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Entendendo o código cultural da classe média

Um tema discutido com frequência em eventos e debates sobre e-commerce é: rentabilização.

Muitos profissionais e empresários têm, de certa forma, criticado a maneira como os consumidores foram acostumados a comprar online. No início, para atrair consumidores às lojas virtuais, eram oferecidos (como diferencias às compras realizadas em lojas físicas) um melhor preço, frete grátis e a possibilidade de comprar tudo em 10 vezes sem juros. A estratégia no começo deu certo, e fez com as compras online vencessem muitos desafios como a desconfiança, prazo de entrega e ao desconhecimento da prática.

Hoje comprar online já não é mais uma novidade, e sim uma realidade, e passado o tempo o modelo de vender mais barato com frete grátis não é mais sustentável e faz com que a maioria dos e-commerces fechem suas contas no vermelho.

A fim de solucionar este problema o mercado começa a conscientizar os consumidores sobre práticas mais rentáveis, mas a abordagem escolhida talvez não seja a melhor.

Os grandes varejistas virtuais passam a praticar o mesmo preço das lojas físicas e a cobrarem o frete na maioria das compras utilizando a abordagem de que o benefício vendido é a conveniência de comprar sem sair de casa, mas será que esta é a melhor abordagem?

Não sei quanto de vocês já leram o livro O Código Cultural (Campus/ Elsevier 2007) do autor francês Clotaire Rapaille. Clotaire iniciou sua carreira como psicoterapeuta, trabalhando com crianças autistas, e hoje é consultor de marketing research, trabalhando para mais de 50 empresas da Fortune 100. Durante suas pesquisas com crianças autistas, Clotaire desenvolveu uma teoria chamada Imprinting, que na prática significa que uma pessoa só aprende e desenvolve laços à partir de uma forte emoção que atinge o subconsciente dela.

Baseando-se nessa teoria, Clotaire criou um modelo de comportamento de consumo chamado Código Cultural, a partir deste modelo Clotaire ajudou dezenas de empresas a venderem mais e melhor. Um dos exemplos que mais gosto é o trabalho que ele fez com a Nestlé no Japão. A Nestlé queria introduzir o café como principal bebida quente dos japoneses, substituindo assim o chá, após estudos e pesquisas Clotaire percebeu que o chá é mais que uma bebida no Japão e sim parte de sua cultura, e o café nada representava não importando quanto fosse o investimento em marketing que a Nestlé estivesse disposta a investir.

Para inserir o café na cultura japonesa Clotaire sugeriu que a marca suíça começasse a introduzi-lo a partir das crianças, para causar o primeiro Imprinting (este evento é mais comum na infância, em crianças entre 5 e 9 anos), e assim construir um Código Cultural para café no Japão, a saída encontrada foi a criação de sobremesas tradicionais japonesas sabor café, hoje a Nestlé vende mais de 1 bilhão de dólares em café no Japão por ano.

O que eu gostaria de chamar a atenção para este caso é a importância de entendermos o código cultural que está por trás da classe média brasileira.

Ir ao shopping (ou comprar fora de casa), gastar horas no trânsito, procurar vaga no estacionamento, caminhar e “caçar” produtos por longos períodos, pode parecer uma atividade enfadonha para alguns, porém a classe média vê nos shoppings centers uma real oportunidade de lazer. Diferente de classes sociais mais altas que frequentam concertos de música, teatros, restaurantes e viajam, a classe média tem o seu divertimento e lazer em shoppings centers. Portanto tentar vender o benefício do e-commerce a partir da conveniência de comprar sem sair de casa pode se tornar um fator desestimulante para classe média, afinal estaríamos tirando dela o seu lazer mais tangível.

Mas então como melhorar a rentabilidade dos e-commerces, como trabalhar com o mesmo preço praticado pelas lojas físicas, cobrar o frete e não precisar vender tudo em 10 vezes sem juros?

Eu realmente acredito que os e-commerces têm mais a oferecer do que a conveniência de comprar sem sair de casa. Quantos de vocês conhecem alguma livraria física com mais de 5 milhões de livros diferentes? Quantos de vocês conhecem alguma loja física que possua 20, 30, 40 modelos de tablets de diversos preços e modelos? A variedade é um importante diferencial dos e-commerce frente as lojas físicas, mesmo a disponibilidade, é mais fácil encontrar aquilo que você procura na internet do que em 10 lojas físicas diferentes.

Outro fator muito interessante é o que a Netshoes, o Pontofrio e outros varejistas já estão fazendo, que é recompensar seus clientes por suas compras. Uma pergunta para refletir rapidamente: quando pensamos em consumo, qual o grande desejo da classe média? Viajar de avião. Sem dúvida viajar de avião é um dos objetivos de toda família que esta na classe média.

O Pontofrio fez recentemente uma promoção em parceira com a Multiplus que dava 8 pontos Multiplus a cada real gasto em seu e-commerce. Ao comprar uma geladeira, ou um iPhone, o cliente ganhava mais de 16.000 pontos Multiplus, o suficiente para uma viagem ida e volta nacional, ou até mesmo na América do Sul, durante promoções frequentemente anunciadas pela Multiplus/TAM.

A ação foi um sucesso, afinal o beneficio tem tudo a ver com o código cultural da classe média, e satisfaz não só a necessidade de compra como também o desejo de viajar.

A experiência de comprar via dispositivos móveis, as possibilidades de personalizar a navegação do usuário entregando-o uma experiência exclusiva de compra, ferramentas como lookbooks (moda), ambientes virtuais (decoração), entre outras, também são grandes diferenciais dos e-commerces. E a internet permite a criação de uma atmosfera de compra extremamente relevante.

Certamente o e-commerce pode oferecer mais do que conveniência como atributo para incentivar os consumidores a comprarem online. Assim sendo, é possível vender com mais margem, tornando o negócio cada vez mais rentável. Para isso precisamos apenas entender o código cultural que está por trás das necessidades de nossos consumidores e satisfazê-las.