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O Comércio Eletrônico e a Organização de TI

Por: Fernando Di Giorgi

é ex-sócio fundador da Uniconsut Sistemas, empresa especializada em back-office para grandes lojas de e-commerce. Fomado em Matemática pela USP, pós-graduado em Administração pela FGV e em Análise Econômica pela FIPE, mestre em Economia pela PUC-SP.

Embora a TI tenha tido, ao longo do tempo, uma direção corporativa, nem sempre o desenvolvimento foi corporativo. Poucos se lembram de que limitações tecnológicas impunham sistemas pouco abrangentes e pouco integrados com a intervenção humana. A direção era centralizada, porém a organização interna espelhava a segmentação dos sistemas por áreas funcionais (Folha de Pagamento, Faturamento, Crédito e Cobrança, Engenharia de Produto etc.), além das clássicas funções de infraestrutura. O aumento da capacidade de processamento e de armazenamento de dados, associado aos gerenciadores de bancos de dados, propiciou a produção de ERPs.

Como decorrência direta da integração entre os sistemas, o desenvolvimento foi centralizado. Toda modificação nos sistemas teria que ser avaliada à luz das necessidades de todas as áreas funcionais da organização. Fica claro que a tecnologia é um dos fatores determinantes do modelo organizacional de TI.

Nessa trajetória, houve obstáculos: o grau de diferenciação funcional de empresas dentro de um grupo empresarial ou de unidades de negócio dentro de uma empresa exigiram grandes esforços de desenvolvimento ao redor dos ERPs, a ponto de comprometer a absorção de novas versões.

Um dos princípios básicos que substancia os ERPs é a universalização dos procedimentos, banalizando as especificidades funcionais. O reconhecimento tardio dessa forte realidade levou os produtores de ERP a produzirem sistemas orientados por tipo de negócio. Em síntese, a diferenciação funcional é um dos fatores determinantes do modelo organizacional de TI, pois cada ERP, obrigatoriamente, tem sua própria equipe de projeto, de desenvolvimento e de suporte.

Uma das consequências do modelo centralizado de TI originário dos sistemas integrados é a objetividade imposta à TI. Como um foco bem definido, todos os membros do departamento de TI são naturalmente orientados para objetivos comuns, o que, sem dúvida, é importante em termos de eficiência. Porém, a excessiva dependência dos profissionais de TI ao ERP, principalmente os mais dedicados ao atendimento dos requisitos funcionais, tende a inibir sua capacidade crítica, visto que seu espaço criativo é limitado pelos alcances do ERP.

Uma das conseqüências desse fato, com o passar do tempo, é o crescente conservadorismo. A organização induzida do sistema integrado é muito abrangente e tende a gerar forte corporativismo devido à identificação dos profissionais de TI com o sistema. Nesse sentido, no conflito entre a realidade e o sistema, a realidade tende a ser rechaçada.

A Web abriu espaço para novos negócios. Em outros termos, houve uma mudança técnica que permitiu fazer negócios tradicionais de outra maneira, especialmente o comércio eletrônico. As inovações não param de crescer, muitas vezes implicando em modificações estruturais nos sistemas que o suportam, incluindo a necessidade de integração com sistemas de parceiros (aproveitamento do potencial da marca).

Devido à sua juventude, o comércio eletrônico, em sua totalidade, está longe de uma padronização, condição necessária para a produção de pacotes abrangentes.

As primeiras lojas de e-commerce foram puramente virtuais. Elas não tiveram herança alguma a respeitar e, de peito aberto, enfrentaram as novidades e as incertezas técnicas e de modelagem do negócio. Dado o sucesso, os grandes varejistas foram obrigados a trilhar o mesmo caminho, mas tiveram que conviver com mais um canal de venda com comportamento sui generis.

À luz dos comentários precedentes, dois dos fatores determinantes da organização de TI foram frontalmente atingidos pelo comércio eletrônico: a tecnologia e as características de funcionamento. Por si, tais fatores seriam suficientes para levar os grandes varejistas a refletir sobre a cisão da organização de TI.

A decisão de subordinar a TI do e-commerce à sua direção ainda é uma exceção. Essa dificuldade pode ser explicada pelos seguintes motivos:

  1. falsas sinergias, baseadas na hipótese de que o mercado e as mercadorias do e-commerce são idênticos ao do varejo tradicional;
  2. banalização das diferenças funcionais do comércio eletrônico, considerando-o como “mais uma loja da cadeia”;
  3. preferência dos profissionais de TI em vincularem-se aos sistemas de grande visibilidade interna – o comércio eletrônico ainda é pouco  representativo em termos de faturamento.

A consequência imediata tem sido a lentidão do desenvolvimento dos projetos, comprometendo a participação da empresa no mercado, aumento dos  custos de TI onerando a margem global, baixa qualidade do atendimento aos usuários e erros na priorização das atividades devido à falta de foco.

É muito sintomático observar que, gradualmente, nos grandes varejistas, a diretoria de comércio eletrônico tem absorvido gerências, reconhecendo  oficialmente as diferenciações. No início, foram somente as gerências Comercial e de Marketing, em seguida, a gerência de Logística foi incorporada e,  por último, a gerência de Compras.

No entanto, com raras exceções, a TI continua corporativa. Os grandes varejistas que superaram as dificuldades anteriores estão em vantagem num mercado que está aberto à inovação comercial baseada em tecnologia e em logística.