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Fórum ECBR 2023: Masterclass explora jornada do lojista até o Unified Commerce

Por: Júlia Rondinelli

Editora-chefe da redação do E-Commerce Brasil

Jornalista formada pela Faculdade Cásper Líbero e especialização em arte, literatura e filosofia pela PUC-RS. Atua no mercado de e-commerce desde 2018 com produção técnica de conteúdo e fomento à educação profissional do setor. Além do portal, é editora-chefe da revista E-Commerce Brasil.

Você já ouviu falar em unified commerce? Ou, em bom e velho português: comércio unificado? Bom, tendo ouvido falar ou não, este é o futuro do e-commerce, segundo os apresentadores e palestrantes do palco Gestão e Operação do Fórum E-Commerce Brasil 2023.

Angelo Vicente e Leonardo Naressi na Plenária de Gestão e Operação no primeiro dia do Fórum E-Commerce Brasil 2023 – Foto Ruan Carlos

O primeiro dia do evento foi marcado por masterclasses com os principais temas das palestras dos demais dias. Responsáveis por apresentar esta aula, Leonardo Naressi, Co-CEO & CIO do DP6, e Angelo Vicente, co-fundador da Esecom, ambos parte do conselho de conteúdo do E-Commerce Brasil, falaram sobre os caminhos inovadores para alcançar este comércio unificado e também como a inteligência artificial fará parte deste processo.

Como parte da introdução e contextualização, Vicente explicou que para chegar no nível de especialidade para falar em unified commerce e IA, é preciso adquirir maturidade dentro do e-commerce. A ideia da masterclass, inclusive, foi explorar os caminhos que o e-commerce precisa percorrer até chegar a uma jornada unificada.

Dados e contexto

O Brasil hoje é a quinta maior economia digital do mundo. 182 milhões de brasileiros usam a internet hoje, de acordo com a Statista.

“Além disso, quando começamos a pensar em expansão latino-americana, o Brasil é o primeiro país do segmento, o que não é difícil imaginar pelas atividades econômicas, pelo agronegócio e pela extensão territorial”, argumentou o executivo.

Outro ponto que deve ser levado em consideração é que o Brasil costuma seguir as tendências tanto dos Estados Unidos quanto da China. Se por um lado o mercado norte-americano tem um grau de maturidade elevado que deve ser levado em consideração, o mercado chinês é movido por uma rápida movimentação e digitalização que também interessa o empreendedor brasileiro.

A previsão é que o Brasil chegue a um faturamento de 4 bilhões no e-commerce em 2023. Além disso, a expectativa é de que a participação do e-commerce mais do que dobre na economia brasileira até 2027.

Vicente argumentou ainda que os três principais direcionadores do e-commerce hoje são: procura, avaliação e sortimento. Em seguida destacam-se reversa, estorno e conciliação, bem como a procura por entregas no mesmo dia. Ele completou: “a tendência da economia brasileira é ir cada vez mais em direção ao online com a democratização da internet e expansão do 5G”.

Angelo Vicente na Plenária de Gestão e Operação no primeiro dia do Fórum E-Commerce Brasil 2023 – Foto Ruan Carlos

Agronegócio: a tendência dos próximos anos no digital

Uma das apostas para o próximo ano, inclusive, é o agronegócio, que já pesquisa e compra online, porém ainda enfrenta desafios da digitalização. “O que falta na cadeia do agro é destravar a cooperativa, que hoje oferece as condições de pagamento ao agricultor”, argumentou o executivo.

WhatsApp: não dá mais para vender online sem ele

Além disso, o Vicente falou sobre a unanimidade do WhatsApp como aplicativo mais usado pelos brasileiros quando o assunto é chat ou redes sociais. As ferramentas de chat, segundo ele, não estão ainda aptas a atender às demandas dos consumidores, com o grau de especialização que eles desejam. Dessa forma, o WhatsApp se destaca como uma alternativa mais eficiente, próxima e rápida.

“Hoje, adquirir clientes sem redes sociais não faz mais sentido. É a expansão do potencial de divulgar o seu negócio através do boca a boca no e-commerce”, ele pontuou.

Mas afinal, o que é ser omnichannel?

Vicente elencou os 6 pontos que hoje posicionam uma empresa como omnichannel, pois não se trata mais apenas de ter múltiplos canais e vender online com interação na loja física.

São eles:

1 – Comprar online e retirar na loja;
2 – Pick up points, ou o famoso: clique e retire;
3 – Curbside pick up: vagas específicas para retirada de produtos em estacionamentos de shopping, supermercados (ainda nos EUA);
4 – Prateleira infinita: integração da venda online ou offline de acordo com a disponibilidade;
5 – Reversa eficiente e integrada com qualquer ponto de contato; e
6 – Compra na loja física e devolução pelo digital (ao contrário do que geralmente se imagina).

Canais de atendimento: o que realmente faz sentido?

Chat, e-mail e telefone ainda são essenciais para o atendimento no Brasil, mesmo que outros canais devam ser explorados. Um dos pontos apontados por Vicente foi que é possível sim investir em novas formas de atendimento, tendo ciência de que estes três são básicos, mas funcionais e, como citado, ainda são preferidos por muitos consumidores.

Além disso, são eficientes para medir o grau de satisfação do consumidor, seu humor com relação às compras e ao atendimento, além de ser de fácil automação pela IA, bem como de ágil diagnóstico de problemas pelo time de atendimento.

Não importa o canal, o que importa é a jornada de compra

“O grande mistério que as empresas querem sempre desvendar: qual o canal que o cliente vai preferir para esta compra?”, disse Naressi. Em sua parte da apresentação, o executivo mostrou que o e-commerce, a loja física e até mesmo as redes sociais já são apontados como os principais canais de preferência dos consumidores para as compras, mas em diferentes estágios da jornada. O que eles buscam com esses canais: receber (ou retirar) seus produtos e, se for necessário, trocar ou devolver. Tudo isso com rapidez, comodidade e com a jornada mais fluida possível.

“Como varejista, a reversa multicanal é um pesadelo, pois no final das contas o consumidor quer estar satisfeito, mas nem sempre isso bate com o que a empresa consegue entregar como experiência”, ele pontuou.

Leonardo Naressi na Plenária de Gestão e Operação no primeiro dia do Fórum E-Commerce Brasil 2023 – Foto Ruan Carlos

Para conseguir atender essa demanda, que deve dobrar em cinco anos, é preciso atingir a expectativa de como deve ser a compra, que parte sempre do cliente, por sua vez. Para a empresa continuar relevante, é preciso ser a alternativa mais interessante, pois muitas outras companhias estão no mercado à disposição para criar novas experiências.

Vicente acrescentou que “colocar o cliente no centro é um investimento caro e complexo”.

Naressi, por sua vez, entende que o comércio unificado é o próximo passo em uma longa linha de evolução já vivenciada pelo e-commerce (que passa da multicanalidade, pelos conceitos que conhecemos de ser omnichannel até por fim a unificação dos sistemas e operações). Ou seja, é alcançar a harmonia entre as partes envolvidas e que o cliente, seja qual for o canal de compra escolhido, seja visto como um só, bem como todas as suas interações com a marca sejam identificadas em uma única jornada com facilidade.

Vicente questionou se existe um sistema ideal para cada negócio, ou se o varejo precisa se adaptar às alternativas existentes de integração.

“Na prática, precisamos pensar em viabilizar o unified commerce como conceito, pois pode ser que a tecnologia perfeita demore demais para chegar. Até lá, precisamos viabilizar a melhor jornada do começo ao fim”, ele sugeriu para sua própria pergunta.

O que importa, segundo ambos os executivos, é conseguir visualizar essas automações da jornada como uma só. Executar e encontrar as tecnologias estão em outro patamar de adaptação.

Jornada híbrida

“Por mais que o e-commerce esteja de vento em popa, o consumidor está sempre à frente, inclusive escolhendo os canais em que preferem comprar”, explicou Naressi.

Ele entende ainda que a jornada já não é mais linear e que muitas previsões de canais e ferramentas não fazem mais sentido, uma vez que o consumidor inicia o engajamento com a marca de formas distintas. Muitos consumidores, inclusive, usam o online para a pesquisa, mas preferem o físico para realizar a compra, ou vice-versa.

Outro dado que escapa da percepção dos lojistas é que 60% dos consumidores buscam a garantia de lojas online que tenham unidades físicas, talvez pela facilidade de interação e troca, de acordo com a pesquisa The Future Shopper, da Wuderman Thompson Commerce, realizada em 2022.

A recomendação do executivo é entender que nem sempre o lojista vai conseguir direcionar o comportamento de canal do consumidor, uma vez que isso pode gerar atritos gigantes entre consumidor e loja, além de prejuízos à longo prazo para uma relação que poderia ser duradoura.

Naressi entende que “atender as expectativas dos consumidores não é fácil, pois a jornada já começa com expectativas altíssimas”. No entanto, nem sempre o consumidor nivela sua experiência de acordo com aquilo que ele viu na loja: depois do iPhone, toda empresa de celulares passou a oferecer smartphones, pois o consumidor não aceitou mais os modelos anteriores independente da marca. Para o executivo, “a boa notícia é que o investimento em um comércio unificado paga a conta”.

Como entregar tudo isso?

A resposta, para Naressi, é alinhar a expectativa do consumidor com o que o lojista consegue entregar. Ele explicou que o novo modelo de funil de vendas, antes entendido como uma pirâmide invertida, hoje se parece muito mais com uma intersecção de círculos. Batizado de “Messy Middle” (em português, “o meio bagunçado”) pelo Google em 2020, ele exemplifica como o consumidor interage com diversas fontes antes da compra (e depois dela).

Novos modelos de compra e interação

De acordo com a Statista, 34% das pessoas descobrem novidades através de marketplaces contra 31% dos que encontram através de buscadores e os 28% das redes sociais (que também são canais de grande relevância).

Além disso, 60% dos consumidores checam avaliações de produtos em marketplaces enquanto estão na loja física realizando uma compra.

Os chamados compressed commerce e social commerce também são destaques, bem como o live commerce. Isso diz muito sobre novas modalidades de consumo e interação com os consumidores digitais.

“Nosso papel aqui em alinhar a empresa para vender mais ou alinhar os canais não é função de apenas um departamento”, pontuou Naressi.

Todas as alavancas precisam estar em movimento e funcionando em harmonia para que o comércio unificado funcione. Não se trata mais, no momento em que o comércio eletrônico se encontra, ter departamentos que não estejam alinhados com um objetivo em comum. Naressi destaca ainda que as campanhas precisam levar em consideração as limitações e possibilidades dos demais departamentos, bem como sua capacidade de atender à nova demanda.

O resultado, segundo o executivo, também precisa ser visto de forma diferente. “Hoje, ainda vemos a atribuição de mídia de forma separada, não como uma composição de esforços”.

Cada vez mais existem maneiras de avaliar a composição de canais na escolha do consumidor, de maneira que a jornada pode ser vista de maneira mais horizontal e completa, não só por canal ou de forma isolada.

De acordo com Naressi, “não podemos ver a compra como resultado exclusivo das campanhas, da comunicação ou da mídia. No meio do caminho tem uma compra, que passa pelo aplicativo, pelo site, pela loja física”.

Hoje, a conversão do e-commerce reside entre a experiência e a satisfação do consumidor para as jornadas em que existe fidelização e recompra. O efeito a longo prazo, segundo Naressi, é que é possível recuperar consumidores insatisfeitos com o comércio unificado.

Aquisição de clientes e a experiência do ciclo do pedido

Vicente apresentou 11 pontos de atenção que fazem parte da jornada hoje para que um produto seja adquirido: do conhecimento sobre sua necessidade até o pós-compra.

De acordo com o executivo, esta é a jornada que todos conseguem ver, ou seja, estão no front end do e-commerce, caso não exista uma reversa no meio do caminho.

São eles: descoberta, interesse, visita ao site, visita ao produto, adicionar ao carrinho, compra, análise do pagamento, aprovação do pagamento, despacho da mercadoria, entrega e, por fim, a avaliação do consumidor.

Por trás deste processo, ou seja, do front end, existem diversas etapas “internas” que não são visualizadas pelo consumidor para cada um desses 11 pontos de atenção, que vão desde as campanhas de captura de lead até a logística de última milha.

Antes da compra: a captação e “conquista” desse consumidor são primordialmente responsabilidades do departamento de marketing da companhia, que está tentando conquistar o consumidor através das buscas, das redes sociais, da apresentação e posicionamento da marca, de ofertas e personalizações que possam convencer o consumidor que esta compra vale a pena.

Depois da compra: integração do produto com a entrega, que vai desde a validação desta compra (seja qual for o meio de pagamento) até a execução da entrega, enfim. Este modelo foi, inclusive, desenvolvido por ngelo Vicente e apresentado como parte de seu programa de qualificação e pesquisa em e-commerce no MIT, nos Estados Unidos.

A grande jornada de compra unificada, enfim

O consumidor compra através de diversas fontes (canais). Essa já é uma informação que faz parte do entendimento dos lojistas em um aprendizado omnichannel, correto? Vicente acrescenta que “a maior dor do comércio unificado são as informações entre canais estarem em silos, e não integradas”.

Ou seja, ao longo da unificação, existem milhares de pontos de contato em que as partes envolvidas não se comunicam, não por falta de interesse, mas muitas vezes por impossibilidade pela distância de pontos de contato e interação dentro da empresa.

“Não conheço nenhuma empresa do mundo que tenha todas essas etapas da jornada 100% integradas”, ele acrescenta.

Quantidade de vendas x maturidade do e-commerce

A China cresce em vendas online, mas os Estados Unidos ainda são referência pelo tempo de exposição às compras online. Ele cita o aumento do acesso à tecnologia e à internet pelo mundo, a popularização do trabalho remoto (em grande parte por causa da pandemia), mudanças constantes nos hábitos de consumo, políticas de troca e devolução cada vez mais flexíveis e disponibilidade de 3PL.

“O grande desafio é mesmo integrar o on e o off, justamente pela distância entre o marketing e a operação”.Ao fracionar as dores do e-commerce, é possível perceber pontos que precisam de atenção e estão dificultando a integração completa do e-commerce.

O executivo citou ainda a Ocado, em que não há operação humana, apenas de máquinas, dentro do centro de distribuição. Existem, claro, dificuldades e erros que precisam ser tratados, o que não é barato para a operação e nem sempre faz sentido para todos os tipos de operações. “Essa é a direção para a qual o mundo está caminhando”, finalizou

Distribuição: o desafio da dark store

Por fim, a logística também precisa estar alinhada com o processo criativo e de desenvolvimento do modelo de negócios da empresa.

A Rappi, por exemplo, tem uma estrutura de 150 dark stores para que a sua operação faça sentido no mercado brasileiro. A ideia é que o entregador, principalmente de supermercados, consigam entregar em minutos compras que no passado demoravam horas ou dias para serem entregues, com muito mais facilidade, de acordo com a disponibilidade de itens selecionados.

A maioria das grandes companhias de comida operam através de armazéns gigantes e com milhares de produtos. As dark stores trabalham com um modelo simplificado, já dentro das grandes cidades, com itens selecionados de acordo com as demandas já mapeadas de vendas.

O que essas empresas de entregas rápidas perceberam foi que os consumidores não vão deixar de ir ao supermercado, mas existe essa nova demanda para compras específicas combinada aos demais comportamentos de compra já consolidados dos consumidores pelo mundo. A palavra da vez é “conveniência”, que só é possível caso a entrega seja rápida tanto para o vendedor quanto para o consumidor, e além de tudo, rentável, o que é possível através dos entregadores.

O desafio: concorrência

O investimento também não é barato. Para o varejo, é ao mesmo tempo um sinal de alerta e de inspiração, pois as empresas com êxito neste tipo de operação são os super aplicativos. O app, neste caso, tem o domínio dos dados, o que dá a letra de qual será sua próxima compra, bem como possíveis novos padrões de consumo.

Mais do que uma dark store, esse tipo de operação está investindo em micro fulfillment centers: baseado na máxima otimização do espaço para caber a maior quantidade de produtos em espaços de distribuição dentro da cidade, já contando com operações compostas por robôs e esteiras de seleção de produtos automáticas. Além do espaço compacto e automatizado, eles podem ser acoplados já aos centros urbanos e também a estruturas de distribuição ou lojas físicas.

Para Naressi, evoluir a entrega de um canal influencia outros canais, de maneira que nem sempre o canal que recebe o investimento é o que vai receber o investimento. Ademais, “integrar também é fazer uma boa gestão de custos”.

Alavancas e sistemas como grandes bases de dados, não só como ferramentas que vão gerar informação para outras atividades, entre elas a tomada de decisão e caminhos possíveis para a automação. “Se não tivermos um dado master com tudo o que é coletado, como faremos o e-commerce unificado acontecer através dessa inteligência artificial que estamos desbravando agora?”, perguntou o especialista.

Tem muito o que pode ser feito com a IA: insights e pesquisas, atendimento e suporte, comunicação e experiência do usuários são os principais departamentos que já estão contando com esse tipo de tecnologia.

O varejo, inclusive, já está sendo citado como uma dos mais impactados, segundo a Statista. Não só em produtividade, mas a IA promete também agilizar também diversas etapas da interação entre lojas e consumidores.

A IA, inclusive, já vem sendo praticada pelo varejo há anos, sobretudo na coleta e filtro de dados, bem como na gestão de campanhas de marketing. O desafio agora é trazer essa automação para campos mais práticos.

O uso desse tipo de tecnologia deve, no entanto, afetar as gerações de consumidores de maneiras muito distintas. A Geração Z tende a ver a personalização por IA de forma bastante positiva, mas Baby Boomers ainda temem o caminho que seus dados vão percorrer para esse resultado.

Os resultados maiores são em ganho de produtividade e eficiência, mas as aplicações são infinitas.