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Omnichannel: de tendência à necessidade em poucas semanas

Por: André Pazera

É Head de E-commerce e Marketplaces na Leveros. Possui mais de 10 anos de experiência em e-commerce, com passagens recentes pela VTEX e pela agência New Blue.

No início do ano de 2020, a maioria das empresas no Brasil olhava à crise do Covid-19 nas regiões mais afetadas da Ásia e da Europa como algo distante da nossa realidade. Porém, rapidamente a pandemia chegou e, em poucas semanas, estávamos em quarentena. Praticamente 100% do comércio era fechado, com exceção aos supermercados, farmácias e outros poucos negócios considerados essenciais.

Nas semanas seguintes ocorreu um crescimento repentino nas vendas do comércio eletrônico. Isso se deu principalmente em categorias diretamente relacionadas ao isolamento social — alimentos e bebidas, remédios, brinquedos, pet shops e equipamentos esportivos.

Outra força que puxou o crescimento nas vendas dessas e de outras categorias, como moda, beleza, eletrodomésticos e eletrônicos, foi a transferência da demanda reprimida das lojas físicas para o e-commerce. Ainda assim, a alta não foi suficiente para compensar a queda na receita proveniente das lojas físicas.

Crescimento do e-commerce

Se o e-commerce no Brasil representa algo em torno de 5% do varejo total, para conseguir manter o patamar de receita normal dessas empresas, as vendas online deveriam ter crescido 20 vezes. Porém, o que está ocorrendo na prática é um crescimento em torno de 2 a 5 vezes nos canais digitais, comparado ao ano anterior.

Resumindo, se o digital representava antes 5% da receita da empresa e cresceu, por exemplo, 3 vezes durante a crise, seria o equivalente a 15% do faturamento total da companhia no cenário pré-Covid-19 e os outros 85% da receita foram perdidos. É exatamente sobre esta perda que precisamos focar e encontrar soluções para reduzir o impacto no varejo.

Como as empresas estão se adaptando?

As empresas precisam se preparar para conseguir atender pelos canais digitais, no mínimo a demanda reprimida pelo fechamento das lojas físicas. As marcas que já possuíam uma estrutura omnichannel implementada conseguiram fazer essa virada rapidamente. Por outro lado, quem ainda não tinha evoluído nessa frente está enfrentando diversas dificuldades.

Operações de e-commerce que utilizam somente o estoque próprio e que absorveram toda demanda das lojas físicas, estão com diversos produtos indisponíveis. Além disso, também operam com prazos muito longos de entrega (10/15 dias), mesmo para as principais capitais, que é de onde vem a maior parte das vendas.

Isso prejudica a taxa de conversão e faz com que muitos clientes desistam da compra. Se neste caso o item estivesse disponível em uma loja física próxima a casa do consumidor, ele poderia ser entregue no mesmo dia. Talvez o custo de frete também seria competitivo, aumentando a probabilidade da compra ser finalizada.

Dificuldades do período

Por outro lado, um cliente que desiste do e-commerce para tentar entrar em contato com lojas físicas do seu entorno encontra algumas dificuldades. A começar por como descobrir quais lojas estão operando, mesmo que com as portas fechadas. Em seguida, tem outro esforço de descobrir se aquela loja possui o produto que você deseja. Isso exige muitas trocas de mensagens de texto, áudios e fotos de baixa qualidade e sem padronização via pelo WhatsApp.

É importante também ter em mente que o WhatsApp é uma dos ambientes com maior dispersão de atenção atualmente. Portanto, o seu vendedor vai concorrer com outras dezenas de conversas e grupos que estejam ocorrendo ao mesmo tempo. Quanto mais extensa for essa conversa, maior a probabilidade de perder a venda.

Ainda assim, se o consumidor conseguir encontrar os produtos que deseja e chegar à etapa de pagamento, os meios oferecidos normalmente são:

  • transferência bancária (ou seja, à vista)
  • ou transação digitada.

Esta segunda opção exige a transferência de todos os dados do seu cartão de crédito pelo telefone. Ou seja, não é algo muito recomendado devido ao alto risco de fraude envolvido.

Dificuldades logísticas

Para concluir o processo, ainda é preciso combinar a logística do envio. Ela costuma ser feita por meio de um aplicativo de entregas, atribuindo um custo alto ao pedido se for repassado ao cliente — ou corroendo a margem da venda se for assumido pelo varejista.

Fazendo uma comparação com a experiência que o consumidor costumava ter na loja física, existem perdas bem relevantes, como:

  • Facilidade de conhecer todo sortimento da empresa, que ficava exposto nas vitrines e prateleiras;
  • Fluidez na comunicação com o vendedor que poderia ajudá-lo no processo de decisão;
  • Segurança de contar os meios de pagamento disponíveis na loja, certificados por senha;
  • Comodidade de poder levar o seu pedido na hora, evitando risco de não chegar dentro do prazo desejado.

O caminho para minimizar esse impacto é por meio do omnichannel, integrando todas as lojas físicas ao e-commerce. Confira a seguir como seriam resolvidos cada um dos pontos acima com os canais online integrados aos pontos físicos:

1 – Visibilidade dos produtos

Consumidor consegue visualizar todo catálogo pelo e-commerce e o risco de ruptura diminui. Afinal, ficaria disponível no site todo estoque das lojas físicas, centros de distribuição e do próprio e-commerce. Além do sortimento e profundidade, o cliente também teria acesso a todas as variações de cores, tamanhos e descrições detalhadas.

2 – Comunicação com vendedor

Em muitos casos quando a venda é realizada no site, esse contato direto e pessoal deixa de existir. Isso ocorre ainda que o estoque vendido seja o da loja física, nos modelos de ship-from-store ou retire na loja.

Ainda assim, para os consumidores que queiram falar diretamente com um vendedor, a conversa será mais efetiva. Isso porque o cliente já navegou pelo catálogo do e-commerce e consegue passar mais insumos para que seja dada continuidade ao atendimento. Se este precisar enviar outras opções de produtos, ele poderia fazer pelos links das páginas de cada produto no site, disponibilizando ao cliente fotos de alta qualidade, descrições completas, tabelas de medidas e avaliações de outras pessoas.

3 – Pagamento

No e-commerce existem diversas opções disponíveis, o que aumenta a taxa de conversão, principalmente para vendas de ticket médio elevado. No caso das compras com cartão de crédito, o fluxo das informações é mais seguro, seguindo os padrões de compliance (PCI) exigidos. Além disso, é possível aceitar outros diversos meios de pagamento, como cartões de débito, boleto bancário, Paypal, entre outros. Dependendo da plataforma, é possível aceitar até mesmo o cartão onde o governo está pagando o auxílio emergencial, popularmente chamado de “corona voucher”.

4 – Entrega

Com todos os estoques integrados, é possível oferecer sempre ao cliente o estoque melhor posicionado para cada venda, resultando em frete mais barato e entrega mais rápida. Neste caso, as lojas físicas passam a atuar como centros de distribuição, com estoques avançados. A empresa, por outro lado, consegue se alavancar das melhores soluções de entrega para cada região.

Por exemplo: um pedido de cubagem média, que seria enviado de um CD no Espírito Santo (região com incentivos fiscais) para Porto Alegre (RS), provavelmente custaria em torno de R$ 60 e teria um prazo superior a 10 dias. Se esse mesmo pedido fosse enviado da sua loja física mais próxima, seria possível entregar no mesmo dia, com um custo em torno de R$ 15 — ou isentar o frete caso o cliente opte por retirar na loja.

Retire na loja

Essa opção de retirada do pedido na loja — que atualmente está funcionando no modelo drive-thru na maior parte dos shoppings e lojas de rua — deve seguir com alta adesão no cenário pós-quarentena. Afinal, muitas pessoas ainda estarão com receio de grandes aglomerações.

Outro benefício de trabalhar com a essa opção, considerando um momento de reabertura do comércio, é que quando o cliente vai buscar seu pedido, muitas vezes acaba se interessando por outros itens e aumenta a sua compra.

Convencido da importância do omnichannel? Hora de execução!

Ainda há pessoas achando que não há mais tempo para agir. Mas, é preciso lembrar que mesmo após o final da quarentena, o processo de retomada das operações do varejo será faseado. Estudos realizados em outros países à frente do Brasil no enfrentamento da Covid-19 comprovam isso.

Se o Brasil seguir em linha com o que está ocorrendo em outros países, devemos ver nos próximos meses cada vez mais lojas abertas. Porém, estarão com as operações funcionando em horário reduzido e fluxo de pessoas em torno de 50% abaixo do normal. Isso deve gerar um acúmulo de estoques nas lojas físicas, assim como manter o time de vendas ocioso boa parte do tempo.

Um cenário nada promissor para aqueles que não possuem uma operação com todos os canais integrados e que depende exclusivamente do fluxo de pessoas fisicamente nas lojas para conseguir vender.

Hora de arregaçar as mangas

A crise do Covid-19 está ajudando a acelerar esse processo do omnichannel e a quebrar diversos paradigmas, que travavam essas iniciativas. É preciso aproveitar esse momento para oferecer a melhor experiência aos clientes. Vale lembrar que em breve, para aprovar qualquer projeto, voltaremos as burocráticas aprovações com conselhos, intermináveis definições de escopo e longas apresentações de PowerPoint.

Tenho participado de projetos nessa frente junto a grandes marcas. Minha percepção é que apesar da grande resistência interna que essas iniciativas enfrentam, empresas focadas na solução e não nos problemas têm encontrado maneiras criativas de resolver todos os obstáculos. Sejam eles culturais, comerciais, fiscais ou outros.

Essa evolução no modelo de negócio irá refletir positivamente em todos os canais que de alguma forma estiverem agregando valor ao cliente. Seja ele o e-commerce, lojas próprias, franquias, marketplaces, multi-marcas ou venda direta. Uma marca com diversos canais para trabalhar é mais resiliente em momentos de crise — e quanto maior o nível de integração entre esse canais, melhor.

Se o omnichannel antes era mais um termo da moda, agora ele se tornou peça chave para o varejo atravessar essa crise e estar ainda mais forte quando tudo isso passar.