Durante décadas, o mercado de bem-estar e higiene pessoal concentrou seus esforços quase exclusivamente no público feminino. A evolução foi evidente: diversidade de produtos, novas tecnologias, linguagens sofisticadas e uma cultura de autocuidado amplamente incentivada. Do lado masculino, no entanto, o cenário permaneceu estagnado por muito tempo, reduzido ao básico e refém de um imaginário coletivo que associa vaidade à fragilidade.

Mas há sinais claros de que essa lógica começa a mudar. O Brasil é hoje o segundo maior mercado mundial de cuidados pessoais masculinos, atrás apenas dos Estados Unidos. E essa posição de destaque não é apenas quantitativa. Em termos de comportamento, os homens brasileiros têm demonstrado interesse crescente por rotinas de cuidado, incluindo práticas antes vistas como tabu.
O aumento da demanda por cuidados íntimos
De acordo com o estudo Cosmentology®, do Grupo Croma, 72% dos homens brasileiros já incorporaram algum tipo de cuidado pessoal à rotina – um salto significativo em relação aos 34% registrados em 2018. No recorte específico do cuidado íntimo, a demanda é ainda mais reveladora: uma parcela expressiva dos homens já se depila ou apara os pelos da região íntima, o que demonstra uma abertura real para discutir e adotar soluções mais adequadas.
Apesar disso, ainda existe uma lacuna evidente entre esse novo comportamento e a oferta de produtos e serviços. Em muitos casos, os homens seguem adaptando itens genéricos – como barbeadores ou desodorantes convencionais – para necessidades que exigem especificidade, segurança e respaldo técnico. A ausência de uma categoria madura voltada para o cuidado íntimo masculino é, ao mesmo tempo, reflexo e consequência de uma cultura que pouco se dispôs a tratar esse tema com seriedade.
A especificidade como oportunidade de mercado
Enfrentar esse vácuo de mercado exige mais do que inovação em produto. Exige escuta ativa e sensibilidade para reconhecer o desconforto, a desinformação e o silêncio que cercam o tema. É justamente na escuta – muitas vezes silenciosa – que surgem as oportunidades reais: produtos pensados para a anatomia masculina, soluções com formulações adequadas, comunicação sem infantilização ou humor forçado. A palavra que define esse novo momento é especificidade.
Esse novo consumidor masculino é mais atento, mais exigente e menos disposto a aceitar o mínimo. Ele valoriza ciência, transparência e tecnologia. E vê no autocuidado uma prática de liberdade e autoestima, não um sinal de vaidade ou fragilidade.
As transformações culturais em curso também mostram um ambiente propício à ruptura de paradigmas. O que antes era motivo de piada ou desconforto hoje começa a ser incorporado com naturalidade por uma geração que já não carrega os mesmos estigmas das anteriores. A masculinidade contemporânea, mais plural e aberta, pede soluções que acompanhem esse novo tempo.
Ainda há desafios consideráveis. O preconceito cultural, a ausência de políticas públicas de educação para o cuidado masculino e a timidez de grandes empresas em apostar nesse nicho revelam que essa revolução ainda é, de fato, silenciosa. Mas ela está acontecendo – produto por produto, conversa por conversa.
E como toda mudança cultural de fundo, ela não se dá em saltos, mas em avanços constantes. O futuro do bem-estar masculino será construído com informação, escuta e inovação – e terá como marca central o respeito às singularidades do corpo e da experiência de ser homem em um mundo em transformação.