Já faz um tempo que debates relacionados à diversidade e inclusão ganham forma no mercado de tecnologia, sobretudo com o apelo voltado para a valorização das pessoas, respeitando quem elas são. No entanto, candidatos dessa área, por vezes, se veem diante de uma contradição: ao mesmo tempo em que muitas vagas estão disponíveis, boa parte exige qualificação técnica quase sempre inacessível aos profissionais que pertencem a grupos sociais sub-representados.
Em razão do contexto histórico na área de Tecnologia da Informação (TI), a discriminação começa no acesso à oportunidade de estudo e entrada nos cursos de graduação, em que a maior parte das turmas tem pouco ou nenhum universitário pertencente a grupos minoritários. O problema se torna mais evidente quando as empresas exigem uma qualificação técnica que muitas pessoas de grupos sub-representados não têm, valorizando mais a qualificação técnica – que poderia ser aprendida – do que habilidades comportamentais como proatividade, trabalho em equipe, maturidade psicoemocional, entre outras.
Escassez de mão de obra x falta de oportunidades
Por todo esse descompasso, em que a escassez de mão de obra especializada esbarra na falta de oportunidades de emprego para grupos mais diversos, cabe às empresas contratantes a criação de políticas internas consistentes, não só para reduzir obstáculos no ingresso desses profissionais no mercado de tecnologia, mas, também, para fomentar programas de aceleração e assegurar sua permanência nas posições já conquistadas.
De acordo com a pesquisa da Associação Brasileira das Empresas de Tecnologia da Informação e Comunicação (Brasscom), o mercado precisará até o ano de 2025 de 797 mil profissionais. Porém, a mesma pesquisa revela um déficit no número de recém-formados na comparação com a quantidade de posições disponíveis no mercado de tecnologia. Anualmente, o ensino técnico brasileiro forma somente 53 mil pessoas, enquanto que a demanda média é de 159 mil profissionais de TI no país. Segundo a Brasscom, do ponto de vista de diversidade, ainda há um longo caminho pela frente, já que 85,2% do total de alunos da área são homens; mulheres correspondem a apenas 14,8% de profissionais dessa área.
Construção de uma cultura organizacional sólida
Embora desafiador, esses dados revelam que as organizações precisam construir uma cultura organizacional sólida com iniciativas voltadas para os temas de diversidade e inclusão, contribuindo também para despertar o interesse nos jovens pela formação em tecnologia. Nesse ponto, chamo atenção para retornamos à necessidade de entender o tema como problema estrutural e abordar a diversidade e inclusão para além do discurso. Afinal, mais do que um dever social, promover uma cultura diversa enriquece debates e torna as tomadas de decisões cada vez mais assertivas, trazendo, claro, retorno para a empresa, especialmente porque eleva o capital humano, contribuindo com soluções inovadoras.
Não à toa, de acordo com um estudo sobre o impacto da diversidade no mercado de trabalho, do ID_BR (Instituto Identidades do Brasil), para cada 10% de aumento na diversidade étnico-racial nas empresas, soma-se uma alta de 4% na produtividade dos colaboradores. O levantamento ainda revela que para cada 10% de alta na taxa diversidade de gênero, há um acréscimo de quase 5% na produtividade das empresas. Mais do que a garantia de lucro, incluir populações que sofrem com a exclusão, seja por conta de sua raça, orientação sexual, gênero ou nacionalidade, significa corrigir uma injustiça social que ainda persiste no país.
Políticas de inclusão consistentes
A solução para essa equação, novamente, se sustenta na implementação de políticas de inclusão consistentes nas empresas de tecnologia. E isso começa na contratação e retenção de grupos minorizados, que, muitas vezes, até compõem o quadro de colaboradores nas empresas, mas ficam restritos a áreas muito especificas. Nessa direção, é importante observar se a cultura interna valoriza a diversidade ou se tende a buscar sempre o mesmo tipo de perfil profissional. Além de promover programas de formação e aceleração, internos ou externos, é importante avaliar o nível de inclusão por meio de uma pesquisa de clima organizacional, com foco em melhorias para implementar medidas para um ambiente mais diverso, de respeito e inclusão.
É importante olhar para o todo e considerar que vivemos em uma sociedade multicultural. As empresas que entendem as diferentes interseccionalidades e incorporam esse conceito se diferenciam no mercado. Mesmo que os dados evidenciem a força de equipes mais diversas e que acolhem e incluem as pessoas, com certeza ainda temos um longo caminho pela frente, especialmente no mercado de tecnologia.