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Como precificar no e-commerce? Especialistas tiram todas as dúvidas

Uma das maiores dores de e-commerces e do varejo em geral está em encontrar a estratégia ideal de pricing para sua empresa. No digital, além da concorrência constante, presente a poucos cliques que fazem da precificação um ponto fundamental, a prática tem papel crucial para o bom funcionamento do negócio, pois envolve o equilíbrio entre vender e lucrar.

Imagem de uma mão sobre utilizando uma calculadora

Para Roberto Assef, Consultor em Pricing e Gestão de Custos e professor da FGV, não identificar outros atributos de decisão, por parte dos consumidores, além dos preços de venda é um dos “pecados” cometidos na hora de precificar. “Quando compramos algo, mensuramos, de alguma maneira, o peso de outros atributos e seus respectivos níveis de importância, na decisão dos consumidores. Esta avaliação, por ser, por vezes subjetiva, leva empresas a trabalharem, quase exclusivamente, o preço a partir dos custos e/ou dos concorrentes mais diretos”, afirma, em entrevista exclusiva para o E-Commerce Brasil.

Além dele, Ricardo Ramos, CEO e fundador da Precifica, empresa especialista em soluções de pricing, e Fabiano Coelho, PhD em Business Administration pela Florida Christian University e coordenador de diversos MBAs na FGV, como Finanças e Empreendedorismo também responderam à perguntas sobre precificação para desmistificar o assunto aos nossos leitores.

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Reunimos algumas dúvidas gerais que foram sanadas nas entrevistas abaixo. Confira!

Fabiano Coelho

Fabiano é PhD em Business Administration pela Florida Christian University, coordenador de diversos MBAs na Fundação Getúlio Vargas, como Finanças e Empreendedorismo. Além de ser palestrante e consultor de empresas na área de: Pricing, Gestão de Resultado, Gestão de custos e Valuation, autor de livros e ainda criador do modelo tridimensional de formação de preços.

E-Commerce Brasil: Quais são as principais dores do mercado quando o assunto é precificação? E como solucionar esses problemas?

Fabiano Coelho: A formação de preços tem quatro pilares: aspectos financeiros, mercadológicos (percepção de valor), estratégicos e de posicionamento. Percebo, em consultorias, que as empresas que enfrentam dificuldades sempre esquecem de um destes aspectos. 

No financeiro, em não fazer todos os cálculos necessários, inclusive dos descontos concedidos e de toda complexidade dos nossos tributos. Na percepção de valor, em não comunicar aos clientes de forma correta os benefícios e qualidades dos produtos ou serviços. No estratégico, em não desenhar os objetivos corporativos e as estratégias de preço para que haja um norte de médio e longo prazo. E no posicionamento, em não colher informações corretas do comportamento dos concorrentes e de como eles precificam.

Importante: a formação de preços é uma arte que reúne uma série de atributos. Sempre que o gestor tenta pular uma destas etapas ou tenta simplificar o que não deve ser simplificado, isso invariavelmente afeta os resultados.

ECBR: Quais são os fatores que devem ser levados em consideração ao montar a estratégia de precificação?

FC: O preço é a forma mais intensa de comunicação com o mercado. É através dele que a empresa informa seu posicionamento e suas qualidades. Um preço abaixo ou acima do que deveria afasta clientes do posicionamento que a empresa escolheu. Por isso a política de desconto é importante, porque vender mais pode atrair um tipo de público diferente daquele que o posicionamento estratégico definiu – e isso pode afetar aspectos como marca e percepção de valor.

Assim, a empresa deve ter um plano estratégico que defina seu público-alvo, nível de qualidade exigida por este público-alvo e concorrentes deste posicionamento. Com isso, poderá melhor desenhar sua estrutura operacional e de vendas e, consequentemente, uma precificação mais assertiva considerando os aspectos mencionados no item anterior. 

ECBR: Quais fatores devem ser considerados ao montar uma estratégia de precificação para o e-commerce próprio e para a venda em marketplace?

Primeiro ponto importante: é muito comum as empresas acharem que seu segmento é diferente dos outros. É comum escutar “no marketplace é diferente”. Óbvio que existem particularidades do e-commerce ou do marketplace, mas muito dos cálculos e estratégias devem ser feitos independentemente do segmento ou plataforma.

Segundo ponto importante: quem você é neste momento? Você pode ser uma loja física e está pensando em vender pela internet. Você pode ter um e-commerce próprio e acredita que vender pelo marketplace pode aumentar o seu faturamento. Você pode estar em um marketplace e quer abrir um e-commerce próprio. Ou qualquer outra combinação.

Dito isso, é importante o gestor traçar as estratégias para este canal de vendas frente a objetivos pré definidos: você irá vender os mesmos produtos na loja física e no e-commerce? Ou você vai trabalhar com produtos diferentes? Seu e-commerce tem poucos produtos, o que prejudica o número de visitas, e o marketplace permite se beneficiar com o tráfego do site e você usará o marketplace como isca para seu e-commerce? Cada gestor precisa, de maneira antecipada, traçar quais objetivos desejados com cada um dos canais em que seus produtos e serviços serão inseridos, analisando os prós e contras de cada um deles.

Por exemplo, as vendas online podem impactar negativamente se o gestor não fizer seu dever de casa, como saber se há estrutura produtiva para dar suporte a um aumento das vendas, da complexidade tributária e logística de se vender para diferentes estados, do custo de captação de clientes etc.

No marketplace o cliente não é seu e sim da plataforma. Assim, você não tem acesso a uma série de informações que você teria no e-commerce próprio. Entretanto, o marketplace já está investindo em Google Ads, Facebook Ads e todas outras estratégias de marketing digital.

No marketplace, todos os produtos são posicionados no mesmo patamar e a alta comparabilidade pode pressionar as margens de lucro. No e-commerce próprio, permite trabalhar maiores valores agregados por haver uma interação maior com o cliente. Entretanto, alguns clientes sentem mais confiabilidade em transacionar no marketplace do que em um e-commerce não tão conhecido por ele. 

No e-commerce próprio, o custo de captação de clientes é maior pela demanda de investimentos de comunicação do site e seus produtos e serviços. No marketplace, esse custo é menor e há menor risco de fraude. Entretanto, eles cobram uma comissão por conta disso, inclusive comissão no insucesso, ou seja, em caso de extravio ou cancelamento por parte do cliente, alguns cobram a taxa.

Importante destacar que o mundo online é muito mais rápido que o offline. Em uma loja física você pode até precificar hoje e “esquecer” isso durante alguns dias ou semanas. No mundo virtual não. O grande número de concorrentes, a alta comparabilidade e a velocidade em que os players mudam seus preços é muito maior. Portanto, necessariamente o gestor deve usar ferramentas que monitorem o preço de seus concorrentes e até faça ajustes automáticos de preço de acordo com a oferta e procura. 

ECBR: A estratégia de precificação usada para um marketplace deve ser a mesma para todos?

FC: Ter uma estratégia de precificação para todos é perigoso. “A essência da estratégia é definir o que você não vai fazer”. Esta frase do Michael Porter nos ensina que definir um posicionamento é necessariamente renunciar outro. Tentar abraçar vários pode fazer com que a empresa não crie vínculo afetivo com nenhum cliente.

Uma alternativa é a empresa criar combos de produtos e serviços. Ou seja, com um mesmo produto é possível alcançar diferentes posicionamentos porque são pacotes diferentes – mas é fundamental diferenciar os pacotes. Assim, a Netflix consegue com um mesmo “serviço” vender pacotes distintos a públicos diferentes com variados preços.

Outro exemplo é quando a empresa vende opcionais ou produtos complementares. Ou seja, ela vende um barbeador e oferece uma espuma de barbear com desconto ou um determinado produto com venda de garantia estendida à parte. Melhor, tentam transformar uma receita pontual em receita recorrente, se entende que o cliente constantemente compra aquele produto. Pode, assim, criar um plano de assinatura.

O combo também permite que você influencie seu cliente a comprar o que você quer que o cliente compre. Ao comprar pipoca em um cinema é comum encontrar, por exemplo, pipoca pequena R$ 12,00, média R$ 13,00 e grande R$ 14,00. Neste caso, a empresa está influenciando que você compre a pipoca grande independentemente da sua fome.

ECBR: Quais são as dicas mais relevantes para traçar a estratégia de precificação para marketplaces?

FC: Algumas dicas:

  1.  Analise todos os aspectos mencionados: questões financeiras (gastos fixos, gastos variáveis, gastos variáveis em função da receita, aspectos tributários de venda para diferentes estados, mark-up, margem de contribuição, etc); estratégicas (estratégia da empresa, dos produtos e de preço, política de comissionamento e de desconto, etc.); mercadológicas (entender porque alguns clientes compraram seus produtos e porque alguns não compraram. Esse tipo de pesquisa é fundamental. Muitas vezes se descobre que a venda não ocorreu porque o prazo de entrega estava alto ou que houve demora de resposta de uma pergunta pelo Instagram. Isso faz também com que você comece a trabalhar mais atributos que reduzam a importância do preço da decisão de compra do cliente); e de posicionamento (mapeando constantemente como está a precificação de produtos similares ou iguais);
  2. Nunca se esqueçam do pós-venda. O custo de captar um novo cliente é muito maior do que manter um cliente. É extremamente comum comprar um produto pela internet e simplesmente não ter nenhum contato da empresa – o que permitiria expandir a relação com o cliente, ajustar problemas e vender outros produtos ou serviços;
  3. Muitas empresas são desenvolvidas apenas virtualmente, mas outras têm sua loja física além do e-commerce. Atrair seus clientes à sua loja é uma excelente oportunidade de criar um vínculo perene;
  4. Use ferramentas estatísticas para entender o comportamento dos clientes. Sempre comprei comida para meus cachorros em um site. Em um determinado dia, recebi um e-mail dizendo “Como estão seus cachorros (inclusive dizendo o nome deles!)? Cuidado para não esquecer da alimentação deles!”. Quando fui ver, tinha ração para apenas dois dias. Ou seja, eles me avisaram a tempo de comprar. Se não tivessem me avisado, eu teria que comprar em uma loja física correndo o risco de pagar mais caro e, pior, de gostar do atendimento e nunca mais voltar a comprar pelo site;
  5. “Às vezes, vender muito é exatamente o indicador que seu preço está errado”. Com esta minha frase eu tento evidenciar que o preço é uma informação importante sobre desempenho, mas deve ser analisada sem viés. Normalmente, interpretamos que vender muito é sinônimo de sucesso, mas às vezes pode ser o inverso evidenciando uma excelente oportunidade de rever os preços de seus produtos e serviços; e
  6. Nunca pare. Sempre se movimente em entender as tendências do seu segmento e em mudanças no comportamento de compra do seu cliente. Visite sempre o e-commerce de outras empresas e de outros países, tente participar de feiras do seu segmento, conversar com seus clientes. Estar um passo na frente sempre provocará resultados positivos.

ECBR: De que forma os fatores mercadológicos influenciam no preço?

FC: Em tudo. Entender a elasticidade do preço, do comportamento do seu cliente, ciclo de vida dos produtos e serviços e como o cenário ambiental influencia o processo decisório é fundamental.

Por exemplo, um dos assuntos que mais cobro das empresas é um maior empenho em materializar para seus clientes os valores racionais e emocionais que impactam a percepção de valor. Aspectos racionais funcionam mais para mercado B2B, ou seja, prazo de entrega, prazo de pagamento, garantia de qualidade, depoimentos de outros clientes, informações detalhadas dos produtos com fotos profissionais fazem a diferença quando o cliente compara produtos parecidos com preços similares. 

Aspectos emocionais funcionam mais para mercado B2C, ou seja, marca, desejo e vínculo afetivo. Esta é a explicação porque muitas empresas estão deixando de anunciar seus produtos em canais tradicionais como TV e rádio para focarem em digital influencers. Dependendo do seu posicionamento e localidade, o anúncio consegue ser mais direcionado ao seu público-alvo e cria-se o vinculo que as empresas tanto desejam.

Ricardo Ramos

CEO e fundador da Precifica, empresa especialista em soluções de pricing. Empreendedor com foco em inovação no setor de tecnologia SaaS. Também é palestrante sobre os temas de e-commerce, inteligência de mercado, gestão de empresas e empreendedorismo.

ECBR: Quais são as principais dores do mercado quando o assunto é precificação? E como solucionar esses problemas?

RR: O consumidor está cada vez mais bem informado, interagindo com múltiplos canais em momentos diferentes da jornada de compra. Hora tem urgência: disposto a pagar mais para receber mais rápido; hora quer conveniência: comprar online e retirar na loja; hora quer praticidade: comprar na loja e receber em casa.

A primeira dor está no acompanhamento dos movimentos de preços e promoções nestes diferentes canais (loja, marketpalce, app próprio, superapps, etc.). Em geral, o consumidor está mais bem informado sobre ofertas do que o próprio varejista.

A próxima dor está em definir rapidamente como remarcar seus preços para capturar aquela demanda momentânea, sem perder dinheiro. Manter este acompanhamento e uma tomada de decisão rápida e inteligente só é possível com o apoio da tecnologia. 

ECBR: É importante traçar uma estratégia de precificação para cada canal digital? Por que?

RR: Sim. Por duas principais razões:

  1. Cada canal conta com uma estrutura de custo diferente. Por exemplo, comissão cobrada, custo por clique, contrapartidas.
  2. Cada canal conta com uma audiência ou um momento de compra específico. Por exemplo, quem busca produtos no Zoom ou no Google Shopping provavelmente procura preço acessível. Já quem vai direto a um marketplace vertical busca especialização e não necessariamente preço baixo.

ECBR: Como essa técnica pode favorecer o lojista na prática?

RR: Determinando o preço ideal da oferta para cada canal é possível:

  1. Reduzir prejuízos com as diferentes taxas de comissão. Apesar do produto ser o mesmo, cada canal conta com um custo distinto.
  2. Aumentar a margem quando o comportamento de compra em um canal específico mostra que sua audiência está disposta a pagar mais pelo produto.

ECBR: Como a tecnologia pode ajudar a operacionalizar esse processo?

RR: A tecnologia ajuda a resolver 3 grandes dores de uma empresa:

  1. Acessar dados de mercado de forma escalável;
  2. Reagir rapidamente ao mercado concorrencial, remarcando preços de forma inteligente;
  3. Prever comportamento de consumo para equilibrar sua oferta com a demanda.

O objetivo da tecnologia é trazer mais precisão e previsibilidade na tomada de decisão, com mais agilidade e menor custo. Muitas empresas ainda tomam decisões com base em feeling, o que traz grande margem de erro e não pode ser replicado no crescimento da empresa.

Cite algumas soluções para acessar informações de mercado, reagir à concorrência e prever a demanda do consumidor.

O acesso à informações de mercado é possível através de tecnologias para monitoramento de preços e promoções. Elas permitem enxergar como o mercado está promocionando um produto em cada canal de venda.

Uma vez que se tem os dados de mercado, é hora de definir como se reposicionar. Tecnologias de precificação dinâmica baseadas em regras de negócio permitem acelerar a tomada de decisão baseada nos movimentos de mercado.

Já a previsão de demanda e a previsão da disposição do consumidor a um certo preço é possível com tecnologias baseadas em inteligência artificial. Estas analisam continuamente os dados de venda e consumo para determinar o melhor equilíbrio entre oferta, demanda, margem e a validade dos estoques.

ECBR: Quais são as tendências de pricing do mercado?

RR: O tema pricing tem ganhado peso recentemente pois, com o ambiente econômico, as empresas não têm mais tanta margem para erro. Precisam otimizar ao máximo suas operações e encontrar novos caminhos para gerar resultados.

Com isso, estes são alguns desdobramentos que já estamos assistindo:

  1. Mais empresas estarão formando áreas dedicadas à pricing e inteligência de mercado;
  2. As decisões de pricing serão cada vez menos tomadas por pessoas e mais por inteligência artificial;
  3. Os profissionais de pricing terão mais espaço nas definições de estratégias junto ao C-Level;
  4. O trabalho operacional em pricing será cada vez mais substituído por tecnologias que entreguem automação.

Roberto Assef

Consultor em Pricing e Gestão de Custos | Professor MBA – FGV | Autor | Palestrante | Mentor Endeavor. Professor dos cursos de Pós Graduação em Marketing, Gestão Empresarial, Gestão Comercial, Saúde, nos módulos Pricing, Gestão de Custos e Planejamento e Controle de Vendas.

ECBR: Quais são as principais dores do mercado quando o assunto é precificação? E como solucionar esses problemas?

RA: Um dos maiores problemas/dores é não identificar outros atributos de decisão, por parte dos consumidores, além dos preços de venda. Quando compramos algo, mensuramos, de alguma maneira, o peso de outros atributos e seus respectivos níveis de importância, na decisão dos consumidores. Esta avaliação, por ser, por vezes, subjetiva, leva empresas a trabalharem, quase exclusivamente, o preço a partir dos custos e/ou dos concorrentes mais diretos.

ECBR: Quais as oportunidades e riscos quando o assunto é revenue management?

RA: O RM é uma maneira de precificar, que além de identificar custos e concorrência, possibilita incluir na decisão de compra outros itens importantes (atributos), como  logística de entrega, relevância de datas e eventos especiais, urgência no recebimento, diferença entre públicos alvos, enfim, oportunidades não detectadas quando os preços se resumem a repasse de custos e comparação aos concorrentes.

Ao mesmo tempo, quando os produtos/serviços são de enorme relevância para o consumidor, que tem uma referência do preço de mercado (exemplo: gasolina nos postos), as alterações dinâmicas de preços podem induzir a avaliações bastante negativas.

ECBR: Como conseguir rentabilidade a partir da grade de preços?

RA: A partir do ajuste de preços, de acordo com os volumes comercializados, identificando fatores de correlação mais justos e apropriados

ECBR: Como correlacionar margens, descontos e capital de giro de produtos?

RA: Identificando as rentabilidades atuais, considerando os prazos de venda, os preços e margens vigentes e níveis de estoque. Quando calculamos as margens e o capital de giro envolvido, podemos avaliar concessões de descontos, com o intuito de reduzir estoques, por exemplo, ou prazos de venda, trazendo caixa em troca de margem, mensurando as rentabilidades atuais e futuras, pós descontos.

Por Marina Teodoro, da Redação do E-Commerce Brasil

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