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10 anos em 12 meses: Flávio Rocha, CEO da Riachuelo, fala sobre a reinvenção do varejo de moda

Por: Júlia Rondinelli

Editora-chefe da redação do E-Commerce Brasil

Editora-chefe da redação do E-Commerce Brasil

O último dia do Fórum E-Commerce Brasil 2021, no auditório de Marketing e Vendas, foi encerrado com chave de ouro pelo Founder e CEO da Riachuelo, Flávio Rocha. Durante a entrevista, o representante de uma das maiores lojas de varejo falou sobre os fatores que irão revolucionar o setor, além dos desafios enfrentados durante a pandemia e o futuro das lojas físicas.

Flávio Rocha também destacou, durante a sua apresentação, a história de 72 anos da Riachuelo e defendeu que o momento pode ser passivo para aqueles que “possuem os olhos presos no retrovisor”, olhando para o passado, mas está sendo um ativo importante para a empresa, principalmente com um passado pioneiro, tornando-os mais preparados para o futuro. Na sequência ele brincou dizendo que eles são uma “startup de 72 anos” e relembrou que um dos aspectos positivos foi a transformação digital.

Há quatro fatores que irão revolucionar o varejo, quais são eles?

Vimos várias barreiras de tecnologia que não eram usadas porque o consumidor não era estimulado. Vimos velhinhos quebrando a cabeça para mexer com o seu aplicativo de compras. Um dos aspectos positivos da pandemia foi que nos deu um empurrão de 10 anos de transformação digital em 12 meses. Vimos várias barreiras de tecnologia que não eram usadas porque o consumidor as usava.

Vimos o que eu chamo de “Big Bang Financeiro”: são as quatro tecnologias. Cada uma disruptiva, mas alinhadas possuem um potencial enorme, trazendo transformação profunda no crédito e varejo, com atribuições e sinergia entre mês de pagamento.

Crédito e varejo são pioneirismo do Brasil. O cartão Riachuelo tem 30 anos e, neste momento, duas câmeras olhando aspectos diferentes dos clientes, colaboram entre si. Quando você junta a revolução do Pix, onde o presidente do Banco Central, surpreso, fala sobre os 100 milhões de usuários. Em seguida vem o Open Banking, que é transformador e traz enorme responsabilidade para o varejo.

O cliente, quando entrava na Riachuelo, havia uma certa apreensão. O “limite teste” era dado e ao longo de meses, e até mesmo anos, sendo aumentado conforme íamos descobrindo o seu potencial de crédito. Mas hoje não: o Open Banking traz o histórico, com riqueza de informação, mas respeitando a Lei Geral de Proteção aos Dados.

Qual é a importância do modelo de marketplace nesses quatro pilares?

É realmente transformador. Eu costumo dizer que “rede de varejo é a coluna principal para a construção do negócio do futuro”. Nós estamos vendo o ecossistema generalista razoavelmente consolidado, mas existe esse “filão” em que estamos apostando as fichas.

Com a construção do ecossistema da moda no centro, mas agregando mais peças, como um lego, com a sinergia da moda, beleza, estilo de vida, cultura, gastronomia e arquitetura, como a Riachuelo Casa. A tecnologia é a semente de superpoderes que ainda não desabrochou.

Quando se entra no aplicativo há um mix da loja física, mas não se tira pleno proveito. O primeiro poder do mundo digital é a inexistência de limitação física. Devemos criar relevância para o cliente e enriquecer o mix, tirando proveito desse superpoder.

Um pequeno produtor de casa e banho, por exemplo, pode fazer parte do ecossistema e se integrar nisso?

É o projeto mais importante desse ano. Chegará até o final do ano e vai mudar realmente o cenário concorrencial. O mundo físico é mais democrático: você entra no shopping e as lojas são distribuídas entre os espaços. Todo mundo tem a oportunidade de mostrar ao cliente.

No mundo digital é mais desafiador, você não vai ter esse espaço disputado no smartphone do cliente. E quem vai ser esse grande ganhador? Os americanos costumam dizer que só há espaço para um ganhador e é assustador. Com a peneira mais fechada e para conquistar precisa ter relevância para o cliente.

O cliente não vai manter um aplicativo que usa a cada dois meses, esse é o período de frequência para o mundo físico, mas não suficiente para o digital. Integrar vários pontos de contato com um mix amplo é necessário para que se crie recorrência e relevância.

Hoje, quando olhamos para o mercado, há um mix de banco, financeiro, tecnologia e varejo. Bancos virando varejo, assim como varejo abrindo financeiro. Quando olhamos para o Brasil, há vários marketplaces, há muitos que estão chegando e ganhando espaço em um curto espaço de tempo. Qual é o futuro disso?

As lojas que possuem um viés de extinção são aquelas que se veem como tal, passivas, que abrem as portas de manhã e esperam as coisas acontecerem. A loja física ainda é uma das peças mais importantes para o lego. Os ecossistemas generalistas, enraizados, têm pouca vocação para essa linguagem e para criar essa atmosfera de moda. Existe uma oportunidade única de criar moda agregando esses mundos com um ingrediente importante, o enraizamento físico. O digital é a realidade, retirar na loja, por exemplo, mostra a sinergia que existe entre o físico e digital.

Qual é o futuro da loja física? Como você enxerga o papel da loja física para o futuro?

Isso varia de setor para setor. A Amazon, por exemplo, que começou com livros e CDs, talvez seja o produto mais dispensável de contato físico. Nós estamos no extremo ponto, talvez o último setor que a tecnologia vai substituir. O toque do tecido, o experimentar, mesmo com tantas ferramentas, ainda são insubstituíveis.

No mundo da moda, a loja física vai ser, por um tempo, relevante. Ela transmite a experiência da marca. Os shoppings estão se transformando em um espaço de experiência, então teremos a loja física com um papel importante por muito tempo.

A grande escola de varejo é a chinesa. Quando entramos no site ou no aplicativo de moda, há uma amostra digital. Os algoritmos começam a avaliar a performance e informar a empresa qual o potencial daquela peça para que se faça a aposta em termo de confecção.

O fast fashion faz você ter uma aposta inicial e, ao longo de dois meses, se compra a matéria-prima e produz, fazendo a reposição no mercado. Você dá o pontapé inicial antes da matéria-prima existir fisicamente.

Inovador é tudo o que faz reduzir o custo de produção e o desgaste do meio ambiente. Hoje há um banco de dados de inteligência e de lojas físicas que estão integrados. O cartão Riachuelo nasceu como cartão de crédito. Você tem um histórico de relacionamento com alguns milhares de brasileiros.

Há riqueza de dados quando você olha o cliente pelo estilo de moda e pelo estilo de vida. Os chineses possuem um mantra no varejo. Os ecossistemas generalistas são construídos em base financeira, em crédito, em bancos de varejo ou históricos de bens duráveis, como uma TV.

A moda é uma visão mais rica a partir do histórico de 32 milhões de famílias. Você possui uma visão completa de comportamento, de estilo de vida, desde a idade dos filhos até o tamanho do cachorro. Isso, filtrado pelas ferramentas de inteligência artificial, vira matéria-prima para o pessoal do marketplace. Atraindo ofertas para os meus clientes e parceiros do marketplace, com a viabilidade de um ecossistema temático.

Você acredita no marketplace do ponto físico, de usar as lojas nesse conceito?

Esse novo formato do Riachuelo Casa , estendemos para os outros parceiros, como o de vinho, que está tendo uma performance fantástica, para o de café, churrasco e gastronomia. Isso se estende, não vamos chegar ao teto do marketplace digital, mas representa expansão e outras formas de intenção, como o retire na loja, a entrega rápida, a partir da loja, e isso representa 45% das vendas digitais.

Você já viu muitas crises com o seu pai e a frente da produção. A pandemia é algo sem precedentes para essa geração. Com a sua sabedoria, gostaria que deixasse uma mensagem para os jovens líderes que estão assistindo. Como você enxerga o futuro e os possíveis caminhos?

Em relação a pandemia, apesar dos meus 60 anos, confesso que não esperávamos, apesar de todas as crises enfrentadas, como a inflação, passar por esta situação inusitada.

A travessia se deu, apesar das trágicas 500 mil mortes, mas como varejistas estamos vivendo o desabrochar da humanidade que sai melhor dessa provação.

O pós-pandemia, com similaridade com o pós-guerra, que teve os momentos mais exuberantes da moda, pode ser a novidade. A mensagem é de otimismo e, puxando a brasa para a minha sardinha, para aqueles que estão se lançando no mercado, cogite uma carreira no varejo.

Mesmo quando era o patinho feio, o coadjuvante, quando a estratégia estava no QG da indústria, investimos. Agora, com a transformação digital, o papel do varejo fica mais relevante e reforça a minha aposta: o varejo abrigava as carreiras mais prósperas do futuro e agora mais ainda, principalmente o varejo da moda.

Por Ana Laet, em cobertura especial para o Fórum 2021.

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