Toda semana, recebo mensagens de pessoas que se interessaram pela possibilidade de ter uma loja online própria. Não são de pessoas que conheço, são de pessoas que, de alguma forma, conseguiram o meu contato seja através da nossa loja online ou através de pessoas que conhecemos em comum. Não porque eu seja um grande conhecedor do assunto (quem me dera!), mas porque a nossa loja virtual feminina está no ar desde 2013 – estamos completando quase 3 anos.
A maior parte das pessoas que me procura quer saber informações acerca da realidade do negócio online, dia-a-dia da operação e, principalmente, a rentabilidade advinda de um e-commerce. Quanto os proprietários de lojas virtuais ganham? Dá para viver de e-commerce?
Quando pergunto a eles, porque gostariam de ouvir a minha opinião, são categóricos: uma coisa é você ouvir da boca de quem está ali tocando o negócio intensamente, outra de um consultor que, hipoteticamente, enxerga o mundo ideal extraído do plano de negócios. A tal “oportunidade”.
Polêmicas à parte, nesse texto, vou citar alguns pontos que você deve avaliar antes de pôr a mão na massa. O primeiro ponto é: o seu negócio é estritamente um e-commerce? Ou seja, você irá montar uma loja virtual apenas para revender produtos ou o e-commerce será um dos canais de vendas do seu negócio? Explico. Uma coisa é se o seu negócio sigue a linha da Mony Mony, uma marca de camisetas femininas que usa o e-commerce para realizar as vendas dos produtos acabados (t-shirts).
Outra coisa é você montar uma loja multimarcas online como a Dafiti, Bebê Store, Bitcão e por aí vai. É que no nosso caso, devemos nos preocupar com a produção de um produto e no caso das outras não, simplesmente compram e revendem – apesar da Dafiti ter começado a fabricar produtos de marca própria recentemente.
Esse ponto deve estar bem definido para que você preveja, ao menos em parte, a operação do seu negócio. Com o que terei que me preocupar exatamente? Como aconselhar fabricação de produtos e/ou aquisição de produtos com canal de vendas?
Há uma crença de que se o negócio for extremamente “nichado”, a concorrência não lhe dará trabalho e você sairá na frente. Mas lhe alerto, cuidado com esse tipo de raciocínio. Existem casos de negócios que talvez pelo “timing errado” ou por uma pitada de diferenciação a mais, naufragaram. Não precisamos lembrar o que disse um dos dirigentes da C&A a respeito de quando eles resolveram reabrir o e-commerce após anos fracassando no Brasil – um dos pioneiros.
Veja nesse link o depoimento de uma ex-lojista que confessou com detalhes porque o negócio online dela não deu certo.
Acredito que o maior gasto de todo e qualquer e-commerce é trazer as pessoas (principalmente as certas) para a loja online. É caro. Outro dia ouvi de um palestrante que como o preço do tomate foi multiplicado por centenas ao longo de poucos anos, trazer leads qualificados não seria tão caro assim.
Mas é caro, principalmente tendo em vista o número de vendas que você deve manter todos os meses para atingir o ponto de equilíbrio (financeiro e operacional) dada a taxa de conversão que não é lá grandes coisas – falasse que 1% das pessoas que acessam a sua loja online convertem (compram algo). O ideal para muitas lojas (e outros tipos de negócios) é buscar o ciclo financeiro negativo.
Se você pensa em adotar um negócio do tipo da Mony Mony, você deve ficar ligado na margem (mark up) de cada produto. Quanto você ganha deduzidos todos os valores que devem ser direcionados aos gastos com a fabricação e venda daquele produto?
Além disso, você deve se preocupar com o ciclo operacional da empresa e, como eu disse acima, com o ciclo financeiro. Veja a figura a seguir:
O esquema acima é apenas para fins de esclarecimento, há outras representações mais profissionais sobre o tema. O período compreendido desde a aquisição de insumos (matéria prima necessária para fabricação dos seus produtos – representado pelo ‘dia 0’) até o dia em que você efetivamente recebe o dinheiro das vendas (seja por Pagseguro, PayPal, Bcash e operadoras de cartão de crédito – representado pelo ‘dia W’) é chamado ciclo operacional.
No ciclo operacional acima, estamos considerando uma empresa que fabrica produtos (como sabonetes para clientes com alergia) e realiza as suas vendas através do e-commerce. Repare que o suposto dia do pagamento de fornecedores chamado ‘dia Y’ (considerando que lhe darão um prazo para pagar pelos insumos, após a sua aquisição) ocorre antes mesmo do dia que marca o início das vendas dos produtos acabados (sabonetes especiais).
Como bem sabemos, muitas vendas online ensejam vendas a prazo. Isso significa que o cliente, ao optar por pagamento via cartão de crédito (o mais provável nesse segmento), ganha tempo para efetivamente desembolsar o valor que vai para você, isso porque o dinheiro irá ser repassado aos gateways de pagamento (Pagseguro, Moip, Cielo e outros mais) os quais irão demorar um tempo para lhe repassar essa quantia.
A não ser no caso de vendas por transferência bancária – em que o cliente transfere diretamente para a sua conta (é muito raro ocorrer isso). O ciclo financeiro, por sua vez, é o período compreendido desde o momento em que você efetua o pagamento de fornecedores (dia Y) até o dia em que você receberá dos gateways (dia w).
Analisando a imagem acima você tem a impressão que nada é muito complexo, uma vez que bastaria a você aguardar do dia X ao dia W o recebimento dos valores advindos das vendas. O problema todo é que nesse mesmo período a sua empresa possui contas a honrar, ou seja, gastos com os quais você deve arcar. Alguns exemplos bem básicos:
• Estocagem de produtos;
• Marketing para atrair visitantes à loja online;
• Contrato com Correios ou qualquer outro tipo de parceria;
• Folha de pagamento;
• Hospedagem da loja online;
• Contrato de sistemas anti hackers, anti malware, segurança de modo geral;
• Aluguel de escritório;
• Energia elétrica;
Poderia citar inúmeros compromissos financeiros, mas vamos dar continuidade à nossa análise. Como dito, você possui gastos independentemente de quanto há na conta bancária do seu e-commerce e, o pior, você deve aguardar o recebimento dos valores das vendas – que foram feitas a prazo. Por isso a importância de sempre avaliar o custo de capital de giro líquido do negócio.
É que você emprega dinheiro do caixa para cobrir os custos e despesas da empresa antes mesmo de receber as rendas das vendas e não pode trocar os pés pelas mãos permitindo que a necessidade de capital de giro fique acima do capital de giro propriamente dito e nem mesmo abaixo. O ideal é que permaneçam em sintonia.
Se a necessidade de capital de giro ficar acima do capital de giro disponível, temos um problema – arranjar novo dinheiro para fazer frente aos gastos, financiar isso por meio de bancos, nunca foi e nunca será barato.
Quem quer ir no banco pegar mais emprestado? Se você está com excesso de capital de giro (acima da necessidade) pode ser que esteja assumindo uma estratégia do ponto de vista do retorno nada saudável, já que isso pode levar à gastos indevidos (oba, estou com dinheiro no caixa!) em virtude da menor demanda por recursos que se tem disponível.
Além disso, você possivelmente estará com despesas financeiras (pagamentos de empréstimos) relevantes. Claro! Uma vez que o dinheiro de capital de giro é muitas vezes originado de empréstimos.
Você passa a se perguntar coisas como: será que não estou pegando mais do que o necessário? Será que o que estou pagando de juros para o banco realmente está abaixo do que estou lucrando por empregar esse dinheiro que não é meu? Se não é gerado valor ao acionista (ou quotista), está ocorrendo a destruição.
O chamado ciclo financeiro negativo ocorre quando você consegue, junto aos fornecedores de matéria prima, estabelecer um acordo no qual fica definido que você irá pagá-los tão somente o dinheiro proveniente das vendas do seu e-commerce esteja disponível.
Se você não conseguir fazer isso (muito provável), é interessante tentar reduzir ao máximo o tempo que decorre do dia em que se paga fornecedores e o dia em que os recursos de vendas estão finalmente disponíveis na sua conta bancária.
A ideia é sempre alavancar o negócio operacional e financeiramente, mas isso é assunto para outro texto.
O que se sabe, ao menos em termos de Brasil, é que a realidade da maioria das lojas virtuais vai no sentido de pestanejar para atingir o ponto de equilíbrio (ou break even na língua inglesa), do contrário o caminho para a falência será inevitável dados os gastos elevados que se tem para manter uma loja virtual.
Espero que essas palavras lhe tenham ajudado de alguma forma. Nos próximos textos continuarei a falar sobre aspectos importantes para quem quer abrir uma loja online. Até lá.