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Start-ups e Investidores Anjo: nova regulamentação à vista

Por: Daniel Soares Gomes

Advogado atuante nas áreas tributária, comércio exterior, aduaneiro e societário. Especialista em Direito Tributário pela Faculdade de Direito de Vitória - FDV. Sócio do escritório David & Athayde Advogados.

O Governo Federal anunciou na última semana a instituição do programa denominado “crescer sem medo”, voltadas às microempresas e empresas de pequeno porte.

O presidente da República, Michel Temer, sancionou o projeto (PLP 25/07) que promove alterações na Lei Complementar 123/2006, que trata do Simples Nacional, objetivando adotar diversas medidas para o fomento da atividade econômica no país desse importante setor.

Dentre as inovações do programa, destaca-se a regularização da figura do chamado investidor-anjo, que pode aportar capital em micro e pequenas empresas com o objetivo de participar dos lucros obtidos.

O governo prevê que a medida poderá ajudar as start-ups (empresas inovadoras em início de atividades) a obterem aportes para colocar seus produtos no mercado. Dessa forma, será possível a aplicação de investimentos sem a necessidade de o investidor se tornar sócio do novo empreendimento.

O novo art. 61-A que será introduzido à Lei Complementar 123/2006 prevê a possibilidade de admissão de investimentos em empresas de pequeno porte e microempresas, mediante aporte de capital, que não integrará o capital social da empresa.

Ainda, o §1º do mesmo art. 61-A estabelece que os investimentos para fomento de inovação nessas empresas deverão constar em “contrato de participação”, com vigência não superior a sete anos.

Pois bem, diante desse cenário, surge o questionamento sobre a natureza jurídica do denominado “contrato de participação”, que legitima o aporte de recursos do investidor-anjo.

Os artigos 61-A e seguintes, conforme se verifica, regulamente uma nova forma Contratual entre os denominados “investidores-anjos” e as empresas de pequeno porte e microempresa, existindo uma regra de tributação que poderá ser regulada pelo Ministério da Fazenda sobre a retirada do capital investido no § 10º do referido diploma normativo.

Portanto, as principais disposições referem-se a normas de direito privado aptas a regular o funcionamento desses investimentos.

Como é sabido, o Código Civil brasileiro, em seus artigos 991 e seguintes, também regula as denominadas Sociedades em Conta de Participação. Essas sociedades são instrumentos usualmente utilizados pelos investidores para regular as relações existentes em determinado projeto de investimento.

Numa análise comparativa entre às Sociedades em Conta de Participação e as disposições contidas no art. 61-A é possível identificar diversas semelhanças entre os institutos, conforme se observa no quadro abaixo:

Art. 61-A – Contratos de Participação Sociedades em Conta de Participação
Investidor-anjo Sócio Oculto ou Sócio Participante
Micro e pequenas empresas Sócio Ostensivo
A atividade constitutiva do objeto social é exercida unicamente por sócios regulares, em seu nome individual e sob sua exclusiva responsabilidade (art. 61-A § 3º) Na sociedade em conta de participação, a atividade constitutiva do objeto social é exercida unicamente pelo sócio ostensivo, em seu nome individual e sob sua própria e exclusiva responsabilidade,  participando os demais dos resultados correspondentes. (art. 993 caput)
O investimento não integrará o capital social da empresa (art. 61-A caput) A contribuição do sócio participante constitui fundo social, que não se mistura com o capital social da sociedade (art. 994 do Código Civil)
O investidor anjo não possui qualquer direito a gerência ou voto na administração da empresa (§ 4º, art. 61-A) O sócio participante não pode tomar parte nas relações do sócio ostensivo com terceiros (art. 993, § único)

Conforme se pode observar no comparativo, a semelhança entre o “contrato de participação” e as Sociedades em conta de participação pode ser facilmente notada.

Assim, nesse ponto, surge a dúvida se a Lei Complementar 123/2016 estaria criando um novo tipo societário.

O §3º do art. 61-A corrobora com o exposto, na exata medida que prescreve que “a atividade constitutiva do objeto social é exercida unicamente por sócios regulares, em seu nome individual e sob sua exclusiva responsabilidade. ”

A expressão contida no paragrafo 3º, objeto social, é conceito próprio da legislação societária, indicando qual é a atividade que será desenvolvida pela sociedade.

Assim, admitindo-se que o “contrato de participação” previsto no art. 61-A se trata de uma nova modalidade societária, surge a dúvida quanto a especialização da norma em face das disposições previstas no Código Civil Brasileiro.

Isso porque, esse novo regramento é voltado especificamente para a constituição de um “contrato de participação”, com viés societário, entre o investidor anjo e as micro e pequenas empresas.

Dessa forma, estaria vedado outro arranjo jurídico, tais como a constituição de Sociedades em conta de Participação, voltado a investimentos em projetos inovadores no qual esteja presente essas empresas.

O que se pode esperar é uma ampla discussão sobre a natureza jurídica e o verdadeiro conceito da expressão “contrato de participação” para definir o alcance desse novo regramento em face dos diversos arranjos existentes firmados para regular os investimentos em micro e pequenas empresas.