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Indústria 4.0 e a transformação digital do canal de venda B2B

Por: Mauricio Di Bonifacio

Co-Founder e COO da Fastchannel, uma das principais empresas de plataformas de e-commerce B2B, já atuou em mais de 300 projetos de e-commerce B2B e B2C para grandes e médias empresas. Especialista em e-commerce B2B, tem 20 anos de experiência com e-commerce e digitalização de vendas, sendo os últimos 10 focados no B2B, trabalhando com indústrias, importadores e distribuidores.

A indústria está procurando formas de se reinventar, de ser mais produtiva, competitiva e eficiente. O termo Indústria 4.0 significa muita coisa para muita gente. Desde um processo cooperativo de desenvolvimento de novos produtos, robotização do chão de fábrica até uso de tecnologias como IA, IOT, machine learning etc.

Nesta jornada, se a indústria quer inovar e produzir de formas inovadoras, ela também deve repensar suas estruturas de marketing e vendas. Não adianta ter robôs na fábrica e pedir um fax com o pedido para seu cliente.

A transformação digital deve, e precisa, ser feita em todos os pontos onde ela efetivamente gerar vantagens competitivas. E, do outro lado, o cliente também está mudando, gerações novas estão assumindo e estão demandando novos modelos de relacionamento, consumo de informações e processos de compra.

Digitalizar canais de venda ainda é um assunto novo, e tabu, em várias indústrias. Muitas promessas, muitos medos e principalmente muitas dúvidas.

Mas o que significa digitalizar o canal de venda da indústria?

Basicamente é permitir aos clientes comprarem do jeito de que eles quiserem na hora que eles quiserem e da forma que eles quiserem. Como todo “hype”, as duas perguntas que mais ouço são:

  • Eu tenho clientes que nunca irão comprar sozinhos num site sem a figura do vendedor
  • Meu time comercial e meu canal de venda acham que se eu montar um site de vendas, vou competir com eles e vou demitir ou troca todo mundo.

Voltamos então as frases acima. Cliente quer comprar COMO quiser, na HORA que quiser e da FORMA que quiser. Se o cliente só compra com um vendedor indo até ele e manda o pedido via fax e não quer mudar, não tem o menor problema. 100% dos clientes são digitalizáveis? NÃO! 100% da venda vai virar digital? NÃO!

As pessoas tem que entender que disponibilizar um canal de venda digital é apenas mais uma forma de se relacionar com o cliente, de oferecer aos que quiserem, uma nova experiência de compra. Simples assim! Não tem mágica, não tem milagre.

Porque digitalizar a venda B2B?

Em linhas gerais, iniciativas de inovação que têm a ver com indústria 4.0 e transformação digital sempre visam um ou mais resultados como:

  • Diferencial Competitivo
  • Redução de Custos e Eficiência
  • Aumento de Venda e/ou Margem

E quando falamos em digitalizar a venda B2B, podemos citar alguns objetivos mais específicos de iniciativas que envolvem e-commerce B2B:

  • Potencializa o time comercial: ampliação de venda fazendo o atual time comercial ser mais produtivo
  • Expansão geográfica: capacidade de atingir 100% dos clientes potenciais em um país continental, como o Brasil
  • Venda para clientes cauda longa ou com baixo retorno com vendedores presenciais: capacidade de atingir 100% dos clientes potenciais num país continental, como o Brasil
  • Reposição de estoque sem necessidade do vendedor fisicamente presente: permite que clientes reponham seus estoques e comprem a qualquer momento, de qualquer lugar
  • Padronização digital de captação de pedidos: elimina recebimento de pedidos por email, app de mensagens, telefone, etc, sem padrão e sujeitos a erros
  • Acesso a mix de produtos e preços: clientes tem acesso online ao seu mix de produto e informações de preços e posição de estoque
  • Acompanhamento de pedidos: permite ao cliente acompanhar seu pedido e acesso a todo seu histórico de compras
  • Vendas em campo: vendedores remotos podem colocar pedidos e consultar dados de clientes e suas compras

Modelos de digitalização

Existem diversos modelos de digitalizar a venda, dos mais simples aos mais inovadores. Nem todos funcionam para todas as empresas. O importante é sempre entender qual a estratégia da empresa e quais objetivos ela quer alcançar antes de iniciar um processo de digitalização da venda.

Vejamos a seguir alguns modelos:

Catálogo de produtos digitais como suporte a venda

Este é o primeiro passo, é a infância da digitalização. Basicamente é oferecer a maior quantidade de informações possíveis sobre seus produtos digitalmente para que seus clientes consigam encontrar você e conhecer mais o que você faz.

Vários estudos mostram que compradores procuram e entendem os produtos antes de fazer o primeiro contato com o fornecedor. Portanto, se você não tem nem isso bem resolvido, tenho só uma dica: Corra!

Venda B2C digital

Para indústrias que fazem produtos acabados, de consumo direto pelo cliente final, a primeira opção que a aparece é vender diretamente a estes clientes. Fabricantes de roupas, calçados e eletrônicos, por exemplo, podem fazer isso.

É bem diferente de uma indústria de tecidos ou de circuitos integrados, que estão no meio da cadeia, e fornecem suprimentos e equipamentos para que outras indústrias produzam os produtos acabados. Estas não têm a opção de vender B2C.

Um dos grandes mitos é que a venda B2C é a estratégia perfeita. O comprador compra o produto diretamente da indústria que, além de conhecer melhor este cliente, captura toda ou boa parte da margem da venda para si, sem ter que compartilhar com o canal de distribuição e varejo.

Porém, normalmente se esquecem de um ou dois probleminhas que acompanham esta estratégia, como marketing digital, venda unitária, entregas fracionadas, logística reversa, pagamentos via cartão de crédito, problemas de fraude, time de atendimento e, quando aparecem problemas, ainda tem SAC, lei do consumidor, reclame aqui etc. Enfim, there’s no free lunch. Grandes margens trazem grandes responsabilidades, já dizia o homem-aranha (ou algo do tipo).

Em produtos de venda massiva, supondo que tudo isto tenha sido resolvido com maestria, e o conflito de canal, como fica? Em geral, o canal de distribuição não vai gostar muito desta estratégia. Mas se você estiver tendo um mega sucesso na venda B2C direta e puder prescindir totalmente do canal, mantendo suas metas inalteradas, convide o Papai Noel para a festa de resultados do final do ano e para aparecer com você na capa da Forbes.

Venda B2B digital

Este é o modelo de digitalização mais direto. Consiste em, aos poucos, ir transferindo a venda B2B offline, seja para distribuidores e atacadistas, seja para o varejo direto, para uma venda B2B online.

O primeiro passo é ter uma plataforma de e-commerce B2B que seja efetivamente funcional. Isso quer dizer que você vai precisar modelar seu negócio off em um mundo digital, tem que permitir que seus clientes possam comprar digitalmente com as mesmas regras, preços, pagamentos, descontos…,que teriam se comprassem com um vendedor.

E aqui iniciam seus problemas: a maioria das empresas (e dos fornecedores de soluções e plataformas B2B) acham que a palavra e-commerce serve para qualquer cenário. Então, pegam uma solução feita para B2C e colocam para rodar num modelo B2B. Pronto, vai dar errado.

Não é tão fácil como parece

Tabelas de preço, pagamentos faturados, limite de crédito, descontos por volume, precificação dinâmica e impostos são apenas alguns dos problemas que necessariamente precisam ser bem resolvidos para que a estratégia de digitalização dê resultados.

Além da tecnologia, é necessário um cuidado gigante com o time comercial. Como ficam suas comissões, quais KPIs eles terão que buscar, que metas vinculadas a digitalização eles irão perseguir etc. Se o time comercial não for bem envolvido no processo de digitalização, eles irão jogar contra.

Acho que já tive essa conversa com umas 128.345 empresas em 34.129 segmentos (se não errei na conta nem esqueci ninguém). E já tive dentro de casa um belo exemplo de fracasso em um cliente justamente por não ter isto bem endereçado. Só me pedir que eu conto a história.

E por fim, só faltou um mísero detalhe: combinar tudo com os russos, claro. Ou seja, o cliente. Este também deve ser bem pensado, comunicado, o que vai ter de vantagens, o que muda, o que é bom, o que é ruim, quais clientes irão se digitalizar e quais não irão.

Um belo termômetro é perguntar se ele usa internet banking ou vai na agência. Fuja dos que vão na agência, se nem banco, que tenta digitalizar ele faz dez anos, conseguiu, sua jornada vai ser bem mais longa. E quem vai na agência em geral adora jogar conversa fora…

Cadeias de venda digitalmente integradas

Este é um modelo de negócios que se tornou possível justamente com a digitalização. E é um modelo que eu particularmente acredito muito em cenários que a indústria é muito dependente do canal. Em vez de tentar dar um “bypass” no canal e atingir o varejo ou o cliente B2B direto, traga o canal para o negócio.

Fortaleça o canal, amplie as sinergias. Unidos venceremos, uma andorinha só não faz verão. Pode usar a frase bonita que mais gostar para colocar na parede com uma foto inspiradora, mas o fato é que funciona.

A indústria em geral não tem capilaridade, condições de análise de crédito, experiência em logística fracionada e relacionamento com o pequeno varejo ou empresa, que é justamente onde o distribuidor é forte. Porém, a indústria detém a marca, a capacidade de investimento em time e recursos e o foco e execução necessários para alavancar a venda.

Então porque não juntar tudo em um único ambiente digital integrado? Permita que o varejo ou o cliente B2B faça a compra no portal da indústria, porém, com o faturamento e entrega a cargo do distribuidor a indústria vende, cuida do marketing digital e ações de relacionamento, e o distribuidor recebe o pedido, fatura e faz a entrega de seu estoque. Todos felizes.

Este modelo também tem diversos obstáculos que precisam ser bem resolvidos. Para funcionar, o distribuidor precisa compartilhar seu estoque com a indústria, a indústria precisa negociar bem as margens de cada um, ou seja, confiança e visão de longo prazo são essenciais.

Se um já quiser matar o outro no offline, sinto informar que o mundo online não vem com bençãos divinas nem promessas de amor eterno embutidas. Faça um B2B DR (discussão da relação) antes de ir para o digital.

Marketplaces B2B

Outro modelo ainda engatinhando no Brasil são os marketplaces de venda B2B. Em diversos setores, o produto que uma indústria fabrica não tem relevância suficiente na cesta de compras do cliente para que ele decida se relacionar diretamente com o fabricante.  Normalmente são setores que o cliente têm um mix de produtos muito amplo e variado, como o varejo de alimentos.

Se você acha que o supermercado vai parar e fazer pedido apenas de sal do himalaia de um fabricante, é bom rever sua análise de relevância de mix dentro do cliente. Neste caso, o varejista quer um lugar centralizado que ele possa fazer a reposição de vários itens e resolver sua compra com mais eficiência. Os principais produtos ele até topa comprar diretamente de cada fabricante.

Nestes modelos, estão começando a surgir operações que fazem isso, marketplaces B2B, sejam lideradas por distribuidores, sejam startups que estão se aventurando e criando novos modelos de abastecimento.

Vender direto B2C, direto B2B, integrar cadeia ou participar de marketplaces?

A resposta mais simples e honesta é um belo “depende”. Depende da estratégia da empresa, da concorrência, do cliente, do tipo de produto e da maturidade de todo mundo envolvido.

Basicamente não existe resposta certa, o importante é iniciar o quanto antes e testar vários modelos e ir aprendendo. Crie parceiras, converse com outras empresas e, mais importante, vá para a rua ouvir o cliente. No final do dia é ele que manda na po##a toda.

Tecnologia de e-commerce B2B

Modelos de negócio é só uma parte do problema. O outro lado da equação é a tecnologia. Afinal, se estamos falando em digitalizar processos e canais de venda, tudo isto tem que rodar em cima de plataformas de venda digitais, ou plataformas de e-commerce B2B.

Como já falei antes, a escolha de uma plataforma de e-commerce B2B é fator chave no sucesso da operação. Não adianta ter a melhor estratégia, os melhores processos, clientes digitalizáveis, se você não conseguir operacionalizar tudo isso no mundo digital. Não vai funcionar, simples assim!

Modelos de negócio B2B são muito mais complexos que modelos B2C. As necessidades são outras. Se login por Facebook aumenta a conversão B2C, a tabela de preço certo para cada cliente aumenta a conversão no B2B. Cupom de desconto funciona em B2C, mas descontos por volume e recorrência de compra funcionam mais no B2B.

A parte de experiência de compra é outro fator chave. No B2B é comum pedidos com 100 ou 200 itens, que o mesmo cliente compra semanalmente ou mensalmente. Com isso, todo o projeto de UX deve ser feito pensando neste cliente B2B. Neste ponto, apenas copiar uma UX B2C, sem uma análise crítica de como o cliente compra no B2B, simplesmente não vai funcionar.

E é neste ponto que muitas iniciativas naufragam. Na fase de implementação da solução, escolhas mal feitas, parceiros errados, projetos mal desenhados e soluções não aderentes, tudo isso já vi acontecer. Ou seja, não tem segredo. Tem que ter a estratégia certa, a execução comercial certa e a tecnologia certa.


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