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O moderno varejo exige uma nova visão da liderança.

Por: Daniel Dias

Multiespecialista em varejo, E-commerce, Transformação Digital e sócio-diretor da 360 Varejo.

Não é segredo que a indústria do varejo vem sendo fortemente impactada por rápidas mudanças de comportamento do consumidor impulsionadas pelo uso massivo da tecnologia e que se traduzem em novos hábitos compra. A ascensão da Amazon e Alibaba no exterior e do Magazine Luiza no Brasil trazem inúmeros aprendizados para que os varejistas possam compreender quais competências e recursos precisam ser adaptados para atender a estas mudanças, com crescimento de vendas sim, mas sem renunciar a rentabilidade.

Com as taxas anuais de crescimento do comércio eletrônico, com a expansão do número de lojas abertas por marcas nativas digitalmente e simultaneamente com o fechamento do número de lojas centradas em operação física, a conclusão prematura é acreditar que os nativos digitais encontraram o segredo para todas as respostas do varejo.

Enquanto as manchetes se concentram em afirmar como “o velho varejo” precisa aprender com os nativos digitais, há de se dizer que o inverso também é verdade. Ambos os tipos de varejistas são suscetíveis a seus próprios pontos cegos à medida que ainda caminham para uma operação integrada.

Uma comparação aprofundada dos nativos digitais e de seus concorrentes centrados em lojas físicas revela diferenças inerentes em sua cultura e em suas capacidades organizacionais. Varejistas eminentemente de lojas físicas podem aprender com os nativos digitais (sejam essas marcas DTC ou varejistas de comércio eletrônico pure-play) entendendo as diferenças fundamentais entre os dois modelos e como essas estruturas mais recentes moldaram uma compreensão fundamentalmente diferente do consumidor.

Os digital-nativos podem contribuir, a partir de seu DNA desenvolvido em “data analytics”, na compreensão dos casos internos de sucesso e insucesso para melhorar a operação de varejo físico ou, por exemplo, dar maior assertividade ao processo de abertura de lojas. Varejistas que conseguem enxergar “do outro lado do muro” estarão aptos a interpretar e caminhar em direção, a partir dos pontos fortes e fracos do outro, a um modelo integrado.

As expectativas dos consumidores nunca estiveram tão claras para que a indústria do varejo compreenda e se adapte, pois os clientes querem mais do que apenas “comprar um produto em uma loja e sair com ele”. Os hábitos de consumo denotam mudanças que migram para “comprar on-line e poder receber rapidamente um produto entregue pela loja mais próxima” ou “comprar on-line e retirar na loja” ou “poder comprar em uma loja física um produto não disponível, mas recebê-lo em casa entregue por outra loja”.

O desafio enfrentado pelos varejistas de um modo geral será como criar recursos integrados à medida que a demanda crescer, ou seja, como trocar as turbinas, ou melhor o software de navegação, com o avião em pleno voo.

Visões de mundo que se complementam

As diferenças na origem do canal do varejista e na formação da liderança resultam em diferenças de mentalidade e foco organizacional.

Os nativos digitais tendem a crescer por meio da aquisição e retenção de clientes, impulsionados pela tecnologia: foco no consumidor, criação de conteúdo, marketing digital, personalização e comunicação constante. Os dados do cliente aprimoram serviços e ferramentas, como mídias sociais, bate-papos, e-mail e telefone, e o feedback quase imediato tornam-se um padrão para as marcas que se destacam.

As empresas mais jovens geralmente têm organizações planas que garantem que o feedback vá direto para a fonte correta. Há uma abertura para rápida adaptação e mudança, seja nos esforços de marketing, conteúdo ou produto.

Sem surpresa, os principais indicadores de desempenho que emergiram como parte integrante das operações diárias refletem uma mentalidade centrada no cliente: valor da vida útil do cliente (life time value), custos de aquisição do cliente e rotatividade. A medição desses tipos de indicadores é facilitada com os dados coletados naturalmente em uma jornada de compras online.

Embora possuir um nome de cliente, endereço e hábitos de consumo seja parte inerente do modelo, informações semelhantes raramente são rastreadas ou usadas com a mesma intensidade pelos varejistas de lojas físicas. A coleta do endereço de e-mail de um visitante em um site de comércio eletrônico é um procedimento padrão – “Cadastre-se e obtenha 15% de desconto!”

Por outro lado, os varejistas centrados em lojas físicas possuem uma característica formidável que é a possibilidade do “olho no olho” com o cliente, ou seja, o calor humano transmitido no atendimento na sua acepção mais elementar. Outra forte característica positiva é seu maior domínio e integração à cadeia de abastecimento.

O varejo moderno é integrado.

Varejistas que obtiverem sucesso no varejo moderno serão aqueles que combinarão o melhor dos dois mundos. Os canais de compras e entrega devem se tornar pontos de contato contínuos da experiência do usuário.

Quer os especialistas descrevam isso como phygital, omnichannel, multichannel, new retail, harmonized retail, online-to-offline retail, ou para simplificar, varejo integrado, o foco está na experiência unificada do usuário do consumidor. O consumidor moderno não deseja distinguir entre canais nem se limitar a um canal. Os consumidores desejam comprar de acordo com suas necessidades – potencialmente em qualquer lugar, a qualquer momento e por vários meios.

Tão importante quanto isso, eles também querem escolher como receberão essa compra. Os nativos digitais têm uma vantagem inicial no foco no cliente, mas não podem crescer na sua retenção se não desenvolverem uma experiência física de varejo em merchandising, layout de loja, processo e operações.

Se o varejo integrado já havia se tornado uma demanda real do consumidor imaginem agora que milhares de novos consumidores realizaram, neste período de pandemia, suas primeiras compras online e que expuseram o quão lento e frágil ainda está o atual processo de unificação de canais no varejo brasileiro.

Apesar de suas notáveis culturas focadas no consumidor, os nativos digitais não têm sucesso garantido quando se depararam “com o mundo presencial”. No outro extremo do espectro, os varejistas centrados no físico são superiores em operações e lojas, mas geralmente ficam atrás quando o assunto é foco e entendimento do consumidor. No competitivo mercado de varejo de hoje, ambos possuem virtudes e falhas, portanto para ter sucesso, os varejistas necessitam:

  • Investir em recursos que permitam que os consumidores se conectem com o varejista (e vice-versa) em todos os pontos de sua jornada.
  • Implementar uma cultura e mentalidade verdadeiramente centradas no consumidor em toda a organização com métricas de performance.
  • Integrar a experiência da loja e digital em uma experiência diferenciada de marca de varejo.

Resta ver que cultura de liderança surgirá a partir da união destes dois hemisférios e que modelo de negócios terá capacidade de integrar-se mais rapidamente.