenas por religiosos, mas por especialistas em saúde psíquica. “A recomendação é de 5 a 10 minutos de meditação diária por dia para você aprender a dominar o seu autocontrole”, disse. Karnal também brincou com a redução nas vendas de calças na pandemia, uma vez que uma videoconferência não exige o uso delas. “A maior parte das pessoas se veste só da cintura pra cima, ao alcance das câmeras. Enquanto a indústria de calças e sapatos sofre, o comércio de blazers e camisas segue em ascensão”. E, diante do atual cenário de pandemia, ele é enfático: “A pandemia vai continuar a existir, e após a variante Delta, o alfabeto grego tem muitas outras letras. Por isso, dependerá da nossa capacidade de continuar aprendendo e criando saídas para essa nova forma de existência”.

Atenção à reinvenção constante dos modelos de negócios

Muitas empresas conseguiram se destacar na pandemia, criando e-commerces sólidos e rentáveis. Porém, independente do sucesso, Karnal faz um alerta para esse excesso de confiança. “Um dia a Varig pensou isso, assim como a Kodak. Mas o mundo muda tecnologicamente o tempo todo. Por isso o e-commerce precisará encontrar, o tempo todo, formas de superar o distanciamento da relação digital”. Entre suas sugestões, o live commerce pode ser uma boa estratégia para humanizar a experiência do online. Para tanto, a afetividade deverá ser aumentada nesta transmissão digital — ou seja, o ator ou a autora precisarão aprender a como agir corretamente em frente das câmeras. E Karnal volta o seu discurso para o learnability. “Fiz todos os cursos que vocês possam imaginar, e em nenhum deles me foi ensinado a como passar pó na minha pele para uma gravação, tampouco a como regular a iluminação para uma live. E eu precisei aprender tudo isso com especialistas de 12 a 16 anos quando a pandemia chegou”, brincou, dizendo que o domínio da tecnologia é equivalente à quantidade de colágeno da pessoa.

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“Eu não tenho a habilidade digital de um adolescente, mas eu tenho uma capacidade de avaliar o olhar de um comprador que ele não tem. Eu olho para a pessoa e sei se está chato, desagradável, ou se continuo insistindo. Posso perceber micro sinais no rosto que os jovens raramente conseguem”. Entretanto, com o contexto pandêmico e o uso de máscara, ele assegura que será preciso ainda mais cuidado na análise corporal para entender o grau de satisfação ou não do consumidor. “Tudo mudou e de forma muito rápida. A velocidade das mudanças não é mais de uma geração para a outra. O mundo de hoje, de 2021, não é mais aquele que entrou na pandemia. E diante de tantas mudanças, eu não posso reclamar lembrando de como as coisas eram, mas sim sobre como eu posso mudá-las a meu favor. Ou seja, eu não devo aguardar que as pessoas me ofereçam cursos: eu preciso ir atrás deles”.

O futuro é dos protagonistas

Para Karnal, o futuro é de quem tem a consciência de que é o gestor de sua existência. “O protagonista é aquele que não delega, que não passa adiante aquilo que precisa fazer. Ele não culpa o país, o governo, ou a empresa para o que ele quer. Ele não reclama: no máximo aponta o que precisa ser feito de forma diferente e se inclui na solução da questão. Ao decidir que a vida precisa da ação de um protagonista, eu entendo que eu a transformo, vou e faço. Todo o problema que começa com ‘eu’, é seu. Quando o problema começar com a palavra ‘nós’, aí será diferente. Se eu estou atrasado, o problema é meu e eu que deveria ter acordado mais cedo, planejado melhor o meu dia”.

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Para tanto, o professor recomenda buscar produzir mais, se desafiar mais, sempre dentro do seu limite. “Cada pessoa pode fazer mais, gerir melhor sua vida, ser sócia-majoritária da sua existência. Do ponto de vista científico, as pessoas pouco ambiciosas tendem a ser mais felizes, pois esperam pouco da vida. Ou seja, a vida dá pouco e elas aceitam. Do ponto de vista da psicologia dos animais, o macho beta é menos estressado do que o macho alfa, que precisa lutar pelas fêmeas, pela comida… E que também morre cedo. O macho beta dura mais, mas é preciso se perguntar o que você quer para si. Qual a sua expectativa sobre sua renda, seu corpo, seu conhecimento? Qual a sua projeção de futuro? E, a partir, dessas perguntas, ir atrás de seus objetivos”.

Uma de suas citações na apresentação foi que há alguns anos a globalização fazia crer que haveria uma padronização de produtos. “O maior símbolo disso foi a tomada de 3 pinos”, brincou, acrescentando que qualquer negócio, de agora em diante, deverá ter participação digital. “Ainda há taxistas que não atendem por aplicativos, mas essas pessoas que os chamam apenas por telefone tendem a desaparecer. Há 30 anos, se eu vendesse bala em um micro ponto de comércio, precisaria somente comprar, ser simpático e ter troco. Hoje eu preciso saber de política, de exportação da China. Afinal, aquele papel da bala tem chance enorme de vir de lá. Eu até posso atacar minhas vendas de forma regional, mas por via de regra o ideal é ter poder de oferecer para qualquer local”, recomendou.

Posicionamento dos negócios

Sobre o famigerado posicionamento das pessoas e empresas sobre assuntos sensíveis, Karnal é enfático: “É impossível num Brasil como o nosso não haver um discurso contrário ao racismo, com maioria da população afrodescendente e toda a barbárie ocorrida pela escravidão. Também é preciso ser contra o trabalho infantil, ser a favor de uma escola pública de qualidade, ser contra a violência com as mulheres, a favor da ecologia”. Sobre opiniões controversas, entretanto, ele deixa o alerta: “Muito cuidado com opiniões partidárias, controversas. Para vender chocolates você precisa falar sobre aborto? Se não precisa, guarde a sua opinião para o seu círculo de convívio. Mas, se você tem um hospital científico sobre isso, então terá que emitir uma opinião técnica sobre o assunto”.

Discutir certos temas, porém, pode trazer muito valor ao negócio: “O preconceito, por exemplo, esvazia o mercado, uma marca, e obriga o departamento de imagem a dar respostas constantes. Pessoas que ‘casam’ ou apostam em políticos ou propostas de governos têm uma tendência de ficar viúvas muito precocemente”. Como inspiração, Karnal citou o vendedor de rua: “ele vai falar sem parar, sem dizer em quem ele vota, sua convicção religiosa ou o seu time. Vivemos em um ambiente polarizado, e apostar suas fichas numa estratégia dessas muito provavelmente não será uma boa ideia. Salvo, claro, se você for dono de um bar na Pompéia que representa o time do Palmeiras. Sua fé pode ser fundamental pra você, mas o seu negócio não é uma igreja”.

O ensino no país

Sobre o ensino, Karnal afirma que tudo indica que a escola, assim como os negócios, foi transformada com a pandemia. “Durante 10 anos filósofos discutiram a possibilidade do estudo no formato EAD. Então veio a pandemia e acelerou os processos. Onde a escola fez falta na pandemia? Não vejo um pai de aluno chegando à escola para reclamar do que o filho deixou de aprender por conta da pandemia. A reclamação uníssona foi a de que eles, os pais, não aguentavam mais os filhos em casa. Ou seja, a escola fez falta como creche, e não como fonte de conhecimento. É como se fechasse o hospital e eu dissesse: ‘que pena, o pão de queijo de lá era maravilhoso’”.

Outro ponto levantado por Karnal foi que, por conta da tecnologia de equipamentos como o celular, a escola precisará dar um salto, uma vez que ela se tornou ainda mais obsoleta. Por outro lado, diz que existe um campo onde a escola é única: “ela submete os alunos à diversidade, à experiência social, e os obriga ao aprendizado da negociação, o que ainda não se faz numa sala de bate-papo virtual. Ainda assim, a escola de formalização de atitudes e não de desenvolvimento e desafios, aquela repleta de formalidades, está ultrapassada e, se não der uma resposta logo se tornará inútil. Para ser sincero, eu já não sei mais se a próxima geração precisará cursar de fato uma universidade”, encerrou.

Por Giuliano Gonçalves, da Redação do E-Commerce Brasil.