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Entrevista sobre embalagens com Ricardo Mayer e Maria Helena Resnitzky

Por: Redação E-Commerce Brasil

Equipe de jornalismo E-Commerce Brasil

Por Rina Noronha

De flores a geladeiras, passando por roupas e produtos eletrônicos. O e-commerce é extremamente diversificado e parece que a cada dia surge uma nova oportunidade de negócio online. E o consumidor está cada dia mais conectado e mais disposto a comprar pela internet e receber em casa seus produtos. Pergunte a qualquer um: a expectativa de receber uma encomenda geralmente é enorme. Porém, muitas vezes também são grandes as decepções. Devido a uma falta de cuidado das lojas, muitos produtos ainda chegam com avarias causadas pela embalagem não ideal. E se o produto em si não vem com problema, a caixa do transporte geralmente é feia e demonstra um mal cuidado que não condiz com o seu interior. Como equilibrar isso?

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Convidamos dois profissionais estudiosos dessa área para responder a algumas questões sobre o assunto:

Ricardo Mayer tem formação em Comunicação Visual, é pós-graduado em Gestão Estratégica de Embalagem e em Engenharia de Embalagem. É professor nessa área e integrou o júri técnico do prêmio ABRE (Assiciação Brasileira de Embalagem) nas edições de 2008 a 2011.

Maria Helena Resnitzky possui 30 anos de experiência nas áreas de Embalagem, Pesquisa & Desenvolvimento, Inovação e Marketing. Por 10 anos, atuou no Centro de Tecnologia de Embalagens do Instituto de Tecnologia de Alimentos (CETEA –ITAL), desenvolvendo pesquisas, projetos e cursos nas áreas de Embalagens e Alimentos. Possui sólida vivência em projetos de desenvolvimento de novas embalagens e sistemas de embalagens, segundo parâmetros de inovação, qualidade e custos compatíveis às estratégias empresariais.

 

Existe diferença de embalagens para a loja física e a virtual? Por que isso tem se tornado um assunto tão debatido no e-commerce?

Ricardo Mayer: Creio que existam diferenças, sim. Mas o fato é que, ao conceber uma embalagem para lojas físicas, muitos fabricantes de produtos deixam de considerar que esse produto pode ser vendido via online e entregue de formas não consideradas no sistema logístico tradicional.  Até recentemente, havia uma justa preocupação com a integridade do produto. Com a difusão do e-commerce, novos desafios passaram a ser importantes, como a racionalização dos modelos, a segurança contra extravios e a estética.

Maria Helena: Quando um produto é desenvolvido, sua embalagem de transporte é pensada para o varejo e a distribuição nos canais de venda convencionais, e ele normalmente é entregue em caixas com várias unidades, tendo essa caixa sido dimensionada para o transporte e a estocagem do grupo de produtos iguais. Com o e-commerce, os produtos são retirados dessas caixas e re-embalados, muitas vezes em unidades individuais, ou agrupados com outros produtos diferentes. Consequentemente, uma nova embalagem de transporte deverá ser usada e ela deve se adequar dimensional e estruturalmente (resistência mecânica) ao novo conjunto de produtos.

A embalagem para a venda online passou a ter uma importancia muito grande, pois estendeu a responsabilidade do vendedor com relaçao à integridade do produto. Se antes essa responsabilidade ia até o ponto de venda, com o e-commerce ela vai além, até a chegada do produto à casa do consumidor.

Quem faz a embalagem não é a mesma indústria de quem consome – quem produz a embalagem não é quem embala o produto para ser enviado ao consumidor. Como esses dois lados podem caminhar juntos?

RM: Bons fornecedores são sempre os que procuram entender as necessidades de seus clientes. Os excelentes são os que se antecipam em identificar tais necessidades. Da parte do lojista, conhecer suas próprias necessidades e passar isso a quem desenvolve o projeto da embalagem e a quem vai produzi-la é fundamental.

MH: Esses dois atores têm que se comunicar, e a indústria que consome tem que passar as suas necessidades para quem produz. Para isso, é preciso primeiro conhecer e definir quais são as suas reais necessidades, e acho que é aí que as coisas estão ainda apenas começando.

De que forma o lojista online pode se preprarar para melhor atender ao cliente através da embalagem?

RM: O lojista deve conhecer muito bem o sistema no qual a embalagem vai atuar: embalamento, estoque, as várias etapas do transporte. É necessário conhecer os pontos críticos desse sistema, as necessidades de proteção de cada produto e as expectativas do consumidor, além de checar as reclamações e o histórico de avarias.

Se a loja vende apenas um tipo de produto, ou produtos similares, é mais fácil definir que tipos de embalagens serão usadas. Mas no caso dos varejistas que oferecem desde livros até geladeiras, passando por roupas e produtos eletrônicos, como definir as embalagens de forma mais simples, sem que seja necessário ter um grande estoque de diversos tipos de embalagem?

RM: Não há alternativa senão fazer um amplo levantamento das características dos produtos. Dimensões, peso, resistência etc. A partir disso, traçar cenários e chegar a um número razoável de modelos que cubra essa diversidade sem acarretar num investimento desnecessário em estoque. Modelos matemáticos podem ser usados para esse cálculo.

A embalagem secundária (a de transporte) pode, em algum momento, ser usada como veículo de propaganda da loja?

RM: Sim, pode ser importante personalizar. Temos que observar qua há todo um clima especial criado em torno de certos produtos nas lojas virtuais, nas lojas físicas e no marketing do produto. Quando o produto chega numa caixa mal resolvida e mal apresentada, a magia se quebra. O melhor seria manter o clima.

Como equilibrar os problemas causados pelo transporte à embalagem, que muitas vezes tornam o primeiro contato do consumidor com o produto (ou a loja em si) em algo pouco agradável? Não é difícil ouvir histórias de que o site da loja é lindo, o atendimento foi excelente, o produto ótimo, mas que houve um choque, um susto, ao se deparar com a embalagem de transporte suja, rasgada, amassada etc.

RM: Dimensionar e definir bem os materiais e os acabamentos da embalagem, prevendo os possíveis danos durante a entrega. Mas para isso é preciso conhecer bem todas as etapas da entrega e seus pontos críticos.

Tanto as lojas online de nicho como as menores e os vendedores individuais (geralmente artesãos e pequenas produções) saem ganhando dos grandes no aspecto personalização da embalagem?

RM: Embalagens personalizadas só atingem um bom preço quando encomendadas em grandes quantidades. Para pequenos empresários, pode ser melhor enviar em embalagens padronizadas e usar algum recurso de personalização no interior, como um cartão, um embrulho mais trabalhado etc.

MH: Rótulos impressos através de impressão digital, que permite pequenas tiragens, podem também ser uma opção para a personalizaçao de embalagens para pequenas produçoes.

Existe um limite para a personalização da embalagem de transporte? E da embalagem/acondicionamento interno?

RM: O limite é o encantamento que a marca quer provocar no consumidor, considerando as possibilidades técnicas e o custo, incluindo limites de peso. Por outro lado, soluções com exagero de material, que contradizem princípios de sustentabilidade podem ser mal vistas por certos grupos de consumidores.

A embalagem pode ser uma arma para usar na parte de satisfaçao do cliente?

RM: Sim, quando é pensada para o momento especial em que o consumidor recebe ou vai abrir o pacote.

Transportar uma geladeira é menos complicado do que transportar flores ou garrafas, e outros produtos frágeis?

RM: Os riscos podem ser proporcionalmente os mesmos. O prejuízo financeiro com o retorno do produto avariado é que pode ser maior. Além disso, não há como repor um buquê de flores que deveria chegar lindo no dia no aniversário de casamento. Entregar outro no dia seguinte não resolve.

Qual é a maior problemática, hoje, no transporte de objetos de grande volume/peso?

RM: Acredito que não sejam muito diferentes dos da entrega feita a partir de lojas físicas, pois o sistema de entrega costuma ser semelhante. Uma variável é que as lojas virtuais costumam entregar em áreas geográficas mais amplas, o que demanda um trasporte com prazo e distância maiores. Isso costuma submeter o produto a mais situações de risco.

MH: A otimizaçao da carga pode ser um problema sério. O que transportar com o quê, para conseguir o melhor custo beneficio de frete e evitar danos aos produtos.

E no caso de produtos pequenos e/ou frágeis?

RM: Acredito que os pequenos não sejam muito problemáticos, exceto que seu preço pode ser alto. Mas costumam estar submetidos a menos riscos. O risco dos frágeis depende do tipo de fragilidade que apresentam. Por exemplo, quem trabalha com vinhos, azeites e outros líquidos deve ter cuidado redobrado, pois o rompimento de uma embalagem é uma catástrofe que atinge não só os produtos vizinhos, mas também as outras caixas de transporte e seu conteúdo, levando a grandes perdas.

MH: Os produtos pequenos e frágeis correm maior risco de sofrerem danos causados pelos maus tratos do manuseio e do transporte. Um produto frágil, em uma viagem longa, se não estiver bem protegido por uma embalagem adequada e colocado na parte superior da carga, poderá chegar avariado ao seu destino final.

Até onde a responsabilidade da integridade da embalagem no destino final é do lojista, e até onde é da transportadora/parceiro logístico?

RM: Depende do que foi firmado entre as partes. A diferença do fator resistência para a venda online em relação à venda em lojas físicas é que nestas, em princípio, o consumidor é responsável pela integridade da mercadoria a partir do momento em que ela sai da loja. Nas lojas online, o comerciante é responsável pela mercadoria até a sua chegada ao endereço do consumidor. Portanto, é responsável por ela em mais algumas uma etapas do sistema (falta um “de” aqui, né?) embalagem: a acomodação do pedido na caixa de transporte e toda a circulação necessária durante o transporte e a entrega nas mãos do cliente. O índice zero de avarias é um ideal a ser perseguido através de programas de qualidade total e melhoria contínua. Transportadores que apliquem isso terão vantagem competitiva no mercado.

MH: Depende do que foi acertado entre os dois. Normalmente, esse ponto é definido ao se contratar o transportador. Se a responsabilidade for do transportador, ele pode se recusar a transportar um item que considere mal embalado. Estudar as rotas junto com o transportador e deixar claro quais são as fragilidades do produto pode ser um bom começo.

Existem, atualmente, empresas que desenvolvam embalagens específicas para o e-commerce? Há espaço para investir nesse setor?

RM: Em geral, as embalagens são produzidas por empresas que produzem também embalagens para outros fins, como caixas de papelão ondulado ou microondulado com acabamentos diversos. Cabe a quem projeta conhecer os materiais e os processos disponíveis e aplicá-los. É preciso, entretanto, fazer com que os fornecedores entendam as necessidades específicas do cliente, de seus produtos e de seu sistema de entregas. Soluções mais especializadas estão no campo dos acessórios como elementos infláveis, flocos de isopor e outros dispositivos usados para preencher espaço e proteger as mercadorias.

MH: Não que eu conheça, mas creio que logo mais as empresas de embalagem, principalmente as de menor porte, irão ver o enorme potencial que representa esse tipo de comércio e poderão se especializar.

O que é preciso levar em conta na hora de criar uma embalagem para e-commerce, tanto a primária, do produto, como a secundária, do transporte?

RM: É preciso conhecer o sistema onde elas vão atuar, os riscos a que estarão sujeitas, a linha de produtos e dimensionar de forma a racionalizar modelos e formatos. Além disso, gerenciar o custo, buscar o visual adequado à marca e à expectativa do consumidor e buscar diferenciais em relação à concorrência, desde que sejam perceptíveis pelo consumidor a ponto de se justificarem.

MH: Os mesmos pontos que devem ser levados em conta ao se criar qualquer embalagem: ela deve conter e proteger o produto, além de informar e, se possível, encantar o consumidor.

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