Relatórios, entrevistas de estrategistas e comentários sobre o mercado têm sido unânimes em afirmar que os papéis ligados ao e-commerce estão “esticados”, ou seja, com valores acima do que seus fundamentos atuais sustentariam.
Por outro lado, a maior parte deles continua se distanciando dos preços-alvo estabelecidos pelo mercado, mesmo com a revisão constante dos modelos. Diante do fenômeno, analistas apontam que o setor não pode ser analisado, em termos de preço, por métricas aplicadas a setores mais consolidados.
A mais comum delas é a da divisão do preço do papel pelo lucro por ação que a empresa teve nos 12 meses anteriores ou que se prevê que ela apresentará nos trimestres futuros.
No caso dos papéis de Magazine Luiza, B2W, Via Varejo e do Mercado Livre (negociada na Nasdaq, em Nova York), porém, o cálculo pode apontar que os papéis estão caros demais e não valem o investimento. Em muitos casos, isso acontece porque as empresas não dão lucro, embora sigam crescendo.
“Muitas dessas empresas não vão dar lucro, porque são nomes de crescimento. Não são poucos os casos de empresas que nunca deram lucro e não param de crescer”, comenta Henrique Esteter, analista da Guide Investimentos, ao Broadcast Estadão.
Na B3, o exemplo mais claro é o da B2W: no primeiro trimestre, a última linha do balanço mostrou prejuízo de R$ 108 milhões. Mas foi a receita, que cresceu 32,3% em um ano, que chamou atenção do mercado. O resultado é que, no ano, a ação sobe 83%. É a maior valorização do Ibovespa.
Alta no e-commerce brasileiro
As máximas históricas da Amazon em plena pandemia já levavam a um fluxo comprador das empresas listadas na Bovespa, mas quem puxou o rali das varejistas de e-commerce brasileiras foi o Mercado Livre. Em maio, a companhia reportou uma alta de 37,6% de suas receitas em dólares no primeiro trimestre.
Muito mais semelhante a Magalu, B2W e Via Varejo em termos operacionais e geográficos que a empresa de Jeff Bezos, a empresa desencadeou uma alta dos papéis do setor no mercado brasileiro que ainda não perdeu fôlego.
O próprio Mercado Livre tem renovado máximas históricas. Na última sexta (10), a ação fechou negociada a US$ 1035,83. Com este preço, a empresa valia US$ 51,5 bilhões. Se estivesse na B3, valeria R$ 275,5 bilhões. Seria a terceira companhia mais valiosa da Bolsa brasileira naquele dia, atrás apenas de Petrobras e Vale.
Neste cenário que está longe do regular, o tradicional P/L perde espaço para múltiplos que consideram justamente as vendas, que são o chamariz para os papéis do setor nas Bolsas. “O valor da empresa dividido pela receita é bastante utilizado. Faz muito mais sentido olhar para múltiplos alternativos para conseguir projetar o potencial da ação”, diz Esteter.
Parte dos grandes bancos já começa a utilizar esse tipo de cálculo. Na recente atualização para o preço-alvo de B2W ON, o UBS chegou aos R$ 110 que estabeleceu através de um múltiplo visto como justo de 5,5 vezes a divisão entre valor da companhia e vendas em 2021. O mesmo tipo de modelo foi aplicado à Via Varejo pelo banco.
Acima do preço-alvo
Ainda assim, as revisões já não conseguem acompanhar a disparada das ações em vários pregões seguidos. A se considerar a média dos preços-alvo mais recentes estabelecidos por Citi, UBS e Goldman Sachs para o Mercado Livre, por exemplo, o papel fechou o pregão de hoje praticamente no valor que se espera dele no final de 2020 — US$ 972,63 —, e isso porque caiu. Olhando para os nomes listados no Brasil, o fenômeno é ainda mais considerável.
A B2W, por exemplo, fechou na terça-feira (14) com preço 14% acima da média dos preços esperados por seis casas, o que inclui, além dos três bancos já citados, o BTG Pactual, o Itaú BBA e a XP Investimentos.
Muitos deles fizeram a última atualização após o balanço do primeiro trimestre, o que explica a maior defasagem. O BTG fez a mudança mais recente, para R$ 120 — e o papel já se aproxima deste valor. Puxada pela B2W, a Americanas já tem preço 4% acima da média das casas consultadas pelo Broadcast.
O caso mais destacado, porém, é o da Via Varejo. Contando os preços esperados por BTG, Citi, BBA, UBS e Goldman Sachs, a ação fechou hoje com preço 23% acima da média das estimativas para dezembro deste ano.
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