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Roupa suja não se lava em casa

“Quem é esse louco que quer abrir uma lavanderia?”.

Faz três anos que a pergunta saiu da boca do empresário Humberto de Andrade Soares, da forma mais natural possível. Depois de uma temporada morando em Nova York, nos Estados Unidos, ele percebeu a oportunidade de abrir um e-commerce para quem não tem tempo de lavar a própria roupa na cidade de São Paulo, com atendimento apenas pela Internet.

Coincidentemente, outro “maluco” teve a mesma ideia. Gilson Carvalho Gonçalves havia acabado de se mudar para um apartamento tão pequeno que faltava espaço até para a máquina de lavar.

Assim, a dupla vislumbrou uma janela de negócios, juntou-se e deu início a aLavadeira.com, e-commerce no qual todo o processo de contratação e alinhamento da retirada e da entrega do vestuário ocorreria pela Internet.
Em julho de 2013, primeiro mês de operações, a empresa registrou 833 pedidos. Em 2016, bateu a marca de cem mil roupas lavadas mensalmente.

“Lá nos Estados Unidos paga-se muito barato para lavar e passar as roupas. É algo muito comum, até porque muitos apartamentos são bem pequenos”, explicou Soares. “Quando voltei ao Brasil, pensei: por que as pessoas pagam tanto aqui pelo serviço se lá [nos EUA] a mão de obra é mais cara?”, contou.
Apesar de não ser o tipo mais badalado de negócio – e até Soares reconhece, entre uma piada e outra -, a aposta se mostrou certeira.

Antes de começar as operações, a dupla foi a campo pesquisar os custos da concorrência e de gastos diversos que o cliente teria com água e a contratação de uma empregada doméstica para realizar o serviço. A partir daí, montou seu planejamento.

A escolha por nascer digital, quando todas as lavanderias demandam a existência de uma loja física, também foi estratégica. “O nosso modelo foi concebido dessa forma porque, para viabilizar o negócio, precisamos nos livrar de um monte de custos, inclusive o aluguel”, explicou o empresário. Dessa forma, eles conseguem cobrar cerca de 70% a menos do que os concorrentes.

Resultados

Hoje, o site funciona no esquema de planos: o usuário escolhe, em uma ferramenta personalizada, o volume que pretende mandar lavar, os tipos de roupa, se pretende incluir o “lava e passa” no serviço e a forma como as peças serão entregues. Automaticamente, o aplicativo calcula o preço da assinatura mensal.

Depois, o cliente agenda a retirada e a entrega. Os carros da aLavadeira.com fazem a logística das roupas sem custo para o consumidor e as levam até o galpão da empresa, onde as peças são lavadas e passadas.

Apesar da crise que o País atravessa, os resultados vão na contramão da média e só melhoraram nos três anos de vida da empresa: os rendimentos quintuplicaram anualmente e, excluindo franquias, hoje já é uma das maiores companhias do ramo em quantidade de peças lavadas.

Tamanho sucesso não estava programado desde sempre: criar uma lavanderia não era o sonho de infância dos sócios, claro. Hoje, Soares garante que ambos tomaram gosto pelo negócio. “No fim das contas, pensar em estratégia e gestão é interessante. Não importa se você está montando um foguete ou lavando roupa, a dinâmica é semelhante”, cravou.

Mão na massa

Apesar de boa parte do processo demandar cuidados com a logística, surpreendentemente a entrega não é exatamente o ponto mais crítico do processo de experiência do cliente. “O mais importante é o foco no cuidado com cada roupa”, explica Soares. “A gente não se cansa de falar: cada peça importa”. E de acordo com ele, a empresa recebe literalmente todo tipo de roupa – inclusive as íntimas.

Por isso, se existe algo com que os sócios são exigentes é a qualidade do trabalho. Assim, a dupla busca tornar essa mentalidade uma rotina para todos os 40 funcionários. Ao lado deles, os sócios não só inspecionam as etapas às quais camisas, calças e camisetas são submetidas como também colocam a mão na máquina, literalmente, e lavam também.

“Cuidamos de tudo para sair do jeito que queremos”, justificou Soares. “As pessoas têm uma relação muito próxima com as suas roupas. Um presente, uma lembrança que aquela peça desperta”, defendeu.

Custo relativo

Apesar de, por meio da Internet, conseguirem cortar diversos custos de operação, Humberto e Gilson não conseguiram fugir de todos os gastos, principalmente após o negócio crescer.

Ainda assim, eles encontraram formas de mostrar ao cliente que vale a pena, também do ponto de vista financeiro, confiar o seu guarda-roupas à lavanderia. Os planos começam básicos, no valor de pouco mais de R$ 100, até mais de R$ 1 mil, no caso de volumes acima de 100 kg.

“Claro, se você mesmo lavar todos os dias, vai sair mais barato”, brincou Soares. “Mas não existe apenas o custo em dinheiro. Ao dispensar uma empregada ou lavanderia, você vai acabar gastando tempo, e hoje tanto o homem quanto a mulher trabalham e passam o dia fora de casa”, afirmou.

Nos meses de férias, segundo ele, é comum receber encomendas de famílias que voltam de viagem e deixam todas as peças para lavar – e, assim, investir o tempo livre em outra atividade.

Além disso, Soares faz questão de relembrar que, após a aprovação da PEC das Domésticas – que regulamentou a profissão e aumentou os encargos trabalhistas -, o valor pago por quem escolhe utilizar o e-commerce realmente ficou mais em conta quando comparado ao que se gastaria com uma diarista.

Inovação

Mesmo em um ramo já estabelecido há décadas, Soares acredita haver espaço para o desenvolvimento de novas ideias e modelos para entregar ao cliente uma boa experiência.

Embora não seja o maior ponto crítico da operação, a logística tem ganhado destaque quando o assunto é aperfeiçoamento. Até porque ninguém gosta de receber uma entrega errada – ainda mais em se tratando das roupas de outra pessoa.

Uma das novidades será a implantação de um sistema de GPS que localiza dois nomes iguais no mesmo CEP. Isso será útil em casos nos quais duas pessoas com o mesmo nome morem na mesma rua.

“Estamos desenvolvendo um aplicativo responsável por escanear a roupa e informar ao motorista o endereço exato por meio do GPS, de forma automática”, disse. Cada peça será fotografada para controle, e o cliente conseguirá consultar, por meio da sua conta online, uma lista com as peças a serem devolvidas. Dessa forma, eles pretendem mitigar os erros humanos e oferecer um serviço com cada vez menos dor de cabeça.

Outra preocupação da empresa é com a gestão dos dados. “Hoje, a aLavadeira.com é administrada por um software”, explicou. “A grande novidade agora será pensar em um programa que consiga gerir além do controle de vendas: quem lavou uma peça, quem a entregou, a que horas ela saiu”, afirmou.

Na sua opinião, o mercado brasileiro de e-commerce ainda tem bastante a oferecer em termos de novidades para os clientes, ainda mais em tempos de crise econômica, nos quais a criatividade pode ser a alavanca para o sucesso. Só é preciso pensar fora da caixa.

“Percebo que o Brasil é completamente aberto à inovação e ao empreendedorismo”, opinou. “Vejo muito mais oportunidades aqui do que em uma cidade como Nova York, onde a concorrência é brutal”, concluiu.

Artigo publicado originalmente na Revista E-Commerce Brasil