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Tecnologia e customização extremas: varejo brasileiro precisa olhar para a China para alcançar um novo nível de sucesso

Por: Fernando Gibotti

Fundador e CEO de CRM e Ciência de Consumo da Rock Encantech

Com mais de 25 anos de experiência, Gibotti liderou a implantação da filosofia da Ciência do Consumo e plataformas de CRM em grandes redes varejistas como Atacadista, Supermercados BH, Pernambucanas, Bob's, entre outras. Também participou de projetos de tecnologia em empresas como JBS, Caixa Econômica Federal e Bradesco, além de projetos em dezenas de prefeituras brasileiras com sistemas de informações geográficas. Gibotti é doutor em Computação Aplicada e PhD pelo INPE, com pós-graduação em Tecnologias de Informação Geográfica pela Universitat Jaume e autor do livro "O CRM no contexto da Ciência do Consumo", que propõe uma análise profunda do comportamento do consumidor.

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Todos os mercados brasileiros, sem exceção, olham para o que está acontecendo fora do país para avançar e incorporar tendências inovadoras. E, no caso do varejo especificamente, a China é a referência máxima para isso.

Embarcamos em uma jornada de aprendizado no território asiático em busca de novas perspectivas. O que vimos foi o berço de uma verdadeira revolução no setor, testemunhando em primeira mão o quão avançado e transformador é o modelo chinês.

Mulher asiática sorrindo segurando laptop e cartão de crédito.
Imagem: Envato.

São trilhões de yuanes movimentados anualmente, que transformam a China em um laboratório global de inovação para supermercados e varejistas. O país conseguiu redefinir a experiência do consumidor e a eficiência operacional, visando atender a um cliente cada vez mais digital e exigente.

É um exemplo de direcionamento de mercado para o mundo inteiro, mas principalmente para o Brasil. O varejo brasileiro se encontra em um momento muito desafiador por conta de uma série de fatores, que vão desde a desvalorização do Real até a queda no poder de compra das famílias, e, por isso mesmo, precisa olhar com atenção para a nação asiática.

Inteligência de dados

Há uma gama de exemplos de inovações ligadas ao varejo no território chinês. Uma das mais importantes e que merece um grande destaque é a forma de tratar os dados. Os chineses sabem como monetizá-los com eficiência, partindo do princípio de que essas informações são vias para oferecer experiências ricas e individualizadas aos consumidores.

Podemos observar isso principalmente com a personalização com IA e big data, em que as empresas usam algoritmos e analisam comportamentos para recomendar produtos e prever demandas. É o caso da Tmall, que utiliza a ferramenta para criar soluções customizadas com base em tendências.

Especificamente no e-commerce, também é possível citar as vendas em live streaming, como aquelas realizadas via Douyin/TikTok, com influenciadores em tempo real e tecnologia robusta trazendo análises instantâneas de performance. Além disso, essa estrutura permite determinar qual perfil de criador de conteúdo tem mais aderência e poder de venda para cada produto.

Lojas inovadoras

Os formatos de lojas inovadores também estão entre os sucessos do varejo chinês. A integração entre o online e o offline é uma grande prova disso, em que modelos como o “New Retail”, da Alibaba, combina lojas físicas com plataformas digitais, usando dados para personalizar experiências; há supermercados do grupo em que clientes compram via app, pagam com QR code e recebem entregas rápidas.

Entregas essas que também merecem destaque no país: há desde redes que usam drones, veículos autônomos (JD.com) e armazéns robotizados para as operações, até restaurantes que entregam dentro de vagões de trem.

No sentido de inovar a experiência do consumidor, ainda vale mencionar exemplos de lojas da Xiaomi e Huawey, que oferecem interação física com produtos high-tech. Nesses ambientes, é possível comprar um automóvel premium, celulares, eletroeletrônicos diversos ou apenas uma caixinha de bolso de ferramentas.

Novas formas de pagamento

Outro mérito no varejo chinês é a reformulação da jornada de pagamento. Essa experiência se tornou muito mais intuitiva e simplificada com superapps multifuncionais, como as plataformas da WeChat e Alipay.

Nessas ferramentas, compras, transações, redes sociais, serviços financeiros e entretenimento são integrados em um só lugar. Além disso, os aplicativos funcionam como as “bandeiras de cartão de crédito” e debitam o saldo direto da conta corrente dos bancos; nesse ponto, há um potencial de crescimento de receita enorme relacionado à taxa de intermediação, já que não existe cobrança dos vendedores.

Estratégias de fidelização disruptivas

No que diz respeito ao desenvolvimento de estratégias de fidelização, o varejo chinês vai muito além dos programas tradicionais. É claro que os clássicos sistemas de cadastro também existem, mas, de forma geral, há um olhar mais atento para os formatos que retêm os clientes com qualidade.

Um exemplo disso é o clube pago do Ding Dong, um supermercado 100% digital que possui mais de mil dark stores. Os membros têm direito a seis fretes grátis por mês, descontos e produtos exclusivos que só associados podem comprar.

O Pinduoduo também entra nessa lista. Esse aplicativo de e-commerce é focado nas cidades menores e áreas rurais, garantindo não só descontos agressivos para captura de novos clientes e membros, mas também promoções coletivas, modalidade em que o produto é colocado na vitrine e os clientes compartilham a oferta com os contatos do WeChat ou do próprio Pinduoduo. Quanto mais pessoas comprarem, menor é o preço.

Outro bom exemplo de estratégia de fidelização são os clubes gratuitos, em que é preciso apenas se cadastrar para acessar preços e benefícios diferenciados, como é o caso do supermercado premium Guo Shu Hao, onde todos os produtos nas gôndolas possuem dois preços – o convencional e o especial para membros do clube, com descontos que podem chegar a 40%.

Lições aprendidas

Olhando para todos esses exemplos, é certo assumir que o modelo chinês prioriza três pilares: velocidade, conveniência e hiperconexão. Na prática, esses pontos estão transformando o varejo em um ecossistema digital integrado entre si e com as pessoas, com forte influência cultural e tecnológica.

Se o Brasil se inspirar nesses movimentos, pode tranquilamente modernizar seu próprio setor, aprimorar a experiência do consumidor e otimizar as operações. Essa é a chance de nos tornarmos mais competitivos em um mercado cada vez mais digitalizado e globalizado.